terça-feira, 3 de maio de 2022

Andrea Jubé: Lula testa quadros do PT para a Fazenda

Valor Econômico

Alexandre Padilha e Jaques Wagner são vozes de Lula sobre economia

Sem alarde, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a dar sinais de reedição do método adotado em 2002, quando venceu a eleição presidencial, para escolher quem será o responsável, em seu eventual futuro governo, pela condução da política fiscal.

Naquele ano, o ex-prefeito de Ribeirão Preto Antonio Palocci foi acumulando missões, ampliando a interlocução com empresários e com o mercado financeiro, na função de coordenador do programa de governo.

Ainda assim, causou espécie quando veio a público a nomeação de um médico para o Ministério da Fazenda. Para o desempenho da função, Palocci cercou-se de quadros ortodoxos e abalizados como Marcos Lisboa e Joaquim Levy.

Duas décadas depois, após afirmar a uma dezena de interlocutores que pretende nomear um político para o Ministério da Fazenda - caso saia vitorioso do pleito em outubro -, Lula voltou a colocar em prática o velho método, destacando quadros orgânicos do PT para a interlocução com empresários e com o mercado financeiro.

Mais uma vez, Lula escalou um médico de perfil moderado para dialogar com o mercado financeiro. O ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) surpreendeu positivamente o grupo de investidores com quem dialogou durante um almoço em Washington, no dia 22, em painel organizado pela XP Investimentos, durante a semana de eventos do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Padilha foi convidado para fazer uma palestra sobre a conjuntura política e eleitoral, mas acabou ampliando a fala para o quadro econômico. Na véspera, ele havia se reunido com Lula para afinar o discurso.

A resposta foi tão positiva que o ex-presidente o enviou para uma nova missão junto a investidores, e Padilha- que também foi ministro das Relações Institucionais -, representou o presidenciável do PT em evento promovido pelo Banco Itaú/BBA, na Avenida Faria Lima, em São Paulo, no dia 28 de abril.

Segundo fontes que acompanharam a exposição de Padilha no evento da XP Investimentos, o petista confirmou que Lula pretende modificar o teto de gastos, mas rechaçou a hipótese de que o ex-presidente faça qualquer movimento abrupto nesse sentido. O ex-ministro da Saúde admitiu que o PT menciona a “revogação” da reforma trabalhista, mas ponderou que Lula desejaria, na verdade, revisar pontos da matéria. E que se for eleito, o petista trabalhará fortemente por uma reforma tributária.

Sobre o teto de gastos, segundo Padilha, Lula estaria idealizando um formato semelhante ao adotado com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em que os recursos para as obras de infraestrutura ficariam de fora do cálculo do superávit primário.

Padilha ressaltou à audiência que o estilo de Lula não é o de canetadas. Lembrou que qualquer mudança sensível nas regras econômicas seria antes discutida em uma mesa de negociações que reuniria representantes do setor produtivo e dos trabalhadores. Segundo o ex-ministro, a ideia de Lula é resgatar o modelo do extinto Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o “Conselhão”, que reunia representantes de todos os segmentos da sociedade civil.

De fato, em um evento com sindicalistas no dia 14 de abril, ao lado do ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) - que será candidato a vice na chapa petista -, Lula afirmou que os sindicatos terão participação mais ativa em sua eventual nova gestão.

Mas ao mencionar a revisão da reforma trabalhista e uma reforma tributária, o ex-presidente disse que chamaria os presidentes da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), e os sindicalistas, para discutirem juntos as mudanças. “Vamos colocar todo mundo na mesa, e eu quero saber qual é o compromisso de cada um”, acenou Lula naquele ato.

Ainda segundo participantes do evento da XP, Padilha foi cobrado pela audiência por um Lula mais “moderado”, e voltado para o centro. O petista respondeu que o aceno mais eloquente nesse sentido foi a aliança com o ex-adversário Geraldo Alckmin: essa teria sido a principal “inflexão” da campanha petista de 2022.

Porém, Padilha não é o único quadro do PT que Lula vem testando para o comando da Fazenda - caso resgate a velha nomenclatura da pasta. O senador Jaques Wagner também despontou como emissário de Lula para um evento internacional de ampla repercussão, especialmente junto a setores econômicos.

Duas vezes governador da Bahia, ex-ministro das Relações Institucionais, da Casa Civil e da Defesa, Wagner representou a pré-campanha de Lula no evento Brazil Conference, em Boston, no dia 9 de abril, organizado por estudantes brasileiros da Universidade de Harvard.

Wagner também exaltou o perfil conciliador de Lula no evento, e afirmou que, se for eleito, o petista governará de forma ampla e negociada. “Tenho absoluta convicção que, se ganhar a eleição, Lula será um presidente melhorado”, ressaltou. “Não é um ET que está baixando. É alguém que governou o país por oito anos”, completou.

No mesmo evento, Wagner rechaçou que Lula seja um político de esquerda, e pretenda instituir uma gestão com esse viés. “Lula não é um cara formado dogmaticamente no campo da esquerda. Ele não se formou lendo os livros da esquerda, ele se formou na vida”, observou o petista. “Ele é um cristão, um justiceiro social, se você quiser uma definição”, acrescentou o senador.

Amigo de Lula há 44 anos, o “Galego”, como é afetivamente chamado pelo ex-presidente, já aparecia como cotado para o Ministério da Fazenda do eventual novo governo petista, ao contrário de Padilha, cuja aposta surpreendeu o mercado.

Wagner vai acumular função de conselheiro na coordenação da campanha de Lula, ao mesmo tempo em que se dedicará a tentar eleger o ex-secretário de Educação Jerônimo Rodrigues (PT) na complicada eleição para o governo da Bahia.

 

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