Folha de S. Paulo
É preciso barrar a recondução do PGR e
deixar por ora vazia a cadeira que foi de Marco Aurélio no STF
É possível que Jair Bolsonaro não
venha a ser contido mesmo por meio de um impeachment ou
da derrota nas urnas em 2022. A eleição está
distante, e o impeachment, tão longe quanto um lugar que não existe, graças aos
arranjos da maior parte das elites políticas e econômicas.
Se ainda se pretende que instituições
formais da democracia ou o que resta delas ainda funcionem, é preciso vetar de
modo institucional os golpeamentos de Bolsonaro e as infecções crônicas que ele
quer inocular no Estado de Direito.
Para dar longo uns exemplos, trata-se de
barrar a recondução do procurador-geral
da República, até que ao menos ele seja julgado pela acusação de
subserviência, e deixar por ora vazia a cadeira que foi de Marco
Aurélio Mello no Supremo.
As indicações para
a PGR e para o STF são prerrogativas constitucionais do presidente; recusar os
nomes de Bolsonaro é uma prerrogativa de quem quer proteger a Constituição e as
instituições de controle da contaminação autoritária de um golpista.
Vetar Bolsonaro “de modo institucional” parece um pleonasmo. Não é. Depois de assistir a ano e meio de campanha golpista explícita, muitos donos do poder e do dinheiro ainda acomodam e aceitam o plano de destruição com “notas de repúdio”, pedidos de “pacificação” e de “harmonia” extraconstitucional entre os Poderes.
Ainda agora, o conjunto dos ministros do
Supremo emitiu “nota
de repúdio” contra a tentativa de Bolsonaro de impedir Alexandre de
Moraes. Além de inconsequente, pois sem serventia prática, é uma atitude
indevida. O STF não é ou não deveria ser (como tem sido faz mais de década) um
corpo político ou politizado, mas acima de tudo uma corte que deve proteger a
Constituição por meio de atos funcionais, por assim dizer, institucionais.
O presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (DEM-MG), também reagiu ao pedido
de impeachment de Alexandre de Moraes com
mais uma desconversa de “harmonização” extraconstitucional dos Poderes,
definidos como “harmônicos” na Constituição para que funcionem de modo conjunto
e autônomo, não para agasalhar crimes e contravenções uns dos outros.
Essas atitudes do Senado, da Câmara, do
Supremo, da maior parte da elite, são as mesmíssimas tentativas de apaziguar e
conter Bolsonaro que ouvimos desde 2018, conversa fiada que apenas alimentou o
projeto de tirania.
Na prática, é um acordão que revela uma
preferência: Bolsonaro é melhor do que a alternativa, qualquer que seja: o PT,
a instabilidade ou a convulsão política ou econômica (ainda mais?), a ameaça de
golpe militar, qual seja a desculpa ou o interesse.
Jair Bolsonaro, seus generais e suas
falanges pregam ou ameaçam golpes desde pelo menos abril de 2020. Ficava então
claro que Congresso e Supremo tentariam evitar parte menor dos piores
arreganhos autoritários do bolsonarismo, ainda que de modo circunstancial e
improvisado.
Desde então Bolsonaro apenas multiplicou
sua aposta golpista, na qual vai colocar mais moedas podres no 7
de Setembro. Permitir que continue a manipular a PGR ou que contamine de
modo duradouro o Supremo, com mais um apaniguado servil, significa colaborar
com a campanha de destruição constitucional.
Francamente, refugar o impeachment já significa ser conivente. De um ponto de vista prático, mas não muito, além de medíocre e desencantado, resta a tentativa de vetar de modo institucional os decretos e atos do golpe progressivo. Haverá confronto, talvez impasse crítico, mas a tentativa de pacificação será a derrota de quem ainda se diga democrata.
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