Aumentar os impostos dos super-ricos é uma proposta liberal. Medo de que imposto sobre ricos terá efeitos cataclísmicos está fora de lugar
Ninguém
gosta de impostos. Até o tema é desagradável. Num país como o Brasil, que
paga mais impostos do que a média de países com renda e indicadores sociais
similares aos nossos, aprendemos a ser automaticamente contra qualquer imposto
ou taxa e a celebrar sempre que se anuncia uma redução. Essa reação automática,
no entanto, nem sempre acerta.
Na
semana passada, despertei a ira de alguns libertários da internet ao defender
que os super-ricos —pessoas cujo patrimônio está nas dezenas de milhões de
dólares— sejam mais taxados. Ou seja, que contribuam com uma parte maior de sua
riqueza para o bem coletivo. E isso não foi à toa. Os chamados super-ricos, em
qualquer país do mundo, contribuem muito pouco. Foi isso que levou Warren
Buffett —um dos homens mais ricos do mundo— a afirmar, em 2011, que ele
pagava menos imposto de renda que qualquer funcionário de seu escritório.
No Brasil, sabemos como a carga tributária é excessivamente pesada para os mais pobres e leve para os mais ricos. Tributamos muito o consumo, que é para onde vai a maior parte da renda dos mais pobres. Por outro lado, indivíduos ricos pagam pouco. Há muitos jeitos de começar a reverter isso: taxar lucros e dividendos, criar novas alíquotas do imposto de renda para rendas mais altas, imposto sobre herança. Globalmente, impostos sobre o patrimônio dos super-ricos —talvez implementados simultaneamente por várias nações, para reduzir a fuga de patrimônio— pode dar conta de captar aquilo que não foi tributado como renda.
Propor
taxar alguém não significa ser contra sua existência. Nossas vidas são melhores
graças à Amazon,
à Tesla, à Microsoft e ao Google, empresas cujos donos hoje figuram entre os
mais ricos do mundo. O mesmo vale para Magazine Luiza, Ambev, Havan e
outras empresas brasileiras. Sem dúvida, um mundo em que as riquezas fossem
simplesmente confiscadas e empresários de sucesso mantidos no mesmo nível
econômico que um trabalhador comum teria muito menos empreendedorismo e
inovação. A ambição individual é motor de crescimento. Mas é improvável que
alguns milhões de dólares a menos mudassem os incentivos de um multibilionário.
Aliás, já sabemos que ricaços não deixam de viver e declarar impostos em países
que os taxam muito mais do que nós.
A
escolha do tamanho do Estado é diferente da escolha de como ele será
financiado. O Estado ser pequeno (menos de 30% do PIB em impostos, como a
Austrália) ou grande (cerca de 45% na Dinamarca) não implica diretamente em
saber se essa carga tributária será distribuída de forma justa e eficiente pela
população.
A
reforma tributária em discussão no Congresso toca no objetivo importante de
simplificar nossa carga, sem o que o Brasil não terá muita esperança de
crescer e competir globalmente. Restará ainda reformular a distribuição dessa
carga. Nesse momento, qualquer dogmatismo está fora de lugar. Assim como medos
de que qualquer imposto sobre os ricos terá efeitos cataclísmicos.
A
pandemia, além da perda trágica de vidas, causou também a perda de emprego e
renda para milhões de pessoas. Muitas das pessoas mais ricas do mundo, contudo,
ficaram ainda mais ricas. Só
Elon Musk aumentou seu patrimônio em mais de US$ 150 bilhões. Fora da
utopia anarquista, impostos sempre vão existir. A questão é quanto cada um vai
pagar. Você é favorável a aumentar os impostos dos mais pobres para que pessoas
como ele continuem pagando menos? É isso que está em jogo.
*Joel Pinheiro da Fonseca, economista, mestre em filosofia pela USP.
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