domingo, 13 de dezembro de 2020

Bruno Boghossian – A ressaca do Supremo

- Folha de S. Paulo

Divisão no julgamento sobre reeleições no Congresso volta a agitar rede de intrigas do tribunal

A divisão do Supremo no julgamento que barrou a reeleição dos atuais presidentes da Câmara e do Senado agitou mais uma vez a rede de intrigas do tribunal. A maioria do plenário não fez mais do que sua obrigação ao reafirmar aquele veto, mas a decisão acirrou disputas de poder que têm efeito direto sobre o comportamento dos ministros.

Logo depois da votação do último domingo (6), uma ala da corte acusava Luiz Fux de traição no processo. Ministros diziam que existia um pacto para liberar as reeleições e que o presidente do Supremo havia descumprido o acordo. Em retaliação, eles prometiam tomar decisões para dificultar a vida do colega.

Se o problema fosse apenas a vaidade ferida de um punhado de juízes, ninguém precisaria se preocupar. As desavenças ficariam restritas ao cafezinho nos intervalos das sessões, e haveria alguns embates ríspidos durante os julgamentos. A conflagração política no Supremo, porém, pode se tornar mais um elemento de tensão no frágil equilíbrio democrático do país.

Mesmo em tempos de paz, o farto poder dos ministros do STF é capaz de perturbar essa estabilidade. Decisões monocráticas, pedidos de vista e liminares exóticas costumam provocar traumas e desgastes ao tribunal, estimulando alguns de seus integrantes a jogar na defensiva. Em certos casos, a corte se vê constrangida e deixa de cumprir seu papel.

Após o choque da última semana, Fux já ensaiou um apelo à autocontenção. Dois dias depois do julgamento, ele recomendou moderação ao tribunal, disse que o Supremo deve evitar a "orgia legislativa" e sentenciou: "Não é hora de ninguém ganhar nada nem de perder nada. É hora da manutenção do status quo".

O STF faria bem em segurar os próprios excessos e intromissões na vida política do país, mas esses limites não deveriam ser frutos de crises internas ou pressões externas. Se a recente cisão no tribunal produzir mais decisões controversas e acovardamento institucional, Jair Bolsonaro pode dormir tranquilo.

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