Folha de S. Paulo
Houve falha de setores, e apurar
responsabilidades deve ser primeira tarefa
A ação violenta dos manifestantes
bolsonaristas contra os Poderes constitucionais, com a conivência dos setores
de segurança do Distrito Federal, configura crime de tentativa "abolição
do Estado democrático de Direito", conforme disposto pelo artigo 359-L do
Código Penal.
As autoridades constituídas não mais podem transigir com inimigos da democracia. Sem uma ação contundente que apure a responsabilidade, não apenas dos vândalos que invadiram e depredaram a sede dos Poderes da República, mas também aqueles que vêm vandalizando as nossas instituições democráticas nos últimos anos, a democracia perecerá.
De imediato, o presidente decretou
intervenção federal, conforme disposto no artigo 39, III, da Constituição Federal,
que deverá ser apreciada imediatamente pelo Congresso Nacional. O decreto lido
pelo presidente da República restringe a intervenção à esfera de segurança
pública.
Caso tivesse optado pela decretação do
Estado de Defesa, poderia haver restrição aos direitos de "reunião",
assim como quebrado o sigilo de "correspondência" e "comunicação
telegráfica e telefônica".
Restabelecida a ordem, a primeira tarefa
será apurar responsabilidades. Os que invadiram e depredaram prédios devem ser
presos em flagrante imediatamente. Aqueles que financiaram e organizaram essas
caravanas golpistas também devem ser presos temporariamente, para que não
persistam esses atos contrários ao regime democrático e para que as provas
possam ser coletadas.
As responsabilidades do governador do
Distrito Federal, do seu secretário da Segurança e de outras autoridades também
devem ser imediatamente apuradas. O afastamento dessas autoridades, por prática
de crime de responsabilidade, é um imperativo para que a ordem pública, não
apenas seja restaurada, mas para que possa ser mantida no futuro imediato. Não
se deve negligenciar ainda, a apuração daqueles que têm incitado animosidade
das Forças Armadas contra os Poderes constitucionais, conforme disposto no
artigo 286, parágrafo único do Código Penal.
O novo governo, por fim, deverá tomar
medidas urgentes para reorganizar os setores de inteligência e de segurança do
Estado brasileiro. Essa insurgência estava prevista. Vinha sendo anunciada há
vários dias. Houve falha desses setores, ao não prevenirem esses ataques à
democracia. Se não se colocar em marcha uma profunda reforma desses setores,
assim como uma revisão da legislação e dos mecanismos institucionais de defesa
do Estado democrático de Direito, nosso regime constitucional continuará sob a
grave ameaça dos inimigos de nossa democracia.
*Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP.
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