O Estado de S. Paulo
É preciso encarar a Amazônia como um problema vital de alta complexidade, que não pode ser objeto de políticas setoriais
A Amazônia é o mais gritante símbolo da
crise que hoje corrói nosso País, política, sanitária e economicamente. Nos
veículos domésticos e internacionais de informação, a sobrevivência da
Amazônia, seja da floresta, de suas populações, ou de sua economia, é encarada
como em risco de extinção.
Independentemente da correção das
informações, parece não ter limites a lista de denúncias sobre o descontrole do
combate ao desmatamento, à exploração e comércio ilegais da fauna e da flora,
passando pelo garimpo ilícito, negligência do poder público com relação à sua
população e as limitações dos serviços de saúde e educação. Na prática,
qualquer pendência internacional com o Brasil, real ou imaginária, acaba sendo
automaticamente associada, na opinião pública internacional, aos riscos à
segurança global atribuídos às políticas de governo e às atividades econômicas
na Amazônia. O que propicia pretextos para diferentes formas de embargos e
sanções comerciais e financeiras.
Existem limites para sanções unilaterais que redundam no uso do comércio como instrumento de pressão geopolítica e no uso de pressões geopolíticas como instrumento de disputa comercial ou financeira. A diplomacia brasileira domina os instrumentos de defesa de suas exportações e do acesso de seus investimentos a outros mercados.
Entretanto, os governos americanos de ambos
os partidos, nas últimas décadas, têmse empenhado em enfraquecer, a ponto de
praticamente anular, a capacidade da Organização Mundial do Comércio para
mediar e dirimir disputas dessa natureza. Além disso, o conteúdo exclusivamente
de disputa comercial (sobretudo exportações de minérios, grãos e carne)
tornou-se uma pequena parcela das ameaças de intervenção geopolítica. Hoje elas
englobam as políticas ambientais e climáticas, a expansão agropecuária, as
políticas indígenas, a violência, o trabalho infantil, o investimento
estrangeiro no País, a discriminação contra minorias, as ameaças contra o
sistema de democracia representativa, para dar alguns exemplos.
A principal causa dessa percepção
generalizada do País, como um pária e como risco para a humanidade, é a adoção
de uma atitude de desafio do governo brasileiro sobre as acusações de má
conduta com relação à Amazônia. De fato, o governo tem assumido publicamente
seu desprezo pela legislação e implementação das políticas de proteção
ambiental, climática e fundiária. O mesmo tipo de investida nas políticas
identitárias e outras manifestações de ódio, além do descontrole fiscal, só
estimulam essa imagem externa.
Os eleitores têm o direito de cobrar, de
partidos e candidatos, sua posição em relação ao problema vital da Amazônia:
como e com que urgência pretendem recuperar a confiança dos governos e da
opinião pública internacional, como retomar o fluxo de investimentos, tanto os
vinculados a programas dirigidos para a Amazônia como os vinculados a fundos de
investimento de modo geral.
É preciso encarar a Amazônia como um
problema vital de alta complexidade, que não pode ser objeto de políticas
setoriais, nem de decisões unilaterais dos Estados e municípios e de diferentes
burocracias. Os entendimentos e negociações destinados a recuperar o diálogo e
a cooperação para a solução desses problemas teriam de se apoiar em estudos e
planos de implementação, envolvendo os três níveis da federação, com
participação de organizações locais, e de investidores nacionais e
estrangeiros.
Em suma, os candidatos que se proponham a
enfrentar os problemas da Amazônia precisariam tornar clara sua competência e
sua deliberação de liderar uma coalizão internacional disposta a contribuir
para sua solução. O risco de devastação da Amazônia é real, se as atuais
orientações do governo forem mantidas.
Provocariam uma ameaça vital para todo o
País, particularmente para o bem-estar da população e de seu modo de vida.
Entre outros efeitos, mudaria o regime de chuvas no Centro-sul; afetaria o
clima e a atividade agrícola produtiva em todos os biomas do País; poderia
limitar drasticamente a produção e a exportação de alimentos. O desastre
ambiental e climático teria enormes dimensões, com repercussões profundas,
devastadoras e permanentes. Não podemos continuar permitindo que isso aconteça.
A combinação de imenso potencial de riqueza
com desigualdade econômica e social e elevado grau de vulnerabilidade
econômica, social e sanitária torna inaceitável o discurso puramente
preservacionista. A inclusão sustentável da Amazônia deveria ser organizada com
o objetivo de induzir o aproveitamento econômico não predatório dos seus
recursos naturais, criando trabalho, renda e bem-estar para seus habitantes.
O Brasil combina, em muitas áreas,
legislações e formulações de políticas corretas. O Código Florestal e a Lei da
Biodiversidade são avançados com relação a outros países, inclusive os mais
desenvolvidos. Precisamos transformar o problema amazônico em uma oportunidade,
propiciada pelo seu potencial para mobilizar recursos materiais e sociais do
que temos de melhor, nosso povo.
*Senador (PSDB-SP)
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