O Estado de S. Paulo
Legislativo e Judiciário mostraram-se mais
fortes do que as ameaças do presidente
Ruíram os mitos que sustentavam a imagem
popular de Jair
Bolsonaro e que ele usava como argumento de força para ser
reconhecido, desde já, presidente vitalício do Brasil. Sem passar por nova
eleição.
Bolsonaro havia feito crer que, com seus poderes extraordinários de cavaleiro do apocalipse, daria voz de comando ao Judiciário, ao Legislativo, às espadas e aos fuzis. Imaginava-se, no mínimo, que o País se encaminhava para um golpe. Tal como expresso nas faixas exibidas por seus eleitores que foram às ruas para apoiá-lo: intervenção militar e novo AI-5. A senha do golpe já estava registrada, poderia até ser o insulto violento ao ministro Alexandre de Moraes (STF), que nomeou seu algoz, proferido nos microfones do palanque.
O governo jamais desfez esta impressão,
dominante entre seus apoiadores, inclusive.
Antes mesmo do 7 de Setembro,
esfumaçaram-se alguns desses mitos. A elite do agronegócio, por exemplo, ao
defender a democracia, mostrou que o bolsonarismo radical, em seu meio, é
restrito. O sistema financeiro garantiu, de papel passado, a Constituição e
suas instituições democráticas. Os poderes Legislativo e Judiciário
mostraram-se mais fortes do que as ameaças de destruição feitas pelo presidente
da República e seus porta-vozes.
Restava a expectativa sobre de onde viria,
então, o primeiro tiro, uma vez que o apoio armado a Bolsonaro não se mostrava
ostensivo.
Ao descer, trêmulo, do palco do comício que
fez em São Paulo, Bolsonaro mostrou que a manipulação que faria das polícias
militares, do Exército Nacional, do Ministério Público e da Polícia Federal
tornara-se, sem que percebesse, um sonho impossível.
O domínio discricionário das Forças
Armadas, o mais temido dos mitos que cercam o poder de Bolsonaro, nem sequer
foi tentado. O Exército não se afastou um milímetro do seu papel
constitucional. Os generais em evidência na cúpula presidencial saíram
silenciosos da refrega que promoveram na data nacional. Já pequenos,
reduziram-se mais.
O País deve observar, na sequência, a descompressão
forçada do presidente sobre os comandantes militares de tropa. Poderão estas
forças, também, reagir com mais firmeza ao não atender a pedidos de atuação
política fora de seus regulamentos, insistentemente feitos pela Presidência e
pelo atual Ministério da Defesa.
O apreço dos militares por Bolsonaro
permanece elevado. A ele reservam lealdade, respeito à hierarquia e disciplina.
E esperam que o presidente faça o mesmo e tenha se convencido de que cumprirão
com rigor suas funções, catálogo em que não está previsto o golpe.
Outro mito cuja ausência as manifestações
revelaram foi o de controle total das polícias militares, sobre quem,
inclusive, Bolsonaro patrocina legislação para torná-las submissas ao comando
federal. Nenhuma PM descumpriu ordem de seu governador.
As manifestações apontaram ainda que a
Polícia Federal são muitas e nem todas estão sob as ordens diretas de Jair
Bolsonaro. Cada delegado é um poder. O presidente domina alguns deles. Não
todos. Estão conduzindo inquéritos e fazendo prisões de amigos, parlamentares
aliados e cúmplices. O “meu pessoal”, como Bolsonaro os define.
O Ministério Público, outro mito da aliança
incondicional, nutrido no comportamento dúbio do procurador Augusto Aras, não
está agindo como esperado. Até Aras, e não apenas os demais integrantes da
instituição, tem contrariado os caprichos do presidente. Bolsonaro, até hoje,
quase três anos de mandato, ainda não entendeu a natureza das funções
presidenciais que deveria exercer.
À medida que caíram da mitologia da força
irresistível de Jair Bolsonaro, estas instituições cresceram tanto quanto se
fortaleceu o Supremo Tribunal Federal. Alvo principal dos tiros de Bolsonaro
que, por enquanto, só têm saído pela culatra.
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