O Globo
Censo mostra que estamos mais próximos do
fim do período em que a estrutura populacional é mais favorável ao crescimento
econômico por causa da maior proporção de pessoas em idade ativa, em relação a
crianças e idosos que não trabalham
Os primeiros dados do Censo do IBGE mostraram
que estamos mais próximos que o previsto do fim do bônus demográfico, período
em que a estrutura populacional é mais favorável ao crescimento econômico por
causa da maior proporção de pessoas em idade ativa, em relação a crianças e
idosos que não trabalham. Infelizmente, deixamos de aproveitar plenamente essa
janela.
Avanços insuficientes de oportunidades educacionais, nível insatisfatório de qualificação profissional (técnica e universitária) e, mais recentemente, uma crise quase contínua do mercado do trabalho estão entre os fatores que nos prejudicaram.
O fim do bônus, no entanto, não significa
que essa agenda perdeu relevância. Aproveitar o fim da janela desta transição,
sobretudo em um contexto de crescente diminuição de força de trabalho e aumento
da pressão sobre os sistemas de seguridade social, requer um olhar atento para
nossas juventudes, especialmente para os grupos historicamente mais
prejudicados.
Embora a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua (PNAD-C) tenha evidenciado avanços importantes na última
década, alguns desafios estão longe de ser superados. A proporção de
concluintes do ensino médio na faixa etária de 18 a 24 anos aumentou entre 2012
e 2022, com destaque para os jovens negros, que saltaram de 46% para 63%. O
indicador, no entanto, permaneceu inferior ao calculado para os jovens brancos
em 2012 (66%).
O país ainda impõe aos jovens negros,
portanto, uma década de “atraso”. O mesmo ocorreu no ensino superior. Em 2022,
34% dos jovens brancos de 18 a 24 anos estavam em cursos desta etapa, proporção
que, entre jovens negros, era de apenas 19%. Apesar de contarmos com
iniciativas essenciais, como a Lei de Cotas, os avanços foram insuficientes.
Outro dado relevante é a mudança na
escolaridade dos jovens sem-sem (sem estudar e sem trabalhar) ao término da
educação básica. Se, em 2012, 49% desse grupo específico possuíam ensino médio
completo, em 2022, essa proporção aumentou para 62%.
Isso não significa que o esforço para
aumentar a conclusão desta etapa tenha sido em vão, pois o aumento de
escolaridade traz ganhos que ultrapassam o mercado de trabalho. Mas é um sinal
importante de que, se por um lado estamos registrando ganhos no acesso à
escola, por outros, estamos falhando na transição dessa população para o
mercado de trabalho ou ensino superior.
Tal desafio fica ainda mais evidente ao
compararmos a taxa de desemprego na faixa de 18 a 24 anos (20,7%) com o grupo
de 25 a 60 anos (7,4%). O desemprego de jovens também é sensivelmente mais alto
no Brasil quando comparado com a média dos países da OCDE e de vizinhos como
Chile e Argentina, de acordo com o relatório Education at a Glance, produzido pela OCDE,
de 2022. Além de enfrentarem dificuldades de inserção ocupacional, os jovens
também se encontram em posições mais precárias da estrutura produtiva.
Esses dados reafirmam a urgência de
desenvolvermos políticas que minimizem os riscos do abandono e do atraso
escolar, sobretudo para os jovens negros e da periferia. Além disso, devemos
pavimentar caminhos para a inserção social dos jovens sem-sem. Uma forma de
fazê-lo é articular educação e trabalho através de uma agenda intersetorial de
políticas públicas, desde a oferta de creches públicas, passando por políticas
de incentivo à permanência na escola até as políticas de qualificação
profissional para as juventudes.
Não é possível falar do acesso a
oportunidades sem tratar da socialização das atividades de cuidado, da mesma
forma que não podemos ignorar os jovens que, sem experiência e qualificação
profissional, não conseguem trabalhar e desistem de procurar emprego.
Economias fechadas e marcadas por empresas
ineficientes e pouco competitivas, como a brasileira, tendem também a criar um
ambiente restritivo para os jovens. Essa situação pode limitar suas
perspectivas de empregabilidade e de desenvolvimento profissional, impactando,
em última análise, o próprio crescimento econômico de um país.
O bônus demográfico brasileiro pode estar
caminhando para o fim, mas o diagnóstico de que precisamos investir mais e
melhor nos jovens, com especial atenção aos grupos mais vulneráveis, segue
válido e urgente. Com ou sem bônus, o preço da negligência com nossas juventudes
continuará custando caro ao Brasil, em todos os sentidos.
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