O Estado de S. Paulo
O País deveria apostar em um novo padrão de maioria política formado por princípios e programas, e não em promiscuidade
Eles não são alguém que devolveu o troco
errado. São os que chegam ao poder com uma mentira na alma. Com as pessoas
vivendo numa ampulheta, dominadas por um materialismo existencial que faz o
tempo passar por influência dos outros – a vida finge ser um jogo de opostos.
A emoção tem partes vis que quando entram
em nossa vida com a falsa familiaridade de notícias de massa é difícil perceber
o que está acontecendo. Em assuntos feitos para uso de outros, os sentimentos
que transmitem ocupam uma sala grande e mal iluminada da nossa emoção. Na
sociedade de públicos manipulados, o que influencia você mecanicamente
dificilmente é a seu favor.
O excesso de informação disponível dificulta à pessoa viver a simplicidade da vida moral e a tranquilidade de seguir sua vocação. A ideia, por exemplo, de que somos puro produto de questões econômicas e políticas, como a parte mais importante de tudo, não se aplica a todas as situações da vida. O coração humano é insondável e pode ser levado ao abismo pela simplificação em moda.
Um país multiculturalista que dá excessivo
realce ao dinheiro, pregando atividades financeiras como droga, onde cartão de
banco é mais importante do que matrícula escolar, carteira de identidade ou de
trabalho; negligente em atividades produtivas e espirituais; extremamente
fixado nas teorias do valor de um inviável economicismo de esquerda; só podia
desaguar no poder de um liberalismo antissocial de direita.
Sem rival verdadeiro, a política é só
rivalidade. E o materialismo político-econômico, num autoengano contagiante,
foi para cima dos sem-poder, como se fossem um formigueiro social, colocando em
segundo lugar a alma humana, confundindo religião com neurose, tirando do povo
a autonomia para pensar e viver.
O consenso convencional sobre a ordem
econômica, moeda e crédito se ampara nos atos culpáveis de uma política
financiada pelo Estado. Sem antídoto não estatal, impôs um atraso cultural aos
jovens e suas famílias que não sabem mais como ajudar os filhos no
discernimento das vocações e, assim, se livrar do maria-vaicom-as-outras que
domina o pensamento econômico fracassado que praticamos.
Há uma unidade de manual imposta pelas
paixões dos que adquiriram a oportunidade de expressá-las – concentrada, agora,
nos principais pensadores que são candidatos e assessores. Paixões pessoais
engajadas reduzem a possibilidade de deslocamentos estruturais capazes de
enfrentar costumes enraizados. A vocação pelo pensamento incompleto, e o rol de
intenções individualistas que possuem os líderes para controlar o mando sobre o
processo político, fragmentou a sociedade em pedacinhos. O candidato que não
ultrapassar seu eu ordinário não servirá ao humanismo político e plural de que
o Brasil precisa.
Ninguém vai conseguir ver o todo dando
ênfase exagerada a metas econômicas, indiferente à realidade familiar, cultural
e religiosa da vida privada. A desigualdade social no Brasil é uma falha moral
do modelo político-econômico em vigor.
A condição necessária à mais digna
existência humana é cada vez mais psicológica, espiritual e vocacional. A
análise econômica focada nos interesses de renda acomoda a sociedade na
conversa descritiva de investidores. A política sem vocação e espiritualidade
reduz sua autoridade ao dinheiro, recebe seu pagamento à sombra, não muda erros
de uma ordem que gera subdeuses.
O massacre patológico do economicismo meteu
o País numa sauna e descuidou da preocupação com tipos de ação capazes de fazer
a transição para uma vida melhor. Ações que valorizem a personalidade do
indivíduo, suas necessidades essenciais e a forma da sua interdependência
frente às instituições públicas e à vida em comunidade.
Insatisfeitos não precisam de razões,
qualquer uma serve. A ideologia entre nós é um botton pregado com alfinete.
Serve
aos que creem em qualquer coisa que os
beneficie. Fecha o espaço para as pessoas abertas a algo mais elevado e maior
do que seu interesse próprio. Fornece a justificativa moral para o oportunismo
agir como se fosse diálogo.
A melhor interpretação da conjuntura não
deve se contentar com reciclagem de material, memória velha se fazendo de nova,
onde o groucho marxismo impera: são estes meus princípios. Se você não gostar,
tenho outros! É preciso alguém que não veja a história como registro para
enganar palermas.
O País deveria apostar em um novo padrão de
maioria política formado por princípios e programas, e não em promiscuidade. A
ordem social só se configura como significativa, se suas circunstâncias
produzem coletivos dispostos a comandar o processo de mudança. E o conjunto que
melhor simboliza a contribuição histórica necessária ao momento deve ser capaz
de dar voz à maioria dos eleitores, reunindo o liberal clássico, a nova
esquerda, o centroprogressista e os anseios do cidadão comum. Eleger o Centrão
para não ter de comprar o Centrão é diplomar na posse o aborrecimento.
Vemos uma sucessão que se anuncia
trepidante, mas enlatada e estéril. Ainda é tempo de reflexão. O Brasil nasceu
para algo muito melhor do que alguém sempre lhe pregando peças.
*Sociólogo
Um comentário:
O Brasil nasceu para ser o que sempre foi,é só tirar Bolsonaro de lá,vamos continuar tendo problemas,mas sem os absurdos que vemos hoje.
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