domingo, 17 de julho de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais

Ruínas fiscais

Folha de S. Paulo

Deterioração das práticas orçamentárias obstrui promoção do bem-estar da maioria da população

As mais recentes investidas do Executivo e da vasta maioria do Legislativo contra as instituições da responsabilidade fiscal legarão uma terra arruinada para os próximos mandatários e uma conta soberba a ser paga sobretudo pela parcela mais pobre da sociedade brasileira.

Os ataques bárbaros ao que assegurava um mínimo de compromisso com o equilíbrio e a previsibilidade dos orçamentos federais não se restringiram ao tropel atiçado pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e pelo deputado Arthur Lira (PP-AL) na aprovação da PEC do desespero eleitoral.

As cargas de assalto também atingiram a Lei de Diretrizes Orçamentárias, norma que antecede e baliza a elaboração do Orçamento de 2023, entre outros dispositivos legais erigidos no farfalhar destes últimos dias de farra parlamentar.

O pagamento das emendas de relator —fina flor do clientelismo, da ineficiência e da corrupção— escapou por pouco de se tornar obrigatório. Esse mecanismo obscuro, pelo qual a elite do Congresso decide quem recebe e quem não recebe bilhões arrecadados do contribuinte, ainda assim saiu fortalecido, quando deveria ter sido extinto.

Agora o Executivo será obrigado, ao remeter a proposta orçamentária de 2023 ao Congresso, a deixar carimbada e reservada a verba, estimada em R$ 19 bilhões, para as emendas cuja destinação será arbitrada pelo relator da peça e seus padrinhos políticos no Legislativo.

O dispositivo livra os congressistas de terem de explicitar que outros programas públicos vão sacrificar —na saúde, na educação, na assistência social— para financiar o seu convescote oligárquico.

Outra esperteza embutida na LDO atribui ao Congresso, e não mais ao Executivo, a fixação da estimativa de inflação que valerá para definir o teto de despesas orçamentárias do ano que vem, um incentivo à superestimação do indexador para aumentar os gastos.

O governo ficará também obrigado a arcar com todo o montante aprovado pelo Congresso para financiar as atividades dos partidos, recursos que têm servido para locupletar e entronizar os chefões das siglas. Anteriormente, a despesa obrigatória ficava restrita aos limites fixados na lei eleitoral.

A deterioração das instituições de controle sobre o Orçamento não deveria ser enxergada com pouca preocupação. A fim de assegurar os bens públicos que promovem bem-estar e prosperidade, a democracia depende do debate enriquecido, transparente e responsável entre os representantes da população acerca da arrecadação e da utilização dos fundos comuns.

Os interesses da maioria da população estarão ameaçados caso não se reverta depressa esse processo que arruína o arcabouço fiscal.

Mau aprendiz

Folha de S. Paulo

Após sequência de tropeços, Moro desafia padrinho político e se lança ao Senado pelo Paraná

Tem sido acidentada a trajetória do ex-juiz Sergio Moro na política desde que decidiu abandonar a magistratura para participar do governo Jair Bolsonaro (PL).

Ele completara um ano no Ministério da Justiça quando rompeu com o presidente, a quem acusou de interferir na Polícia Federal em busca de proteção para os filhos.

Após breve passagem pelo setor privado, Moro filiou-se ao Podemos para entrar na corrida presidencial, mas logo viu suas pretensões inviabilizadas pela fragilidade da legenda e pela falta de entusiasmo popular pelo seu nome.

O ex-juiz mudou-se então para o União Brasil, que podou suas ambições. Parecia conformado com a ideia de concorrer a uma cadeira de deputado federal por São Paulo, mas a Justiça barrou sua mudança de domicílio eleitoral.

Na semana passada, Moro anunciou que disputará a cadeira ocupada há oito anos pelo senador Álvaro Dias (Podemos-PR), candidato à reeleição. Assim, o ex-juiz resolveu estrear nas urnas enfrentando alguém que até outro dia era seu aliado, além de incentivador de sua entrada na política e entusiasta da Operação Lava Jato.

O percurso até aqui sugere que sobra autoconfiança a Moro, mas mostra também que falta ao neófito humildade para aprender com os próprios tropeços.

Moro diz que deixou a toga para ser ministro de Bolsonaro porque pretendia fortalecer o combate à corrupção. Achando que podia contar com o chefe e receberia, por gravidade, apoio para suas propostas, colecionou fracassos.

Tratado como traidor pelos bolsonaristas enquanto o presidente selava sua aliança com o centrão, Moro ainda viu a imagem de juiz implacável demolida quando o Supremo Tribunal Federal declarou sua suspeição e anulou as ações movidas pela Lava Jato contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Ao anunciar seus novos planos, o ex-juiz afirmou que deseja liderar a oposição no Senado a um eventual governo Lula, se o líder petista vencer a eleição. É uma ideia, mas talvez Moro esteja desatento ao que se passa em volta.

Um dia depois da decisão do ex-juiz de concorrer para senador, Lula reuniu-se com aliados na casa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e tratou com eles dos movimentos que tem feito para engrossar sua caravana. Segundo o petista, entre os que se mostram dispostos a conversar está o União Brasil, o partido de Moro.

O Brasil como construção coletiva

O Estado de S. Paulo

As nações mais prósperas são aquelas entendidas por seus cidadãos como um projeto de todos, para o qual cada grupo ou indivíduo contribui na medida de sua responsabilidade

O Brasil jamais se libertará das amarras que o aprisionam em um patamar de desenvolvimento humano, político e econômico abaixo de todo o seu potencial enquanto a sociedade não se assumir como a verdadeira responsável por seu próprio destino. Entre nós viceja o sebastianismo, essa eterna espera por um salvador que nunca chega. Cada ciclo eleitoral, com suas paixões de momento, reflete essa ânsia por encontrar o “painho” ou o “mito” de ocasião, aquele que, por seus atributos estritamente pessoais, haverá de nos tirar do atraso. Ao fim e ao cabo, o debate público fica reduzido a nomes, o que há muitos anos tem inspirado votos sob o signo da rejeição, não da esperança. Pouco se dialoga sobre uma ideia de país.

Esse ciclo pernicioso parece se repetir em 2022, ao menos até agora, às vésperas da campanha eleitoral oficial. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) lideram as pesquisas de intenção de voto não porque são vistos pela maioria dos eleitores como líderes de uma concertação política com vistas à construção de um Brasil melhor para todos, mas simplesmente por serem quem são, um o antípoda do outro. Tanto Lula como Bolsonaro têm a enorme capacidade, há que reconhecer, de explorar as emoções do eleitorado da forma mais nefasta possível. São hábeis em pautar o debate público nos termos em que ambos se sentem confortáveis – não raro ao rés do chão. As questões de fundo sobre as quais os cidadãos deveriam estar debatendo, sobretudo neste ano de eleições gerais, são deliberadamente negligenciadas.

Ao longo de quase 150 anos de história, o Estadão jamais se conformou com esse reducionismo. Este jornal acredita que é papel inalienável de um veículo jornalístico profissional e independente oferecer à sociedade informações confiáveis como substrato para o engrandecimento do debate público. Por meio de seus editoriais e reportagens, o Estadão tem procurado mostrar que os temas que interessam ao País podem ir muito além do que querem fazer crer os autoritários, populistas e irresponsáveis de plantão.

Justamente neste ano em que se prenuncia uma das campanhas eleitorais à Presidência da República mais violentas e mentirosas de nossa história, o Estadão não haveria de se omitir. O jornal elaborou 15 questões, publicadas no domingo passado, que podem servir como ponto de partida para um diálogo entre eleitores e candidatos sobre uma agenda mínima que o futuro governo precisará liderar se acaso quiser que o Brasil supere os obstáculos que impedem o País de atingir seu máximo potencial de desenvolvimento. São questões que se coadunam com as ideias constitutivas deste jornal, mas apenas por uma benfazeja coincidência: as indagações do Estadão sobre questões ligadas à educação, saúde, economia e política, entre outros temas, coincidem com diagnósticos de especialistas que enxergam o País muito acima das miudezas das disputas político-ideológicas momentâneas.

As nações mais prósperas, sob todos os aspectos, são aquelas entendidas por seus nacionais como um projeto de construção coletiva, para o qual cada indivíduo ou grupo contribui na medida de sua responsabilidade. É a essência da cidadania. Isso não implica, obviamente, a supremacia do pensamento único, nem tampouco majoritário, isto é, não significa impor às minorias a mera condição de espectadoras ou coadjuvantes. Trata-se, muito ao contrário, de uma exortação à consciência de cada um dos cidadãos. A sociedade é composta por indivíduos e interesses muito distintos, mas não necessariamente irreconciliáveis. Significa estabelecer consensos mínimos, a começar pela defesa da dignidade humana, e, a partir deles, avançar no que é possível por meio do diálogo, da boa política.

É lastimável que, até aqui, o debate público tenha sido pautado por questões inventadas pelos dois principais candidatos à Presidência, e não pelos problemas que tiram o sono da maioria dos brasileiros. Mas quando a sociedade souber que país deseja construir, tanto mais fácil será escolher quem está apto, ou não, a guiá-la nesse projeto.

Ataques à imprensa como política oficial

O Estado de S. Paulo

Hostilidade à imprensa sempre foi bandeira de campanha de Bolsonaro. Na Presidência, ele a transformou em política de governo. Neste ano, as duas táticas foram amalgamadas

Autocratas, por definição, veem instituições independentes, como o Poder Judiciário – o guardião do império da lei – ou a imprensa – a guardiã do império dos fatos – como ameaças existenciais. Por isso, esses autocratas ameaçam existencialmente essas instituições. Mas os modos são diversos. Sendo o Judiciário um dos Poderes do Estado, a extinção de sua independência se dá pelo aparelhamento. Para a imprensa independente, resta a aniquilação. É um roteiro seguido com tediosa constância por regimes autoritários na história moderna.

Durante a campanha de 2018, Jair Bolsonaro fez da desmoralização da imprensa uma bandeira política. Ao assumir a Presidência, ele a transformou em política de governo. Agora que concorre à reeleição, as duas táticas foram amalgamadas.

Segundo monitoramento promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), entre 1.º de janeiro de 2021 e 5 de maio de 2022, Jair Bolsonaro e seus três filhos com cargos eletivos realizaram, só no Twitter, 801 ataques à imprensa. Isso representa ao menos um ataque por dia.

A tendência não é nova. Segundo o instituto de monitoramento de democracia V-Dem, na última década a liberdade de imprensa no Brasil, num índice de 0 a 1, se contraiu de 0,94 para 0,54. O lulopetismo – outro inimigo figadal do jornalismo independente, que ficou 13 anos no poder e é favorito a um novo mandato presidencial – nunca recuou de sua obsessão pelo “controle social da imprensa”. Jornalistas que cobrem eventos do PT sempre foram e continuam a ser hostilizados. Mas Bolsonaro levou as agressões a um novo patamar.

Essa degradação é comprovada pela escalada dos ataques a jornalistas e meios de comunicação. Segundo a Abraji, entre janeiro e abril de 2022, foram identificados 151 episódios de agressão física e verbal e outras formas de cercear o trabalho jornalístico, como restrições de acesso à informação, negação de serviço na internet, exposição de dados pessoais, intimidação por processos civis ou penais, assassinato, assédio sexual e uso abusivo do poder estatal. Em relação ao mesmo período de 2021, o aumento foi de 26,9%.

Assim como nos três anos anteriores, discursos estigmatizantes foram a forma mais comum de hostilização, representando 66,9% dos incidentes. A categoria “agressões e ataques”, que envolve violência física, atentados e ameaças explícitas, registrou um aumento de 80%. As autoridades públicas foram os principais agressores em 2021 e o padrão vem se mantendo em 2022. Os membros do clã Bolsonaro lideram como os principais autores, ao lado de aliados e apoiadores do governo. A Abraji adverte para o potencial das redes sociais como ferramentas de ataque: 62,5% dos alertas em 2021 e 60,1% em 2022 tiveram origem ou repercussão na internet.

“Isolados, esses dados já desenham um cenário preocupante”, alerta a Abraji. “Juntas, as informações revelam um padrão de violência contra a imprensa e seus profissionais que se desenrola no ambiente online: atores políticos instigam a hostilização, seus seguidores a amplificam.”

A truculência instalada em discursos e gestos simbólicos no poder público, a começar pelo seu mais alto mandatário, se materializa em agressões físicas. Se o presidente da República ameaça “encher” um jornalista de “porrada”, quem se surpreenderá quando um motorista lança seu carro contra duas jornalistas, como aconteceu em maio em São Paulo? Ao contrário de 2021, 2022 já registrou dois casos de assassinatos de jornalistas no Brasil.

É natural, e em certa medida salutar, que os detentores do poder não nutram simpatia por jornalistas. Outra coisa é incitar o ódio à imprensa e tratá-la como “inimiga do povo”. Os críticos são combatidos com fatos e argumentos; os inimigos, com a destruição. O presidente Jair Bolsonaro já expressou esse wishful thinking de maneira indisfarçável. Falando certa vez à sua militância no infame “cercadinho”, disparou: “Acho que vou botar os jornalistas do Brasil vinculados ao Ibama. Vocês são uma raça em extinção”.

A democracia morre na escuridão. A autocracia vive dela.

China perde vigor, Brasil perde dólar

O Estado de S. Paulo

Política de covid zero faz a economia chinesa perder impulso e prejudica as exportações brasileiras

Maior importadora de produtos brasileiros, a China tem menor crescimento econômico neste ano e isso já se reflete nos dólares faturados pelo Brasil. Por duas décadas a prosperidade chinesa beneficiou amplamente a economia brasileira. Entre 2001 e 2021, a participação da maior nação asiática na receita comercial do País cresceu de 3,3% para 32,4%. Mas essa parceria, embora ainda muito forte, vem sendo afetada pela covid-19. No segundo trimestre deste ano o Produto Interno Bruto (PIB) da China foi 2,6% menor que o do período janeiro-março. A atividade foi severamente prejudicada por restrições impostas pelo governo, empenhado em eliminar totalmente os casos da doença.

A perda de impulso na economia chinesa já se refletiu no comércio com o Brasil. Em junho do ano passado o País vendeu ao mercado chinês produtos no valor de US$ 10,58 bilhões. Em junho deste ano essas vendas proporcionaram receita de US$ 9,35 bilhões, com redução de 11,34% em relação a 12 meses antes. De um ano para outro, a participação chinesa no total exportado pelo Brasil em junho caiu de 37,44% para 28,65%. Também o resultado semestral foi afetado. As exportações para a China ainda cresceram ligeiramente de um ano para outro, passando de US$ 46,98 bilhões para US$ 47,14 bilhões, mas sua participação na receita comercial brasileira, no período de janeiro a junho, diminuiu de 34,50% para 28,72%.

Embora o mercado chinês continue sendo – e provavelmente ainda seja por muito tempo – o principal destino das exportações do Brasil, o pequeno abalo ocorrido neste ano chama a atenção, mais uma vez, para o risco de uma dependência tão grande. O comércio brasileiro é global, mas poderia ser mais bem distribuído entre regiões e países.

Pouco se fez, nos últimos 20 anos, para ampliar a presença brasileira em outros mercados importantes ou potencialmente importantes. A negociação de um acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, por exemplo, continua emperrada, depois de muitos anos de conversações. Obstáculos surgiram dos dois lados e o acerto final é dificultado, agora, principalmente por problemas de relacionamento entre a Europa e o Brasil do presidente Jair Bolsonaro.

O País também ganharia se conseguisse, além de avançar em outros mercados, depender menos das exportações do agronegócio e dos minérios. Não se trata, obviamente, de reduzir o volume e o valor dessas vendas, mas de aumentar os embarques de manufaturados. As vendas do agronegócio incluem, naturalmente, alimentos processados pela indústria, mas é preciso abrir mercados para outros bens industriais.

Para isso será preciso aumentar o poder de competição da maior parte da indústria, um setor estagnado e até em declínio nos últimos dez anos. Isso envolveria a redescoberta de políticas de modernização produtiva, de inovação e de ganhos de competitividade. Nada parecido com isso ocorreu no mandato presidencial iniciado em 2019 e só voltará a ocorrer quando um novo governo, de estilo muito diferente, for instalado em Brasília.

Por que a reforma trabalhista de Temer deu certo

O Globo

Desde a introdução das novas regras, Brasil criou pelo menos 4,8 milhões de empregos formais

A economia será tema central no embate entre os candidatos a presidente, e o emprego será sem dúvida questão de destaque. Um alvo já foi escolhido: a reforma trabalhista feita em 2017 no governo Michel Temer, torpedeada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Ciro Gomes (PDT). Enquanto o ex-presidente diz que “a mentalidade de quem fez a reforma trabalhista é escravocrata”, Ciro afirma que foram dados “golpes profundos” contra o trabalhador e, embora reconheça que tenham sido feitas atualizações necessárias na legislação, defende “diálogo” para “corrigir distorções”.

Os termos são vagos, não passam de chavões e revelam, sobretudo, desinformação. A reforma quebrou a rigidez histórica da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de herança varguista, para trazer avanços como a validade jurídica dos acordos fechados entre empregado e empregador à margem da legislação (precedência do “negociado” sobre o “legislado”). Se forem consultadas as estatísticas, é inequívoca a constatação do êxito. Com exceção dos meses afetados pelo efeito paralisante da pandemia, a nova regulamentação do mercado contribuiu de modo decisivo para a criação de empregos formais.

Um bom exemplo é o ano de 2018, quando a reforma entrou em vigor: foram criadas 529.554 novas vagas formais, já descontadas as demissões, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Foi o primeiro saldo positivo em quatro anos e o melhor resultado desde 2013. De 2018 até maio passado, o saldo de novas vagas formais alcançou 4.798.117.

Em 2020 houve um baque negativo, com perda de 192.555 vagas em razão da pandemia. Naquele ano, a metodologia do Caged também ficou mais abrangente, dificultando comparações com períodos anteriores. Mesmo com o efeito da pandemia, de 2020 até maio de 2022, o saldo foi de 3.624.484 novas vagas preenchidas (277.018 só em maio). No acumulado dos primeiros cinco meses deste ano, as contratações líquidas chegaram a 1.051.503. O total de empregados com carteira assinada alcançou um recorde: 41,72 milhões.

A melhora do mercado de trabalho é confirmada pela queda no índice de desemprego medido pelo IBGE. De abril a maio, ele recuou de 10,5% para 9,8%. Foi a primeira vez que ficou em um dígito em mais de seis anos. Os 10,6 milhões de desempregados sem dúvida representam um problema social grave. A mão de obra informal também continua em nível inaceitável, acima de 40%. Mas a taxa de desemprego estrutural que os economistas avaliam como não inflacionária para um país com as características do Brasil não está muito distante da atual. E sem dúvida a reforma trabalhista contribuiu para deter a alta que a pandemia provocou na informalidade.

Um dos pontos mais controversos da reforma é a regra que transfere ao reclamante na Justiça do Trabalho — o empregado — o custo do advogado do empregador, se derrotado na causa. A intenção é reduzir os casos em que o empregado sabe não ter direito à reclamação, mas instaura o processo mesmo assim, confiando no histórico pró-trabalhador da Justiça Trabalhista. Antes da reforma, se perdesse, nada aconteceria. Agora, é obrigado a desembolsar entre 5% a 15% dos honorários dos advogados. O efeito da regra foi o previsto. Despencaram os processos. Em 2017, as varas trabalhistas receberam 2,63 milhões de novas causas. No primeiro ano de vigência das novas regras, o volume caiu para 1,73 milhão. No ano passado, foi de 1,53 milhão.

Menos processos, custo menor para as empresas e maior segurança jurídica para contratação. Pesquisadores da USP e do Insper cruzaram dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) e de processos no Tribunal Regional do Trabalho da Grande São Paulo entre 2008 e 2013. Usando técnicas para simular como se comportariam empresas e empregados sem a reforma, concluíram que o fim da litigância descabida permitiu criar 1,7 milhão de novos empregos e reduzir o desemprego em 1,7 ponto percentual. Tal resultado não é surpresa. Um dos principais motivos para a bancarrota de pequenas e médias empresas são justamente as dívidas trabalhistas, que diminuíram com a reforma. “Os grandes beneficiários da reforma são aqueles que ganharam um emprego que não existiria sem as mudanças e as pequenas e médias empresas, que passaram a ter maior segurança jurídica para contratar”, diz o economista Raphael Corbi, da USP, um dos autores do estudo.

Duas razões impedem o emprego de crescer ainda mais. A primeira é circunstancial: a alta dos juros, necessária para conter a inflação há mais de um ano em dois dígitos e ainda perto de 12%. A contração monetária inevitavelmente afeta o crescimento da economia, no momento em que o mercado de trabalho demonstra vitalidade.

A segunda razão é estrutural. A economia brasileira é fortemente dependente de atividades de baixa produtividade, e nem sempre há mão de obra capacitada para ocupar os postos de trabalho mais valorizados. É, por isso, necessariamente alto o desemprego estrutural (em torno de 9% ou mais). Aquecer o mercado de trabalho artificialmente para derrubar a taxa abaixo desse nível aumenta a pressão inflacionária. Superar o desafio do desemprego estrutural exige investimento em produtividade e qualificação profissional. É com isso que o próximo presidente deveria se preocupar, em vez de apostar no retrocesso ou de tentar revogar uma reforma trabalhista que comprovadamente deu certo.

 

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