domingo, 26 de junho de 2022

Bruno Boghossian: Corra que a polícia vem ai

Folha de S. Paulo

Segundo relato de Milton Ribeiro, preocupação de Bolsonaro era com a própria sobrevivência

Não foi por piedade que Jair Bolsonaro telefonou para Milton Ribeiro no dia 9 de junho. Tudo indica que o presidente sabia que o ex-ministro estava na mira da Polícia Federal, mas a maior preocupação era com os abalos que as investigações de corrupção no MEC poderiam causar no Palácio do Planalto.

"Ele está com pressentimento, novamente, de que eles podem querer atingi-lo através de mim", disse Ribeiro, ao relatar à filha a conversa que tivera com o antigo chefe.

Na melhor das hipóteses, Bolsonaro apenas calculava os danos políticos que uma batida no apartamento do ex-ministro teria sobre seu governo, sua imagem e a bandeira anticorrupção. Na pior, mas não menos realista, ele temia que, durante a ação, os policiais encontrassem algo que pudesse incriminá-lo.

Em qualquer circunstância, o que se tem é a figura de um presidente da República que foge da polícia. Com medo de prejuízos eleitorais ou de uma investigação criminal, Bolsonaro deu ao ex-auxiliar quase duas semanas para arrumar a casa antes de receber a visita dos agentes.

Depois da prisão de Ribeiro, o presidente não conseguiu esconder o que o afligia. Em entrevista à rádio Itatiaia, Bolsonaro se desvencilhou do ex-ministro, disse que ele deveria responder pelos próprios atos e afirmou que a investigação era um sinal de que não havia interferência na PF. "Porque isso aí vai respingar em mim, obviamente", acrescentou.

O presidente já havia sido manchado meses antes, quando surgiram as suspeitas envolvendo os lobistas que negociavam a liberação de verba da Educação. Gravado uma primeira vez, Ribeiro atribuiu a Bolsonaro um "pedido especial" para privilegiar os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura. Aliás, se o ex-ministro foi avisado da ameaça de uma operação, é possível que a dupla também tenha sido alertada.

O telefonema pode levar Bolsonaro a responder por interferências na investigação. Ele dificilmente correria esse risco se sua própria sobrevivência não estivesse em jogo.

 

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