O Globo
Esse ditado popular se encaixa muito bem ao
momento atual do País, em que os problemas econômicos ou são negados ou as
responsabilidades são transferidas. O prêmio de maior rejeição de paternidade
vai, certamente, para o presidente Bolsonaro – justamente em quem recai a maior
culpa.
Nesse contexto, observa-se a mesma postura
de membros do governo e aliados, como mostram os recentes ataques à gestão do
presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, por conta do aumento dos preços
dos combustíveis.
Bolsonaro não só não ajuda, como atrapalha bastante. Mesmo assim, cobra de Paulo Guedes a solução para os problemas, segundo a imprensa. Para começar, não é justo a cobrança recair apenas sobre o titular da Economia.
Os erros na gestão da saúde e o persistente
jogo do contra de Bolsonaro penalizam a economia, pela necessidade de
isolamento social prolongado e de se estender as medidas de socorro, afetando a
saúde das contas públicas. Este ano, os gastos extras com Auxílio e Benefício
Emergencial totalizam R$77 bilhões.
A gestão falha do setor de energia também
cobra sua fatura. Não é só a seca a responsável pela alta de tarifas e pelos
riscos de apagão e racionamento - que prejudicam decisões de investimento.
O governo não deu continuidade ao ajuste
iniciado na gestão Temer e tarda em resolver imbróglios, como o modelo de
formação dos preços - o cálculo superestimado da chamada garantia física -,
implicando contratação de energia aquém do necessário.
Como reflexo da postura do presidente, há a
omissão da Casa Civil, que não cumpre seu papel de organizar o governo.
O presidente prejudica a economia com sua
má gestão e por produzir incerteza política inédita para as atuais gerações.
Um canal é pela pressão cambial, elevando
preços e tarifas. O real se descolou do que seria o patamar esperado diante do
quadro internacional e da usual correlação com as demais moedas de emergentes.
Isso apesar da recuperação em “V” do PIB e
do bom desempenho das exportações – destacando positivamente o Brasil dos
demais da América Latina. Utilizando os parâmetros do passado, a taxa de câmbio
deveria estar oscilando em torno de R$4,2/US$.
Como se não bastassem os entraves
estruturais ao investimento, sendo a insegurança jurídica provavelmente o
principal deles - um tema ignorado no governo -, o presidente adiciona mais
ingredientes à receita de afugentar investidores.
O investimento estrangeiro direto recuou 62%
em 2020, ante queda de apenas 8% em países em desenvolvimento ou mesmo de 33%
no restante da América Latina e Caribe, nos cálculos da UNCTAD (o critério
difere do utilizado pelo BC, que inclui o reinvestimento de lucro, e teve queda
de 35%).
O clima de compasso de espera tende a
crescer. A postura do presidente alimenta o sentimento não só de incerteza
política até as eleições, mas de como será um possível segundo mandato. Além
disso, a reeleição poderá implicar mais dificuldades do País em se inserir nas
agendas globais, especialmente pela pauta ESG.
Há consequências também de longo prazo,
pois Bolsonaro retrocede o Brasil institucionalmente – um país até recentemente
reconhecido por ter instituições em funcionamento. O presidente enfraquece essa
imagem ao testar limites e alimentar a desconfiança e a cisão da sociedade.
Paulo Guedes tem sua parcela de
responsabilidade, por ter falhado em apresentar uma agenda econômica mais
estruturada. Houve alguns avanços em temas estruturais, mas a gestão fiscal
peca e ameaça a estabilidade macroeconômica.
O ministro fez também promessas em demasia,
pois minimizou as dificuldades técnicas e politicas de reformas. Sua
credibilidade sai arranhada, e também as perspectivas para um segundo mandato
presidencial.
A responsabilidade final, no entanto, é do
presidente. Não adiantam as tentativas de empurrar a culpa. O superministério
pode muito, mas não pode tudo. Mesmo que houvesse uma agenda estruturada, com
definição de prioridades e a necessária costura política, não funcionaria com
Bolsonaro. Não se trata de buscar outro ministro.
A ideia de terceirização da política
econômica ao “Posto Ipiranga” foi equivocadamente aceita por muitos, poupando
Bolsonaro na campanha. Na realidade, era o prenúncio dos problemas que vivemos
hoje. Pior, cada vez mais, o presidente terceiriza a agenda para o Centrão. O
próximo da fila para levar a culpa.
Que a lição esteja aprendida em 2022.
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