segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Vera Magalhães - Um chamado à responsabilidade

O Globo

Principal mensagem de uma posse memorável foi o clamor pela frente contra a desigualdade

Foi uma posse memorável, a terceira de Luiz Inácio Lula da Silva no cargo de presidente do Brasil. Dos discursos à subida da rampa e passagem da faixa a cargo de representantes diversos do povo brasileiro, foram muitos os símbolos de resgate da democracia e da cidadania e de afirmação do pluralismo e da representatividade.

Mas a principal mensagem veio no final do segundo discurso de Lula, quando ele convocou a sociedade brasileira a formar uma Frente Ampla contra a Desigualdade. Esta exortação é tão importante quanto difícil de executar, porque, para que vá além da retórica, demandará ações por parte do governo que enfrentem lobbies poderosos, num momento em que a maior parte daqueles que precisam abrir mão de privilégios não está no grupo de apoio ao novo presidente.

Para reduzir o fosso social que separa quem está na fila de ossos nos açougues dos que aguardam o próprio jatinho são necessárias mudanças estruturais, como o fim de subvenções e uma reforma tributária que taxe os mais ricos, para ficar em duas medidas apenas, e ambas de dificílima aprovação.

A composição do governo, diversa em gênero, raça e pensamento, já aponta para uma disposição verdadeira do presidente de combater esse status quo de desigualdade. É preciso que esses ministros demonstrem ter capacidade de elaboração e efetivação de políticas públicas e de negociação com o Congresso e esta sociedade que Lula chamou à participação.

E tudo isso, para avançar, dependerá, como sempre, de confiança na condução da economia. Foi graças aos bons resultados econômicos que Lula conseguiu, no seu ciclo anterior, atrair grandes nomes do empresariado para o Conselhão — que de concreto produziu quase nada, mas pode ser um embrião da frente ampla que ele conclama agora.

A posse teve outro ponto positivo: ao fugir do país de maneira canhestra e propiciar essa posse impecável, Bolsonaro queimou boa parte do capital político para promover o caos e manter a radicalização de seus apoiadores.

Se tiver sabedoria para costurar o distensionamento da sociedade enquanto descortina o legado nefasto de quatro anos de desmonte institucional e civilizatório de Bolsonaro, Lula poderá construir a governabilidade necessária a realizar o projeto ambicioso que enunciou em sua fala no parlatório.

Precisará, para isso, de um convívio harmonioso com os demais Poderes e o apoio de uma gama ampla de partidos. Os sorrisos aliviados no rosto até de figuras improváveis como Arthur Lira nas solenidades de ontem mostram que não se trata de nada impossível. Ainda mais para quem está tendo a chance inédita de uma terceira encarnação.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Lula foi o primeiro a ganhar de um incumbente.