Quando
assiste impassível à deterioração da popularidade do presidente da República,
os solavancos que ele dá em todas as partes tronchas de seu governo e o
empilhamento de corpos na pandemia sem uma saída visível, o mercado,
representado pela Avenida Faria Lima e adjacências espelhadas, age com a boa-fé
dos ingênuos ou a má-fé dos cínicos?
Eis
uma ambivalência que vai se aprofundando à medida que os meses passam, cuja
permanência pode levar a que seja cada vez mais difícil o país sair do atoleiro
bolsonarista.
O
silêncio cúmplice do dito mercado e dos demais setores que deveriam mover a
economia é o que dá a Bolsonaro a certeza de que ele pode fechar com o Centrão,
enterrar a Lava-Jato, empurrar cloroquina goela abaixo do país, sabotar a
vacinação e depois mentir dizendo que não o fez porque nada vai acontecer.
E
olha que Bolsonaro é, antes de tudo, um fraco. Covarde, mesmo. Ele morre de
medo de impeachment, de crítica, de pesquisa, de adversário, da imprensa, do
Supremo, justamente porque sabe de suas severas limitações intelectuais, da sua
incompetência nata e do caráter precário de sua administração em todas as
áreas.
Se
uma pessoa assim incapaz chega ao ponto de dobrar a aposta e negar na cara dura
declarações reiteradas de ataque às vacinas, é porque quem poderia contê-lo foi
longe demais na condescendência.
Basta analisar a mais recente pesquisa de avaliação do governo divulgada pela XP e pelo Ipespe. Semana após semana, a popularidade de Bolsonaro se deteriora. São 42% os que consideram o governo ruim ou péssimo, e 53% os que condenam sua atuação no curso da pandemia.
Em
qualquer país, esses indicadores, que espelham a tragédia econômica e social do
bolsonarismo, seriam suficientes para que o presidente deixasse de mentir em
praça pública e fosse instado a agir.
Instado
por quem? Pela elite econômica. Os mesmos clientes que recebem a pesquisa da XP
e a comentam enquanto fazem o jogging matinal com os amigos nos clubes da elite
paulistana, mas dão de ombros, porque não entendem o que isso tem a ver com sua
vida.
Só
vão entender quando o descontentamento de uma parcela da população — hoje mais
empobrecida do que antes da pandemia— levar Bolsonaro, não por senso de dever,
mas pela sua covardia crônica, a reeditar o auxílio emergencial, e isso acabar
de desarrumar as contas públicas.
Presos
a uma armadilha mental em que só cabem fórmulas simplistas do que deveria ser a
política econômica, esses agentes não entendem que o governo do capitão jamais
entregará o que Paulo Guedes insiste em prometer. Pelo simples fato de que a
sobrevivência política de Bolsonaro, sua única preocupação, depende de vender a
alma ao Centrão nem que seja para arrombar o cofre.
Por
que diabos, então, esses senhores são tão covardes e assistem impassíveis aos
crimes, às mentiras e à deterioração do espaço democrático que Bolsonaro
promove há dois anos? Em nome de quê, exatamente?
“Ah,
mas agora que venceu as eleições do Congresso ficará mais fácil para o governo
encaminhar suas pautas”, fingem raciocinar. Acreditar nisso é tão bizarro
quanto assentir bovinamente quando o presidente diz na cara dura que sempre foi
pró-vacina.
Outros
raciocínios entre a boa e a má-fé dão conta de que Bolsonaro vai se “moderar” e
“dialogar”. Onde essas pessoas vivem? Basta um dado de ontem para desmontar
essa lenda: o presidente excluiu o vice, um general, de uma reunião
ministerial, porque sua mente conspiratória segue a todo o vapor.
Na semana passada, escrevi neste espaço que o centro político estava deixando Bolsonaro se refestelar no sofá e sonhar com mais quatro anos, como um cunhado folgado. Aí vem a elite econômica e ainda se oferece para comprar mais cerveja gelada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário