O Estado de S. Paulo
O desequilíbrio entre os Poderes da República desafia Lula e Bolsonaro
Se as pesquisas se confirmarem e Lula
acordar presidente em outubro, a dúvida é saber se ele conseguirá reconhecer o
cargo que já ocupou. Prisioneiro de um imaginário do passado, Lula não
demonstrou até aqui ter compreendido o esvaziamento da função do chefe do
Executivo, situação agravada por dois presidentes fracos, Dilma e Bolsonaro.
Nem se enxerga o grau de desequilíbrio
entre os Poderes da República. Desde a primeira vitória eleitoral de Lula, há
exatos 20 anos, o Legislativo assumiu prerrogativas e poderes inéditos, ao
mesmo tempo que ampliou seu fracionamento e prosseguiu o esfacelamento dos
partidos políticos. É altamente simbólico que o Centrão tivesse ocupado
instâncias nevrálgicas dentro do Palácio do Planalto.
Talvez esse fato explique a razão de o chefe do Executivo acusar o STF como o principal adversário que o impediria de governar. Não é objetivo deste texto discutir quem é o “culpado” pelo ativismo político do Judiciário. O fato é que o STF tem sido legislador, tem interferido no Executivo (goste-se ou não disso), suas decisões têm enorme impacto sobre a economia (em questões tributárias, por exemplo) e virou um contendor com notável influência na disputa político-eleitoral.
Se Lula não for capaz de criar uma
“corrente” de forças convergentes – até aqui não conseguiu –, dificilmente
arrancará de volta do Legislativo as ferramentas de poder. O peso dos diversos
interesses do Centrão é muito grande e as ameaças de Arthur Lira, o atual
primeiro-ministro, de partir para alguma forma de parlamentarismo não são
apenas moeda de troca a ser negociada com o ocupante do Planalto.
Com o STF trata-se de perspectiva
igualmente espinhosa. A “judicialização da política” não é fenômeno recente,
mas, sim, um processo que vem se intensificando. Não basta a tal “vontade
política”, da qual Lula tanto fala, para “restaurar” ao STF a condição original
de Corte constitucional. É o papel da instituição que vem mudando – portanto,
duas ou mais nomeações para o tribunal pouco alteram o quadro geral.
Os resultados das urnas em outubro serão
contestados por Bolsonaro (já estão sendo), e há dúvidas apenas sobre o grau de
virulência ou até violência. Mas o quadro geral promete ser o de estabilidade
desse desequilíbrio, com severas limitações para qualquer presidente. Esse tipo
de “previsibilidade” ajuda a explicar o ambiente geral de pouco medo, mas
também de poucas esperanças.
Um comentário:
É,a esperança é a última que morre,mas também morre.
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