Folha de S. Paulo
Sinais do aperto financeiro mostram que
dificilmente a economia vai crescer em 2023
A taxa de juro básica no atacadão de
dinheiro não estava tão alta desde outubro de 2015, quando o governo de Dilma
Rousseff entrava em crise final. Havia então paniquito financeiro por
causa do déficit e da proposta de Orçamento deficitário para o ano seguinte. O
então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que entrara para fazer
"reformas" e salvar Dilma da degringolada fiscal, era dado como
morto-vivo.
A taxa real dos juros de um ano está perto
de 8,4%. Antes do início do fim de Dilma Rousseff, chegara a perto disso nos
piores meses da crise
financeira de 2008. Antes de 2006, era em geral maior.
E daí? É mais um sinal do aperto financeiro em curso: dólar caro, juros pelo mundo em alta, preço das commodities (em dólar) estáveis ou em queda, preço das ações na Bolsa caídos e desmaiados no chão etc.
Em teoria, são indícios de que dificilmente
a economia vai crescer em 2023. Vai diminuir o PIB per capita (por cabeça, PIB
dividido pelo tamanho da população): empobrecimento, na média.
Mesmo com esse aperto ruim das condições
financeiras, a inflação
ainda não dá sinal de baixa duradoura. O IPCA deve vir abaixo de zero em
julho e baixo em agosto por causa das reduções de impostos sobre combustíveis e
energia. Afora isso, resultado de intervenções pontuais do governo, a inflação
ainda é disseminada e tem outros sinais de infecção resistente.
Por ora, a baixa do preço em dólares de
várias commodities não refresca a situação, com exceção do caso de minérios
(ferro, cobre). Como deve ser fácil perceber, a alta do dólar impede a baixa de preços
de comida, petróleo e derivados.
O medo ou primeiros sinais da recessão nas
economias ricas abatem o preço das commodities. É possível que caiam ainda
mais. Não vai adiantar muito se o dólar continuar passeando pela casa dos R$
5,40. Para piorar, a queda do preço desses materiais básicos, que exportamos
aos montes, vai tirar renda das empresas do setor e agregados. A economia do
agronegócio e exportações eram um dos motivos desse crescimentozinho de 2022.
As taxas de juros de prazo mais longo
também estão salgadas, o que vem desde o trimestre final do ano passado. Parte
do sal veio da gambiarra
com o teto de gastos, obra de Jair Bolsonaro e seus regentes do centrão,
ampliada agora com o puxadinho ou puxadão da PEC dos Bilhões, a desmoralização
final do teto e das leis fiscais brasileiras. A inflação
é mundial, certo, mas o balde de chantili e os morangos mofados sobre esse
bolo ruim foram obra de Bolsonaro e do poderoso centrão.
O estelionato eleitoral mais recente, além
de lançar vergonha, derrisão e descrédito sobre a política econômica
brasileira, cria problemas materiais óbvios. No final de 2022, vai ter inflação
represada (por causa de queda temporária de impostos), um Auxílio Brasil que terá
passado a custar R$ 120 bilhões por ano (antes do estelionato, custava R$ 90
bilhões), servidores públicos à espera de aumento e o país quase inteiro a
esperar uma solução mágica para pobreza, baixo crescimento e para a ruína
deixada por Bolsonaro.
A taxa de juros de que se trata aqui é a
taxa do DI para negócios de um ano, descontada a inflação para os próximos 12
meses (ex ante). É uma espécie de piso dos juros no mercado financeiro e de
crédito. A gente não sabe bem como andam as taxas nos bancos, porque os últimos
dados disponíveis são de fevereiro, atraso devido à greve no Banco Central.
É possível fazer um remendo nesses panos
podres. O novo governo teria de propor mudanças amplas e rápidas, em uma
tentativa de acordo nacional —ou quase isso, pois pelo
menos um terço do país é adepto da destruição. Ainda não está à vista.
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