segunda-feira, 4 de abril de 2022

Celso Rocha de Barros: Quem sobrará de pé na terceira via?

Folha de S. Paulo

No fim, a quinta (31) entregou menos novidades do que pareceu que entregaria

Na quinta-feira (31), o processo de consolidação das candidaturas da terceira via avançou. Em um dado momento do dia, pareceu que avançaria mais.

Sergio Moro desistiu de sua candidatura "por enquanto". Escrevi sobre a possibilidade de Moro desistir no dia 12 de fevereiro, e continuo achando a mesma coisa: Moro é prejudicado pela adesão maciça de seus aliados potenciais ao governo Bolsonaro, o mesmo que desmontou a Lava Jato.

Como outros candidatos da terceira via, Moro é um forte candidato para a eleição passada. Depois do desastre de Bolsonaro, a "velha política" deve voltar a ser importante esse ano. A corrupção deve ser substituída pela economia como pauta principal da eleição. Nada disso joga a favor de Moro.

Moro tinha cerca de 10% das intenções de voto. Uma parte desses votos deve ir para Bolsonaro, mas imagino que a maioria vá para o candidato que Moro apoiar. Essas transferências podem mudar o placar do primeiro turno, mas é difícil que alterem as posições no pódio.

João Doria também ameaçou desistir, mas voltou atrás. Percebeu que a articulação contra ele vinha pesada, por dois lados: Eduardo Leite, um político jovem em primeiro mandato de governador, não teria deixado o governo do Rio Grande do Sul se não contasse com aliados de peso para tentar melar as prévias que perdeu no PSDB. Do outro lado, Rodrigo Garcia, vice de Doria, planejava se distanciar do companheiro de chapa no minuto em que se sentasse na cadeira de governador. A candidatura de Rodrigo Garcia vai mal nas pesquisas. Seus aliados acreditam que isso se deve à sua associação com Doria.

Em uma jogada ousada e, ao menos no curto prazo, bem-sucedida, Doria assumiu o papel de homem-bomba. Ameaçou continuar no governo do Estado até o fim do mandato. Se isso acontecesse, Rodrigo Garcia não concorreria sentado na cadeira de governador, com a caneta do governador e a cobertura de imprensa do governador. O PSDB perderia o governo de São Paulo depois de 28 anos.

Diante da ameaça, os tucanos deram à Doria uma carta garantindo que o candidato será ele. Ninguém sabe quanto vale essa carta. E o fato de que Eduardo Leite não retira sua candidatura é péssimo para Doria. Que acordos ele pode fechar enquanto os aliados em potencial não tiverem ideia se ele será mesmo candidato?

Ao terminar o dia candidato, Doria impediu que dois grandes deslocamentos acontecessem.

Na disputa paulista, Tarcísio de Freitas teria sido fortemente beneficiado pela desistência de Doria. A desistência reduziria as chances de Rodrigo Garcia a zero, e a direita paulista trocaria de candidato como fez na eleição de 2018. Mantendo-se na disputa, Doria barrou esse movimento, ao menos por enquanto.

Na disputa nacional, a desistência de Doria no mesmo dia que a de Moro seria uma oportunidade muito boa para lançar uma candidatura de unidade da terceira via, como Simone Tebet/Eduardo Leite. Houve gente que se entusiasmou com essa possibilidade na quinta-feira. Nos dias seguintes, Moro encontrou-se com Leite e Tebet, separadamente.

Doria também barrou esse movimento quando decidiu manter sua candidatura. Já na sexta-feira, Tebet referia-se a Doria como "legítimo candidato do PSDB".

No fim, a quinta-feira entregou menos novidades do que pareceu que entregaria. A terceira via permanece um movimento que não consegue tração no ambiente político atual. Os últimos conflitos me lembram das brigas de grupos de esquerda radicais que testemunhei na juventude: era muito quebra-pau para pouco voto.

 

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