O Globo
A Reforma Tributária reforça a necessidade
de estimular a busca da qualidade das gestões municipais, principalmente nas
cidades menos preparadas
Quando se discute a qualidade da política
pública, com frequência as gestões municipais não são consideradas. E são
justamente aquelas que mais sofrem com a baixa qualidade de recursos humanos —
muitas vezes o problema começa no prefeito, sendo que apenas 55% têm formação
superior completa — e a governança falha. Isso em meio à reduzida transparência
ou mesmo à omissão de tribunais de contas. Os municípios, com frequência,
gastam muito e mal.
Foi nas administrações municipais que ocorreu o maior crescimento do funcionalismo. No poder Executivo municipal, o incremento foi de 48% entre 2002 e 2021, enquanto na União houve encolhimento de 35% e nos estados, de 3,7% (dados da Rais).
E nem dá para colocar a culpa na criação de
novos municípios, que pouco se alterou no período — o movimento mais intenso
ocorreu nos anos 1990, por conta das regras constitucionais de transferência de
recursos federais.
Os legislativos municipais inchados
(aumento de 120% no número de funcionários, ante 18% no nível federal e 87% no
estadual) tampouco cumprem a função de conter excessos do Executivo. Pelo
contrário, participam da farra fiscal.
Com frequência, os municípios buscam novas
fontes de receita. Há tentativas de utilizar os recursos dos fundos de
previdência complementar dos servidores (RPPS) para outros fins — sem contar as
fraudes. Alegam ser “dinheiro parado”.
Não é dinheiro parado — são fundos
capitalizados, com metas atuariais desafiadoras — e tem dono, os servidores.
Houve inclusive casos de uso do recurso para cobrir déficits previdenciários,
de modo a reduzir aportes dos tesouros.
No momento, há um
“jabuti” incluído no (equivocado) projeto de lei que
prorroga a desoneração
da folha de 17 setores. Trata-se da redução de 20% para 8% na
contribuição previdenciária de cidades pequenas. Isso em um contexto em que o
Ministério da Fazenda busca novas fontes de receita para atender às metas
fiscais.
Uma boa notícia é a PEC 38/2023. Ela
estende aos municípios as regras da Reforma da Previdência da União, de 2019.
Afinal, apenas 32% dos municípios fizeram suas reformas, segundo a Confederação
Nacional dos Municípios (CNM). Seria um primeiro passo para reduzir os déficits
previdenciários.
É verdade que algumas decisões no nível
federal prejudicam as gestões municipais. Um importante exemplo é a política do
piso do magistério. Seu reajuste é vinculado ao comportamento da arrecadação,
mas sem levar em conta a redução do número de matrículas em um país com taxa de
natalidade decrescente.
Ainda que meritória, a regra pesa
crescentemente nos cofres das prefeituras, inclusive pelo maior gasto com
aposentados e pensionistas. E ameaça o cumprimento dos limites de despesa com
pessoal previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Tudo isso sem produzir maior qualidade do
ensino público, apesar de a remuneração superar a da rede privada, que não
conta com estabilidade de emprego.
Apesar das dificuldades impostas aos
municípios, com decisões em Brasília que não consideram suas necessidades e
restrições específicas, os governadores, bem como os tribunais de contas,
deveriam estimular o aprimoramento das gestões municipais e combater o
clientelismo.
É necessário promover ações para capacitar
as administrações e premiar, por meio de recursos e convênios, gestões
competentes, com boas práticas e boas políticas públicas.
A Reforma Tributária do IVA trará nova
dinâmica a esses entes, apontam os pesquisadores do Ipea, Sérgio Gobetti e
Priscila Monteiro. Isso porque as regras atuais ampliam bastante a desigualdade
entre municípios. Em um dos exercícios, os autores estimam como teria ficado a
distribuição de recursos em 2022 caso as novas regras já estivessem valendo.
A conclusão é que 21% das receitas
municipais (ou R$50 bilhões) seriam redistribuídas, beneficiando 82% das
cidades, onde vivem 67% da população. O resultado decorre da cobrança do
imposto no destino e não na origem, beneficiando estados mais pobres; e dos
critérios de rateio do IBS pelos estados — população (85%), partes iguais para
cada cidade (5%) e desempenho da educação, conforme lei estadual (10%).
A reforma reforça a necessidade de estimular a busca da qualidade das gestões municipais, principalmente nas cidades mais pobres e menos preparadas, para garantir o bom uso dos recursos, em benefício do cidadão.
Um comentário:
Prefeito não ter ''formação superior'' não quer dizer nada,se bem que hoje ficou fácil se formar,a pessoa que não se forma pode ser comodismo.
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