Folha de S. Paulo
A matemática que nos ensinam na escola peca
pela abstração
A matemática que nos ensinam na escola peca
pela abstração. A maioria das pessoas não consegue usar a trigonometria em seu
dia a dia. Já a teoria dos jogos, que quase não é ensinada nas escolas, é
escandalosamente prática. Ela, afinal, pode ser descrita como o estudo das
interações estratégicas entre agentes racionais. Também dá para dizer que ela
expande a lógica para todos os domínios da vida.
Não é uma coincidência que, depois que Von Neumann unificou e deu nome à teoria dos jogos, em meados dos anos 40, ela se espalhou como um rastilho de pólvora. Invadiu a biologia, tomou de assalto a economia (onde produziu 11 prêmios Nobel) e deixou marcas em todas as ciências sociais. Tem ainda forte presença na ciência da computação.
A atividade policial não passou incólume. O
célebre dilema do prisioneiro ilustra bem o poder que ofertas de barganha penal
têm de moldar comportamentos, permitindo que se coloque a matemática a serviço
do combate ao crime. Há até quem sustente que, sem mecanismos como o de delação
premiada, é impossível desbaratar as quadrilhas organizadas.
O Brasil, sempre chegado a um
negacionismozinho, até flertou com a ciência. As delações premiadas usadas na
Operação Lava Jato produziram resultados, que se mediram em condenações
inéditas e bilhões de reais recuperados para os cofres públicos. Houve, por
certo, abusos, como nos processos contra Lula, que cobravam reparos. Mas a
forma que o Judiciário escolheu para fazê-los foi, para usar um termo suave,
destrambelhada.
O resultado prático, como mostrou
reportagem de Felipe Bächtold, é que os réus que firmaram acordos de delação
premiada estão hoje em situação penal pior do que aqueles que ficaram em
silêncio e depois tiveram seus processos anulados. Não é preciso um Von Neumann
para concluir que o recado que o Judiciário passa é: jamais colabore com a
Justiça. No Brasil, avacalhamos até a matemática.
Nenhum comentário:
Postar um comentário