Folha de S. Paulo
Posse foi festa que democracia merecia após
quatro anos em cativeiro
O golpe perdeu, o Olavo morreu, o Jair
fugiu, e o Brasil voltou a ter um presidente digno de cantar o hino
nacional brasileiro.
Cantou-o com entusiasmo, como cantou a
multidão que foi a Brasília assistir à terceira
posse presidencial de Lula. Foi uma festa bonita, a começar porque o Jair
não foi. Em seu lugar, uma comitiva entregou a faixa presidencial a Lula. Foi,
sem dúvida, o momento mais bonito da posse. A comitiva representava um país que
é, ao mesmo tempo, diverso, culturalmente rico e melhor do que Jair
Bolsonaro no desempenho de absolutamente qualquer tarefa.
Resta torcer, enfim, para que o desastre Jair Bolsonaro vacine o povo brasileiro contra novas experiências autoritárias. Afinal, não é possível que este palhaço não seja capaz de vacinar ninguém contra nada.
Em seu discurso de posse, Lula deixou claro
que não haveria anistia: isto é, prometeu que as instituições não serão
fraudadas para impedir que Jair Bolsonaro e seus cúmplices sejam
responsabilizados por seus crimes.
Mas deixou claro que serão processados nos
termos da lei, com amplo direito de defesa, sem Sergio Moro fazendo mutreta,
sem perseguição. É assim que tem que ser.
Nos dois discursos da posse, houve uma
tentativa de equilibrar o discurso "frente ampla" com a homenagem a
quem esteve com Lula nas horas mais difíceis.
O "democracia
para sempre!" que encerrou o discurso no Congresso honrou as
promessas de uma frente ampla pela democracia, que também foram contempladas na
formação do ministério. Lula lembrou de seu passado como deputado constituinte
e fez homenagens à Constituição de 1988.
Em outros tempos, um discurso de posse
elogiando a Constituição seria entediante. Afinal, quem era contra a
Constituição? Depois de quatro anos governados por um sujeito que preferia
Ustra a Ulysses, o que deveria ser uma obviedade tornou-se uma corajosa tomada
de posição. Emocionou, porque tinha mesmo que emocionar.
O discurso no parlatório teve mais acenos à
esquerda. Lula xingou o teto de gastos, o que é meio fácil: o teto já morreu
durante o governo Bolsonaro. Disse, entretanto, que seu governo não faria
"gastança", abrindo caminho para a negociação de uma nova regra
fiscal pelo ministro Fernando
Haddad.
No
parlatório, Lula chamou o impeachment de 2016 de golpe, chamou a política
de Bolsonaro durante a pandemia de genocida e entregou o que o público, vindo de
todos os cantos do Brasil, esperava ouvir. O "boa tarde, povo
brasileiro", homenagem ao "bom dia, presidente Lula" que a
vigília de Curitiba lhe dizia todos os dias durante a prisão, foi bonito.
Em 2018, eu achava que a vigília de
Curitiba era um negócio quixotesco e até meio melancólico. Diante dos
acontecimentos posteriores, só me resta reconhecer que eles mereceram mesmo
serem homenageados no discurso da posse.
Ainda não sabemos se, no governo, Lula
saberá equilibrar, como fez nos discursos da posse, as políticas que a frente
ampla pede e o que Lula prometeu a seus apoiadores mais fiéis. O combate à
miséria, principal tema dos discursos da posse, pode ser um programa unificador
para uma "frente ampla contra a desigualdade".
Independentemente disso tudo, foi uma festa
bonita, que a bandeira, o hino, a Constituição e a democracia brasileira
mereciam depois de quatro anos mantidos em cativeiro.
3 comentários:
Ótimo artigo! Parabéns!
Sim, excelente artigo!
É uma delícia ler e reler o que a gente viu e ouviu...
Povo e Lula lá.
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