O Estado de S. Paulo
Ao contrário do discurso oficial, o mercado vê um quadro fiscal cada vez pior
O dia de ontem foi de comemoração no
governo e no Congresso com a aprovação da PEC Kamikaze, que garantirá R$ 41,2
bilhões para turbinar os programas sociais já existentes e criar novos
benefícios sociais nos próximos cinco meses.
Com a emenda constitucional e o estado de
emergência incluído no texto, a confiança da ala política do governo é gigante
de que não há risco nenhum de impugnação da campanha do presidente Jair
Bolsonaro por abuso de poder político e econômico mediante ação de investigação
judicial eleitoral.
O amplo apoio dos deputados e senadores, entre eles os da oposição, só tem reforçado essa confiança inabalável. Até o momento, esse fantasma não ronda as preocupações da campanha do presidente.
O governo vê pela frente um crescimento
maior, de 2% do PIB este ano, com dinheiro nas ruas para aumento na veia do
consumo. E, para afastar o risco fiscal, que aumentou muito com a PEC, o
Ministério da Economia tenta mostrar que o gasto será temporário, sem prejuízo
para a tendência de melhora das contas públicas.
Trunfo a ser explorado é que Bolsonaro vai
entregar no fim do seu governo uma situação fiscal melhor do que encontrou.
Esse será o mote do discurso governista a partir de hoje, dia seguinte da
votação final da PEC.
Só que, entre os investidores do mercado
financeiro, a visão não é nem um pouquinho essa. Os investidores estão vendo o
quadro piorando e nem mesmo com taxas de juros reais (descontada a inflação)
altamente atrativas pagas pelo governo, acima de 6%, querem botar o dinheiro na
compra dos papéis.
As curvas de juros só subiram desde que
começaram os debates da PEC. Os investidores perdem muito a cada elevação,
porque seus ativos têm de ser precificados diariamente.
Estão todos arredios. Não compram nem com
as taxas nas alturas, com medo de os juros subirem novamente. É um fenômeno
muito preocupante.
Chamou atenção relatório assinado pelo economista-chefe do BTG, Mansueto Almeida. Ex-secretário do Tesouro saído da equipe de Paulo Guedes e que tradicionalmente tem uma visão mais positiva das contas públicas, Mansueto agora alerta que o debate fiscal no País está avançando na direção contrária da necessidade de que as políticas adotadas sejam transitórias e focalizadas, com limites e cláusulas de saída bem desenhadas e acompanhadas de medidas de compensação, para reduzir consequências indesejáveis para a atividade econômica e a inflação. As medidas recentemente aprovadas contemplam uma série de políticas pouco focalizadas, malcalibradas e com impacto permanente.
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