O Estado de S. Paulo
Eis dois dos atributos do futuro presidente
da República para tirar o País do lamaçal
Montesquieu dizia que “a indiferença pelo
bem comum é a causa da ruína das repúblicas”. Ruína que começa com a
indiferença do presidente da República em honrar suas promessas ao povo
brasileiro. Prometeu abrir a economia, privatizar estatais e aprovar reformas
liberais para desidratar o Estado intervencionista que estrangula os
brasileiros que trabalham e produzem riqueza, mas se rendeu à agenda do
corporativismo que destrói a produtividade e a competitividade do Brasil e
ainda criou mais estatais, como a ENBPar, que recebeu um aporte de R$ 4 bilhões
dos cofres públicos.
Prometeu combater a “velha política” e a
corrupção, mas se aliou ao Centrão, sepultou a Lava Jato, e pululam escândalos
de superfaturamento de vacinas e de seus familiares. Por fim, Bolsonaro
prometeu honrar os valores cristãos, mas na hora da pandemia demonstrou falta
de misericórdia e de compaixão com milhares de brasileiros que padeceram da
covid. Menosprezou a importância da vacina e repudiou o uso de máscara.
Ademais, o presidente mostra-se indiferente aos reais problemas que afetam a
vida dos brasileiros, como a queda da renda e o aumento do desemprego e da
inflação, que vem encarecendo o preço do gás de cozinha, da carne, do arroz e
feijão.
Evidentemente, o presidente da República culpa os infortúnios do seu governo à pandemia, à imprensa “esquerdista” e às decisões do Supremo Tribunal Federal e do Congresso. Essa visão infantil de que o problema está sempre nos outros revela sua incapacidade de reconhecer as incompetências política e administrativa do seu governo.
A questão crucial é como atravessar o vale
do desgoverno e das crises institucionais até a eleição de 2022. O Brasil tem
hoje um caminho e dois desvios. O caminho é a construção de um plano de ação
para defendermos a democracia e nos unirmos em torno de uma candidatura
presidencial competitiva, capaz de vencer os dois desvios – Bolsonaro e Lula. O
primeiro representa a maior ameaça à democracia desde o golpe militar de 1964;
o segundo retrata a volta ao pesadelo do passado em que se semeou a desgraça do
presente – o sectarismo político, a corrupção sistêmica que corroeu a
credibilidade das instituições e a gênese do nefasto governo Dilma, que nos
brindou com recessão econômica, 13 milhões de desempregados e a atuação
irresponsável de um Estado intervencionista que debilitou a economia.
A união dos defensores da democracia tem de
ser construída em torno de dois pilares. Primeiro, é vital restabelecer os
canais de diálogo cívico e de articulação política entre as principais lideranças
do País em torno da defesa da democracia. Trata-se de uma tarefa imperiosa para
combater o radicalismo político e os rompantes autoritários nas redes sociais,
na imprensa, no Parlamento e nas cortes. Essa missão requer verdadeiro espírito
público para sobrepor as divisões políticas que fragmentaram famílias,
partidos, instituições e a Nação. Demanda disposição de conversar com antigos
adversários para construir o entendimento em torno de prioridades urgentes para
derrotar Lula e Bolsonaro. Exige restabelecer laços de confiança que tecem o
consenso social para transformar ideias em apoio popular e votos no Congresso e
nas urnas. Foi justamente essa amálgama de objetivos claros, mobilização cívica
e resolução política que permitiu o País superar três crises: a eleição de
Tancredo Neves em 1985, a destituição do presidente Collor em 1992 e o
impeachment de Dilma em 2016.
Segundo, é preciso racionalidade e
objetividade para colocar as prioridades do Brasil acima das disputas
políticas. O Centro de Liderança Pública (CLP), em parceira com várias
instituições da sociedade civil, criou em setembro de 2020 o Unidos pelo
Brasil, um movimento para pressionar o Congresso a votar uma agenda mínima de
projetos que ajudem a impulsionar a retomada da economia e a modernização do
Estado. Ao unir pessoas determinadas a trabalhar por uma agenda de país e capaz
de mobilizar a sociedade civil e o Parlamento, o Unidos pelo Brasil exerceu
um papel protagonista na aprovação de projetos, como o marco do saneamento
básico, a autonomia do Banco Central, a nova Lei do Gás e o projeto que acaba
com os supersalários da elite da administração pública. A iniciativa prova que,
mesmo em momentos turbulentos da política, é possível avançar com a agenda
modernizadora do País, unindo esforços da sociedade civil e das lideranças
políticas em torno de objetivos comuns.
O Brasil precisa apaziguar os ânimos, focar
sua atenção numa agenda de país e olhar para o futuro. Não há futuro promissor
se continuarmos a insistir nas escolhas erradas do passado que pavimentaram o
caminho do radicalismo político, da recessão econômica, do desemprego e da
maior crise social no País. A construção do Brasil que queremos começa pelas
escolhas que faremos em 2022. O futuro presidente precisa ter dois atributos
para tirar o País do lamaçal do patrimonialismo, do corporativismo e do
clientelismo: caráter e liderança.
*Cientista político, é autor do livro
‘10 mandamentos – do Brasil que somos para o país de queremos’
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