O Globo
Semana termina com indicadores que deixam o
Banco Central em posição menos confortável para começar a reduzir a taxa Selic
Para quem aposta em uma indicação de corte de juros pelo Banco Central na reunião do Copom da próxima quarta-feira, a semana termina em clima de cautela: o rombo nas contas públicas foi muito maior do que o previsto em março, e a inflação de serviços em abril, medida pelo IPCA-15, continuou estável em patamar elevado. Até mesmo as boas notícias do IBC-Br e da geração de empregos formais significam problemas quando o assunto é inflação. A demanda está mais forte do que se imaginava, e tudo isso deixa o BC em posição desconfortável para começar a reduzir a Selic mais rapidamente, como todos desejam.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem
razão quando diz que os gastos do Tesouro com juros inviabilizam a melhora da
dívida pública. Ontem mesmo o Banco Central divulgou a sua Nota de Política
Fiscal, mostrando que as despesas com juros chegaram a R$ 693 bilhões nos
últimos 12 meses até março, o que corresponde a 6,85% do PIB, como mostra o
gráfico. Em um ano, essa conta cresceu R$ 290 bilhões. O governo central teve
superávit primário de R$ 74,8 bilhões nesse período, mas o resultado nominal,
que inclui os juros, foi um déficit de R$ 618 bilhões.
O problema, como explicou o economista
Marcos Lisboa durante audiência pública no Senado na última quinta-feira, é que
a Selic elevada não é a causa dos nossos desequilíbrios, mas a sua
consequência. As dúvidas estão na política fiscal, e por isso a equipe
econômica terá muito trabalho para provar que o arcabouço de fato irá entregar
os resultados que promete. Economistas de peso, como o ex-presidente do Banco
Central Arminio Fraga — e que não têm ligação com o desastroso governo Jair
Bolsonaro — têm feito alertas sobre os riscos da nova regra.
O reequilíbrio fiscal pela ótica da arrecadação
não é o ideal, mas se justifica pelas perdas nas receitas provocadas durante o
governo anterior e pelos problemas sociais que o país enfrenta em várias áreas,
que dificultam o corte de gastos. Mas propor uma meta de inflação mais alta
como forma de baixar juros, acusar o Banco Central de usar a Selic para sabotar
o governo, enviar projeto de lei com retrocessos na lei do saneamento e tentar
afrouxar a Lei das Estatais são medidas que não dão margem para defesa.
Se as ameaças à democracia foram contidas
neste início de governo, elas podem voltar a ganhar tração em um cenário de
crise econômica, como alertou Arminio. Por isso, a equipe econômica, o PT e,
principalmente, o presidente Lula não têm muito espaço para errar. É preciso
focar nas medidas corretas, sem invencionices, ajustar a comunicação e criar as
condições para que BC reduza os juros de forma técnica.
Preocupação com a meta
O economista-chefe do G5 Partners, Luis Otávio
Leal, especialista em inflação, acredita que ficou mais difícil para o Banco
Central indicar um corte de juros na reunião de quarta-feira. Ele diz que há um
ponto vermelho marcado no calendário e que gera preocupações na autoridade
monetária: a reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) de junho, que pode
fazer alterações nas metas de inflação.
— Antes, eu achava que esse evento do CMN
não era decisivo, mas agora eu acho. E pode ter mudanças boas ou ruins. Acabar
com o ano-calendário seria um avanço. Mas mudar a meta em si, neste momento,
acho que seria casuístico. Se for para fazer isso, melhor que seja no ano que
vem, com os juros já em queda — pontuou.
Esta semana, Roberto Campos Neto voltou a
dizer que o aumento da meta não trará os ganhos esperados por alguns
integrantes do governo. O resultado será uma piora imediata das expectativas, o
que obrigará o BC a manter os juros mais altos por mais tempo. Ou seja, tudo o
que ninguém quer. O CMN reúne o ministro da Fazenda, Fernando Haddad; a
ministra do Planejamento, Simone Tebet; e o próprio Campos Neto. A união dos
dois ministros poderia deixar o BC isolado nessa votação.
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