sábado, 8 de outubro de 2022

Cristina Serra - Lula, Bolsonaro e o populismo

Folha de S. Paulo

Obra de Thomás Zicman de Barros e Miguel Lago contextualiza categoria política

Está na praça um livro precioso para a discussão de uma categoria política que tem se prestado a muita confusão e distorção: o populismo. A obra é "Do que falamos quando falamos de populismo" (Companhia das Letras), dos cientistas políticos Thomás Zicman de Barros e Miguel Lago.

O livro analisa os contextos em que o termo surgiu no mundo e no Brasil e as mudanças de sentido adquiridas ao sabor de circunstâncias e conveniências (da política, da academia e do jornalismo). Mais importante ainda é o enquadramento contemporâneo do tema, em meio à disputa eleitoral Lula x Bolsonaro. É provocação intelectual das boas.

Muito usado com intenção pejorativa, o populismo foi motivo de orgulho para seus criadores, um movimento político russo, da segunda metade do século 19, que se opunha à tirania tzarista.

No Brasil, quem primeiro reivindicou o uso da expressão foi a direita reacionária, representada pelos integralistas de Plínio Salgado, no pós-guerra. No século 20, o populismo serviu para designar líderes tão destoantes quanto Vargas, JK, Jânio, Jango e Adhemar de Barros.

Dou um salto para chegar aos dias de hoje. Os autores argumentam que existem vários populismos (à direita e à esquerda) e que nem todas as suas formas ameaçam os fundamentos da democracia liberal.

Defendem a tese de que o populismo pode ser, inclusive, "uma forma de mobilização emancipadora", a partir da incorporação de direitos para enormes contingentes populacionais.

O livro considera falsa qualquer simetria entre os populismos contidos nos projetos lulista e bolsonarista, sobretudo a partir do que oferecem como resposta a conflitos e à vulnerabilidade de grupos sociais subalternos, diante de um mundo onde as certezas sobre o futuro se evaporaram.

Os autores também discutem a estética e a teatralidade do lulismo e do bolsonarismo, ampliando, com clareza solar, a compreensão das diferenças abissais entre os dois campos políticos, postos diante do eleitor.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

A diferença é abissal mesmo.