segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Maria Cristina Fernandes - Exército poderia ter evitado a invasão

Valor Econômico

Ameaça à segurança nacional ultrapassou os limites da praça dos Três Poderes

A intervenção decretada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Distrito Federal agilizará as prisões dos terroristas que invadiram os palácios do poder nesse domingo, as responsabilidades pela invasão e seu financiamento, mas não atinge a letargia da reação do Exército.

A Força tem dois batalhões que se revezam no subsolo do Palácio do Planalto, o Regimento de Cavalaria de Guarda e o Batalhão da Guarda Presidencial. As duas Forças respondem ao Comando Militar do Planalto e têm, como sua função primeira, a proteção do palácio presidencial.

Se a Polícia Militar deixou passar os 170 ônibus que chegaram ao Distrito Federal com os invasores, o Exército não poderia ter falhado em impedir que eles chegassem ao gabinete presidencial e depredassem o Palácio do Planalto. Faltou comando para movê-los no cumprimento de suas funções. Os invasores já dominavam o palácio presidencial quando as forças do Comando Militar do Planalto resolveram reagir. A atuação desta tropa independe de decretação de operação de Garantia da Lei e da Ordem.

Apesar de ter acontecido num domingo, quando os palácios estavam desocupados, foi a extensão do ataque à sede do Executivo e ao Supremo Tribunal Federal que diferencia os eventos deste domingo daqueles que alvejaram o Capitólio, sede do Congresso americano em 6 de janeiro de 2020, às vésperas da posse do presidente americano Joe Biden.

O comportamento da Polícia Militar custou a intervenção na área de segurança do Distrito Federal. O governador Ibaneis Rocha não apenas deixou de agir para evitar a invasão como evidenciou o complô que já havia ficado claro com o convite para que o ex-ministro da Justiça Anderson Torres assumisse a secretaria de Segurança do Distrito Federal, a despeito de sua adesão ao golpismo bolsonarista no Ministério da Justiça.

A desautorização de Ibaneis e o pedido de prisão de Torres aumentam os poderes do atual ministro da Justiça, Flávio Dino. O interventor, Ricardo Garcia Capelli, secretário-executivo do MJ e ex-secretário de Comunicação do governo do Maranhão, é uma extensão de Dino.

Se todas essas ações demonstram a ofensiva sobre o governo do Distrito Federal, ainda que por um prazo de apenas 23 dias, já que a intervenção vai apenas até o dia 31, restam por ser esclarecidas as atitudes a serem tomadas em relação à atuação do Exército.

A omissão da Polícia Militar do Distrito Federal pode ser resolvida com a intervenção do Distrito Federal, que foi decretada pelo presidente da República e terá que ser aprovada pelo Congresso Nacional, já convocado pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco. O senador do PSD de Minas volta ao Brasil nesta segunda-feira para este fim.

Já a omissão do Exército depende da ação do comandante da Força e do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. Esta omissão já vinha patente desde as manifestações em frente aos quartéis.

Se o ministro da Justiça, Flávio Dino, precipitou-se em elogiar o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, pela segurança da posse, quando Anderson Torres já havia sido escolhido para a Segurança, o ministro José Múcio também errou na complacência com as manifestações em frente aos quartéis, sobre as quais chegou a dizer que tinham a participação de seus familiares e eram marcadas pelo caráter democrático.

A ameaça à segurança nacional não se limitou à invasão dos Três Poderes. Avançou para parar, literalmente, o país com a tentativa de invasão da Refinaria de Canoas, no Rio Grande do Sul. O Gabinete de Segurança Institucional detectou a tentativa de invasão não apenas desta refinaria mas também das refinarias Presidente Vargas, em Araucária (PR), e a Refinaria Duque de Caxias, no município homônimo, no Rio de Janeiro.

A contenção da investida terrorista é dificultada pela presença de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro em setores da inteligência da estatal. A reação da estatal também é dificultada pelo controle do atual Conselho de Administração por Bolsonaro.

Se o Brasil viveu nesse domingo seu “Capitólio” isso apenas se saberá se o país proceder à apuração de responsabilidades e à responsabilização dos envolvidos. Mais de 700 pessoas já foram presas nos Estados Unidos acusadas de envolvimento nos atos de 6 de janeiro de 2020, muito embora ainda se aguarde a acusação criminal contra o ex-presidente Donald Trump.

Se está em curso, desde o segundo turno das eleições, uma operação para dar um salvo-conduto a Bolsonaro, as invasões deste 8 de janeiro o tornam mais improvável. A firme condenação do presidente Joe Biden às invasões também dificulta a manutenção do quartel-general do golpismo na Flórida.

O isolamento de Bolsonaro também aumentou internamente. Das três principais lideranças que apoiaram sua reeleição, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o ex-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, apenas este último não veio a público para condenar os ataques.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Análise correta da colunista.