O Estado de S. Paulo
O ‘mito’ de 2018 acabou, o real Jair é Centrão e brinca de golpes desde criancinha.
O personagem de 2018, Messias, ou “mito”,
acabou definitivamente quando o presidente Jair Bolsonaro admitiu que “nasceu
no Centrão”, sempre foi Centrão, desde criancinha. Se o personagem da eleição
era falso, essa confissão é verdadeira e gera uma dúvida para 2022: o Bolsonaro
da TV e dos palanques será o real ou ele vai inventar um novo personagem para
enganar os bobos?
A máscara caiu desde a posse e
(literalmente até) na pandemia. Capitão insubordinado da reserva e depois
deputado do baixo clero por 28 anos, ele foi despindo a fantasia da campanha,
peça por peça, promessa por promessa, ao longo desses dois anos e meio, até
ficar evidente: o eleitorado rechaçou a candidatura do tucano Geraldo Alckmin
COM o Centrão, mas deu a vitória AO Centrão com Bolsonaro.
Entre a dezena de partidos pelos quais o presidente passou, destaca-se um, o PP, onde ele ficou dez longos anos, sem jamais ser indicado líder de bancada, presidente de comissão ou relator de qualquer tema, relevante ou não, fosse de defesa nacional, segurança, emprego, qualquer coisa. Baixo clero no Congresso, baixo clero no PP.
A simbiose entre Bolsonaro e o PP, ou
Progressistas, volta firme e forte com o senador Ciro Nogueira (PI), presidente
do partido e influente líder do Centrão, não apenas num cargo no governo, mas
no coração do governo: a Casa Civil. Onde, aliás, substituiu o general da reserva
Luiz Eduardo Ramos e criou um marco: a derrota dos militares para o Centrão.
Como Jair Bolsonaro não tem gosto, aptidão,
tempo e instrumental para governar, quem vai assumir o governo na prática é
Ciro Nogueira. Ele entende de poder, é voraz e vai acelerar ou frear os
projetos dos ministérios, como os do ministro Paulo Guedes, por exemplo.
Bolsonaro só será chamado quando a coisa empacar entre o que é bom para a
economia e o que é bom para sua reeleição. É preciso dizer qual será a decisão?
Nogueira não assume de mãos abanando. Acena
com a fusão de PP, PSL e DEM numa sigla de dar inveja à Arena, com 125
deputados para apoiar os projetos e a reeleição de Bolsonaro. A ideia surgiu há
duas semanas, em Trancoso, na Bahia, onde Ciro Nogueira se encontrou com o presidente
do PSL, Luciano Bivar, na casa de veraneio do deputado Elmar Nascimento, do
DEM. Um drinque daqui, outro dali, por que não fundir as três siglas? A questão
é saber quem lucra o quê e a resposta é óbvia: o grande beneficiário seria
Bolsonaro.
Partido do candidato Bolsonaro em 2018 e
descartado pelo presidente Bolsonaro em 2019, o PSL tem a maior bancada da
Câmara (junto com o PT) e, assim, já tem a maior cota (R$600 milhões) do fundão
eleitoral de, por ora, espantosos R$5,7 bilhões. O PP já chegou no teto, dono
da Casa Civil e do governo. E o presidente do rachado DEM, ACM Neto (BA),
avisa: “Não tenho a menor vontade, nem a menor perspectiva, de discutir uma
coisa assim”. Leia-se: “Tô fora”.
O fato é que Bolsonaro está perdendo as
estribeiras, assiste a manifestações crescentes pelo impeachment, convive com
revelações chocantes da CPI da Covid, ataca ministros do Supremo, divide as
Forças Armadas e vai perder a batalha contra a urna eletrônica – aliás, com
partidos do Centrão e o próprio Ciro Nogueira do outro lado da trincheira.
Desde 2018, Bolsonaro jogou no lixo o combate à corrupção, o liberalismo econômico, as reformas estruturais, a natimorta “nova política” e a mania de falar em “família” a cada frase. Livrou-se do peso da fantasia. Agora, é preciso mostrar o seu verdadeiro eu, o eu do Centrão, do PP, do baixo clero, do tudo pelo poder. Bolsonaro renasceu, mas continua Centrão desde criancinha e brincando de golpes e explosões como nos tempos de tenente da ativa.
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