Valor Econômico
Força do governo no Congresso depende da
PEC da Transição
Com a mesma certeza que os brasileiros têm
de que a nossa seleção ganhará a Copa, a ponto de até torcer pela lesão de seu
melhor jogador, o PT saiu do segundo turno da eleição acreditando que o torneio
já estava ganho e que a vitória sobre Jair Bolsonaro (PL) deu aval para o
partido impor seu plano de governo sem negociar com as demais forças políticas
do país.
Os articuladores da transição passaram a dizer que os gastos seriam ampliados em R$ 200 bilhões de forma indefinida e já decidir em reuniões fechadas como esse dinheiro todo seria usado: aumentar as verbas para saúde e educação, investir em moradia popular e estradas, retomar os incentivos à cultura. Pleitos justos e necessários, mas a forma ignorou que parte expressiva dos eleitores não concorda com os planos econômicos do PT, só queria ver o Jair ir embora. O Congresso tratou de botar a PEC embaixo do braço, colocar no meio do campo e mostrar que a partida não tinha sequer começado.
Mandaram recados de qual será o limite da
relação. Os presidentes da Câmara e do Senado devem ser reeleitos, nenhum deles
totalmente alinhado a Lula. O orçamento secreto não vai acabar e a pretensão de
retomá-lo para o Executivo já virou tentativa (postergada) de negociar os
critérios para dividir o dinheiro. A PEC da Transição também não sairá com o
prazo nem o valor desejados pelos petistas. Na prática, o atual Congresso impõe
ao PT a necessidade de apresentar regra fiscal crível se quiser gastar mais até
2026.
O “bolão” dos ministérios entretém as rodas
de fofoca de Brasília e ocupa o noticiário, mas a força do futuro governo no
Congresso está mais ligada ao tamanho da expansão fiscal negociada nos próximos
15 dias do que pelos ministérios que cada partido terá. O RP9, orçamento
secreto ou emenda de relator, chame como quiser, transferiu para o Legislativo
o poder antes nas mãos dos ministros. Serão R$ 34 bilhões entre emendas
individuais e de bancada, ambas impositivas, e de relator. Os investimentos
projetados sem a PEC são de apenas R$ 22 bilhões em 2023.
Há quem aposte, dentre os petistas, que é
possível negociar uma lista de obras e programas “estruturantes” para dar mais
foco ao orçamento secreto. Outros acham que o Executivo poderá retomar o poder
ao se negar a empenhar as verbas de quem não votar com o governo. A expectativa
nos corredores da Câmara, contudo, é outra: “o RP9 é do Lira e ninguém mexe” e
a ala política do Supremo Tribunal Federal (STF) se encarregará de garantir
isso.
Expectativas à parte, o fato é que a
capacidade política de um ministro indicado por um partido só existirá se ele
tiver dinheiro para obras nas bases eleitorais de quem o sustenta - deputados e
senadores. Isso só existirá se a PEC for aprovada com folga grande para gastos
não obrigatórios. Do contrário, será apenas um posto de prestígio para quem o
ocupa e duas dúzias de cargos para acomodar um ou outro aliado.
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Arthur Lira (PP-AL) é tão favorito que
emparedou o PT. O partido terá que aceitar que o PL presidirá a comissão mais
importante da Câmara, a de Constituição e Justiça (CCJ), e terá papel de
destaque na formulação do Orçamento. Os petistas prometeram apoiá-lo e ainda
tentam negociar um “bloco alternativo”, só com a base do governo, para excluir o
partido de Bolsonaro dessa divisão, mas Lira já mandou avisar que honrará os
acordos prévios e não aceitará. O que pode ser negociado, alertou, é um
revezamento entre PT, PL e União Brasil e que o presidente da comissão seja
“pragmático”.
Óbvio que o orçamento secreto foi
fundamental, mas o presidente da Câmara tem habilidade pouco percebida fora do
Congresso: sabe até onde e o que pode pedir a cada um de seus colegas. Não
cobrou dos paulistas ligados a empresários que votassem a favor da tributação
de dividendos e não pediu à esquerda que consentisse com a privatização dos
Correios ou da Eletrobras.
Foi buscar esses votos em outros campos. Orgulha-se de lembrar o nome de todos
os 513 deputados, assim como sabe de cabeça quem está em busca só de recursos
para suas bases e para quem uma relatoria de um projeto é mais importante do
que emendas.
A vitória esmagadora que se desenha
suscitará, de pronto, o debate sobre mudar a Constituição para permitir a
reeleição dos presidentes das duas Casas do Congresso em meio de mandato (hoje
só é possível de uma legislatura para outra). Não vai faltar quem se disponha
a, já no dia 2 de fevereiro, protocolar essa PEC. Aliados rejeitam a ideia e
dizem que desestabilizaria sua base de apoio porque Republicanos e União
esperam sucedê-lo em 2025. Há os que o projetem até como ministro de Lula. A
ver.
Em campanha à reeleição, Lira promete aos
colegas que será independente. Não votará tudo que o PT quer, mas não
trabalhará contra. Aos que o apontam de novo como primeiro-ministro, admite que
teve papel fundamental no governo Bolsonaro, como na derrubada na marra do
preço da gasolina, mas atribui à falta de coordenação e inciativa do
presidente, e diz esperar que com Lula as coisas sejam diferentes, que cheguem
mais “amarradas e negociadas” ao Parlamento. Sua função seria, na sua visão, a
de presidente da Câmara: mediar os conflitos e, na falta de consenso, pautar.
Quem tiver mais votos leva.
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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), também caminha para uma tranquila reeleição, embora não tão certa. O
PL lançará Rogério Marinho (RN), mas parece mais a busca por uma composição
melhor no Senado (onde, ao contrário da Câmara, ser a maior bancada não
garantirá à sigla a CCJ).
Não custa lembrar, Pacheco não apoiou Lula na eleição. Seu partido foi o palanque do petista em Minas Gerais e o PT cedeu a vaga ao Senado para Alexandre Silveira, seu amigo de longa data. Ele preferiu ficar neutro para se manter no jogo se Bolsonaro vencesse e sequer votou no segundo turno. Não nutre mais expectativa de uma candidatura presidencial como nos tempos mais aguerridos de independência à frente do Senado, mas é preciso acompanhar de perto as composições em Minas para entender qual será o jogo dele nos próximos dois anos.
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