Valor Econômico
Estatal não esteve sob controle de
Bolsonaro e não está sob o de Lula
O PT já tem o seu espaço reservado na
Codevasf. Receberá em breve duas sesmarias, as superintendências de Recife e de
Belo Horizonte, criadas em mais uma rodada de ampliação da estatal. Ninguém
será desalojado para acomodá-los na autarquia, que ainda há de cumprir seu
ideal, parafraseando o “Fado Tropical”, de Chico Buarque.
A Codevasf nasceu atendendo 800 municípios
no Vale do São Francisco, mas já está presente em 2.685 cidades, ou 48,2% do
total brasileiro. Cresce a cada governo. E daí vai para mais: segundo o
presidente da estatal, o engenheiro Marcelo Moreira, está nas mãos do Congresso
deliberar se a companhia de desenvolvimento chegará ao Distrito Federal,
Amazonas, Rondônia e Roraima.
Moreira trabalhou na Odebrecht por muitos
anos e foi indicado pelo deputado Elmar Nascimento, líder do União Brasil,
partido que rediscute o seu espaço na Esplanada dos Ministérios. Ele preside
uma holding de interesses vários.
No arco de superintendências regionais, falta definir ainda os titulares da Paraíba e do Ceará, mas a tendência é que respondam a um condomínio das bancadas parlamentares desses Estados, englobando governo e oposição. É o modelo adotado para Montes Claros.
Lá a indicação no governo Bolsonaro era do
senador Carlos Viana (PL-MG), mas o superintendente Marco Câmara ganhou apoio
de um grupo suprapartidário. No Rio Grande do Norte há incerteza. O líder local
do União Brasil, o ex-governador José Agripino Maia (RN), bolsonarista de
última hora, quer emplacar um indicado seu, mas Moreira afirmou que a troca de
titular do feudo não é certa. O atual superintendente é descrito por ele como
um nome técnico. Em entrevista a uma rádio regional, Agripino saiu-se com essa:
“os votos que Lula precisa para governar o Brasil são só os votos do PT ou são
os votos de uma coalizão que possa incluir outros partidos a bem das causas do
Brasil? Então se é para governar, tem que fazer coalizão. Eu fui governador e
fiz isso”. O União Brasil elegeu dois deputados federais no Rio Grande do Norte.
Petrolina trocou esse ano e um condomínio
formado pelo deputado Sylvio Costa Filho (Republicanos-PE) e pelo prefeito do
Recife, João Campos (PSB), bancou a nova indicação.
De resto, Elmar controla a de Juazeiro. Em
Bom Jesus da Lapa a indicação é do deputado Arthur Maia (União Brasil-BA). A de
Teresina está com o filho do senador Marcelo de Castro (MDB-PI), relator do
Orçamento no ano passado e administrador do fim do chamado orçamento secreto. A
de Alagoas é do primo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Amapá está
com um indicado do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). A de Sergipe tem
indicação da deputada Yandra Moura (União Brasil). A de Palmas é ligada à senadora
Dorinha Seabra (União Brasil-TO). A de Goiânia, ao senador Vanderlan Cardoso
(PSD-GO), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos. A do Maranhão é ligada
ao senador Weverton Rocha (PDT-MA).
Toda essa turma cuida de botar as coisas
para funcionar. Emenda parlamentar que vai para a Codevasf vira contrato lá na
ponta. “Aqui não se devolve orçamento”, frisou Moreira. Significa o seguinte:
em 2022 foram empenhados R$ 3,7 bilhões e liquidados R$ 3,1 bilhões, sendo 84%
de execução direta da empresa. Em 2018, último ano antes de Moreira e do
orçamento secreto chegarem, eram R$ 1,5 bilhão empenhados e R$ 1,3 bilhão
executados.
A Codevasf empenha mais do que sua dotação
orçamentária anual. Nos quatro últimos anos, o governo federal remanejou para
repassar à estatal recursos já autorizados para gasto, mas parados nos
ministérios. Se não fossem para algum lugar, teriam que ser devolvidos ao
Tesouro. A estatal teve um orçamento quatrienal somado de R$ 6,784 bilhões. Os
empenhos atingiram quase o dobro: R$ 12,971 bilhões. Moreira acha que esta
toada adotada no governo Bolsonaro pode se repetir no de Lula.
E por que não? O executivo está no comando
da Codevasf desde 2019. Quando alguém é colocado em um cargo por Bolsonaro e
mantido por Lula, é um sinal de que a fonte de seu poder não está nem em um,
nem em outro. A Codevasf tornou-se o que é por ser um posto avançado do
Congresso dentro do governo. O que não significa que Moreira não busque formas
de se preservar. O que não falta na Codevasf, além de dinheiro, são denúncias.
Ele conta que um de seus primeiros
movimentos dentro do governo Lula foi procurar o ministro da
Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Carvalho. Existem dúzias de
auditorias e processos investigativos dos contratos da Codevasf tanto na CGU
quanto no Tribunal de Contas da União (TCU). Na CGU são 40 relatórios
produzidos.
Moreira disse que foi explicar ao ministro
da CGU a governança da estatal e seus mecanismos de controle. O objetivo,
segundo Moreira, era “evitar problemas futuros por conta da nossa exposição”.
Vinicius e Moreira acertaram a entrada da Codevasf como empresa piloto do
Programa de Integridade por Mentoria e Assessoramento (Prisma), um novo
mecanismo para aumento de transparência e melhoria da governança.
Está na capacidade da Codevasf atender
ecumenicamente uma das chaves da governabilidade de presidentes fracos e
dependentes do Congresso, como foi Bolsonaro e está sendo Lula. Seria adequado,
pelo menos, a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco atualizar
seu nome. Uma sugestão poderia ser Cenaep. Central Nacional de Atendimento a
Emendas Parlamentares.
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