Folha de S. Paulo
Congresso aceita o grosso do que o PT
queria, leva o seu e ignora problema
De início, o governo eleito queria que
a "PEC
da Transição" autorizasse gastos adicionais de R$ 175 bilhões em
relação ao projeto de Orçamento de 2023. Em dado momento, apareceu a ideia de
permitir ainda despesas extras de R$ 23 bilhões, para investimentos, a depender
do desempenho da arrecadação. O pacote seria então de R$ 198 bilhões; Luiz Inácio Lula da
Silva chegou a dizer que seus valores não eram finais, mas não
começaria uma negociação chutando baixo.
Por ora, juntando as tais possíveis
despesas em investimento, deve-se
aprovar um pacote de R$ 169 bilhões. É quase o valor inicial proposto pelo
governo de transição. É o dobro do valor máximo estimado para que se evite um
crescimento preocupante da dívida pública. Afora milagres.
Lula ganhou o jogo ou, digamos, nestes dias de Copa, que conseguiu a classificação com folga, mesmo cedendo um empate para o centrão, que também vai para a próxima fase. Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) estão eleitos para comandar Câmara e Senado nos próximos dois anos.
Lira disse a Lula que só haveria PEC se
houvesse um acerto qualquer para manter ou compensar as emendas de relator, o
dito "orçamento secreto", tanto faz que o Supremo derrube a atual
aberração. Por ora, Lula arrumou maioria parlamentar para aprovar até emendas
constitucionais, mas sujeito à boa vontade dos barões da emendinha, de Lira e
companhia.
É preciso ver o formato final disso tudo,
em detalhes, para saber dos arranjos que serão feitos com o centrão, dos
pagamentos devidos pela incompetência atroz do governo de trevas (2019-2022) e
outras mumunhas que aparecem em alíneas, incisos e parágrafos.
Dizia-se que o Congresso colocaria um
limite nas pretensões de Lula 3. Pela mera aritmética, colocou. Mas R$ 30
bilhões a menos vão fazer apenas coceira nas projeções de aumento da dívida
pública.
Não sabemos o que vai ser da arrecadação
federal de 2023 (provavelmente maior do que a estimativa pessimista de agora)
nem de PIB ou juros, sem o que fica difícil estimar o aumento da dívida
pública. Mesmo na melhor das hipóteses, fica também difícil ver como não
aumentar a carga tributária ou vender patrimônio a fim de evitar endividamento
ainda mais daninho. Difícil acreditar em aumento de imposto e privatização
Sim, o Congresso deve limitar a dita
"licença para gastar" (despesa além do teto) por dois anos, o que
pode ser irrelevante por pelo menos dois motivos. Se houver regra fiscal que de
fato contenha o crescimento sem limite da dívida, a autorização de despesa
adicional da PEC pode não valer. Se não houver regra fiscal que funcione, vamos
correr riscos muito sérios, tanto faz a duração da "licença".
Há ainda quem diga que se enfiou lá na PEC
um artigo obrigando Lula a enviar ao Congresso, até 31 de agosto de 2023, lei
"com objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a
estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao
crescimento socioeconômico". Isto é, uma nova regra de limitação de
déficit e dívida.
Primeiro, dada essa redação, esse projeto
pode ser qualquer coisa e nada. Segundo, se o presidente não enviar a tal lei,
acontece o quê? Se o Congresso quiser, pode inventar um modo de pressionar
Lula, a depender da força política e popular do governo. Mas esse artigo é para
inglês ver.
Lula leva o seu pacote. Lira leva a
reeleição e um esquema qualquer para que seu grupo mantenha o poder de decidir
o que fazer de parte gorda do Orçamento que não tem destino obrigatório (cerca
de 95%).
O problema fiscal foi levado para debaixo
do tapete.
2 comentários:
E você?
Levou ou não levou o seu?
Vinicius Torres Freire.
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