Valor Econômico
Eleitor precisa de argumentos ou, pelo
menos, de um, para se convencer de que sua vida vai melhorar
"O eleitor não usa 40 argumentos para
definir seu voto. Usa três ou quatro. Cinco se for muito sofisticado. No mais
das vezes um único argumento é suficiente. O importante é descobrir que
argumento é este (...) Na campanha de Collor (1989) foi o caçador de marajás,
na de Fernando Henrique (1994), o controle da inflação, na de Lula (2002), o
desejo de mudança e na de Dilma (2010), a confiança na continuidade do
bem-estar”
Antes de chegar a Bolsonaro e seu protesto,
em 2018, contra tudo e todos, Orjan Olsen ainda passeou pela campanha de Ronald
Reagan (1980), quando acompanhou de perto a obsessão de seus estrategistas.
Quando o eleitor desejasse pagar menos impostos era em Reagan que ele teria que
pensar.
Mais experiente especialista em opinião
pública do país, presidente da consultoria Analítica e ex-diretor do Ibope, o
discreto Orjan Olsen fez um raro comentário público sobre eleições num encontro
da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel). Incumbiu sua
plateia da resposta sobre qual é o argumento-matador da eleição deste ano. Mas
deixou claro que a resposta viria daquilo que vai melhorar a vida do eleitor.
Parece banal, mas não é. Ao alardear sobre o risco que oferece à democracia, o presidente da República ofereceu a isca aos adversários. A opção, por óbvio, é a barbárie. Mas a democracia decorre do respeito às regras em que as opções para se melhorar a vida da maioria estarão em jogo. Não é a palavra de ordem. É a própria ordem. A palavra é outra.
As pesquisas têm sugerido que esta é uma
campanha a ser definida pela economia e, entre seus temas, pela inflação. O
caminho para a depuração da palavra-chave é longo. Passa por cruzamentos entre
os problemas apontados e a intenção de voto. Mas o palpite é livre: carestia.
Esta é uma aposta a ser testada. Atinge a maioria do eleitorado e não há sinais
de que se lhe ofereça uma resposta até outubro.
A aposta está no horizonte da maioria dos
candidatos que têm filmetes comparando os preços antes e depois de Bolsonaro. O
que não está clara é a resposta do mercado eleitoral para seu combate. Até
porque quase tudo o que os candidatos prometem passa por gasto público, cujo
estouro não costuma ser receita contra a inflação. A inflação não tem um único
culpado, mas só um candidato convencerá o eleitor de que é o mais capacitado
para combatê-la.
A inflação dominou uma única campanha desde
a redemocratização. Fernando Henrique não se elegeu prometendo combatê-la mas
por tê-la combatido.
A antologia dos artigos do ex-presidente
organizada por Miguel Darcy, “O gesto e a palavra” (Companhia das Letras,
2022), mostra que FH identificou o problema a ser perseguido pelo menos 15 anos
antes de se eleger. “Como será feita a propalada redistribuição de renda e como
se entrosarão as políticas econômicas com as políticas sociais? A ninguém
parece sensato um plano que contenha a inflação e, ao mesmo tempo, dê sinais de
redistribuir a renda efetivamente”, dizia FH em janeiro de 1979.
Era outro o Brasil, mas FH entendeu que a
oposição não podia se guiar pelo retrovisor. Tinha que entender transformações
como a expansão do operariado fabril, a mobilidade social, a emergência dos
boias-frias e de setores da classe média engajados nas novas tecnologias - as
mudanças, enfim, do que chamava de modernização capitalista.
Entre as lideranças que via como capazes de
entender e capitanear estas mudanças estava aquele que depois seria seu
adversário: “Quem dará à ordem nacional democrática em reconstrução o sentido
social que ela requer serão os líderes sindicais de oposição, os Lulas, que são
muitos”.
A ditadura que FH e Lula combateram durou
21 anos. O governo Bolsonaro, ainda que mais breve, foi atravessado por uma
pandemia que radicalizou mudanças na sociedade que o precederam, como a
economia dos aplicativos.
Foi preciso que o PSDB aparecesse, pela
primeira vez, sem perspectiva de candidato para que o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva encarasse, com todas as letras, a necessidade de atualizar seu
discurso para atrair os órfãos do partido. Depois que os tucanos deram a
maioria de seus votos a favor do voto impresso e da educação familiar ficou
difícil divisar órfãos, mas eles existem.
Às 9h30 da terça-feira, o perfil oficial de
Lula no Twitter publicou: “Temos que readequar as leis trabalhistas pro mundo
que temos. E isso significa rediscutir uma legislação trabalhista junto com
sindicalistas, empresários e com o governo. Não queremos voltar para o passado,
queremos olhar para o futuro”.
O jogo de palavras que suprimiu a revogação
e jogou a bola pra frente, a incorporação de Geraldo Alckmin à negociação e a
publicação do tuíte pela conta do candidato petista depois do réquiem da
candidatura João Dória não deixam dúvida de que esta é uma vereda que Lula
tenta abrir para o eleitor de centro.
Se Lula está disposto a discutir uma
legislação trabalhista que, preservada a proteção à invalidez e à
aposentadoria, esteja mais aberta à geração de empregos, ainda não está claro
qual será a política para a Petrobras que, nos governos do PT, serviu de
escoadouro de recursos públicos.
Se o combate à inflação passa pelas
expectativas dos agentes econômicos, não se trata de um tema alheio à
estabilidade da economia. E não é impossível encontrar um campo de
convergência. A começar por investidores como Armínio Fraga, ex-presidente do
Banco Central na gestão FH.
Ele discorda da privatização da Eletrobras
por não estar convencido de que os interesses que colonizam a estatal, desde
FH, ressalta, serão dela afastados pelo modelo proposto. Se na Eletrobras o
problema é o modelo, na Petrobras a discordância de Fraga é com a privatização
em si, o que não o leva a concordar com as políticas do PT para a estatal.
Enquanto Lula não disser o que pretende na
Petrobras, prevalecerão iniciativas como a da ação contra Sergio Moro para que
o ex-juiz pague os prejuízos causados pela Lava-jato. A iniciativa não é de
Lula, mas do grupo Prerrogativas e de parlamentares do PT. Levará, porém, ao
rebote de quem vai cobrar, de Lula, prejuízos gerados por governos petistas à
estatal.
Há dez anos, FH palpitou sobre um Brasil
que mirava no “espelho retrovisor das corrupções”. Parecia se dirigir a seu
partido, mas o WO libera a carapuça: “É hora, portanto, de um discurso que, sem
olhar para o retrovisor e sem bater boca com o ‘outro lado’ até porque os lados
estão confundidos, surja de base moral para mobilizar a população”. Que outro
além da carestia?
Um comentário:
A sigla FHC já foi consagrada,não sei por que encurtar pra FH.
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