Folha de S. Paulo
A única usina elétrica da região parou de
funcionar porque Israel cortou a venda de diesel
Quase 90% da água de Gaza vem de poços. Cerca
de 3% vem de usinas de dessalinização; quase 7% é importada da empresa de água
de Israel.
Pelo menos são os últimos dados disponíveis do Serviço de Água da Palestina,
de 2021.
Na quinta-feira (5) da semana passada, a
única usina elétrica de Gaza parou de funcionar, por falta de diesel
industrial, porque Israel cortou a exportação do produto.
Sem eletricidade, não há como ligar as bombas dos poços ou dessalinizar água. Sem energia, param também de funcionar bombas de esgoto e de tratamento de água suja, conta um ex-colega de faculdade, um norueguês que trabalha na ajuda a palestinos em uma organização humanitária do país dele. O esgoto jorra para as ruas entupidas de entulho de centenas de prédios destruídos por bombas.
Cerca de 45% da necessidade de energia
elétrica de Gaza era satisfeita pela termelétrica única e pela importação de
Israel. Um resto mínimo de luz vem de geradores de hospitais, de alguns
serviços públicos e de organizações humanitárias. Falta cerca de metade da
energia necessária: neste ano, havia eletricidade por apenas 12 horas por dia,
em média.
Apenas 4% dos habitantes de Gaza têm acesso a
água livre de contaminação por Escherichia coli, uma bactéria que causa doenças
intestinais e urinárias. O número é do Serviço Central de Estatística da
Palestina e do Serviço de Água da Palestina.
Em tempos menos anormais de 2021, havia 82,7
litros de água por dia por pessoa em Gaza, para uso doméstico _a necessidade
mínima, segundo agências da ONU, seria de 50 a 110 litros, a depender da
região. No Brasil, o consumo era de 171 litros por pessoa, por dia, no Sudeste,
segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento;
no Nordeste, 120 litros. Os números são de 2020.
Desde domingo passado, também não entram
comida, remédios e outras necessidades mínimas da vida em Gaza. Israel sitia e
bombardeia a tripa de terra. O Egito em geral coopera com o bloqueio e detesta
o Hamas.
No entanto, no sábado de manhã havia rumores de que o país negociaria um acordo
com Israel e EUA. Em troca de receber estrangeiros que tentam fugir de Gaza, o
Egito quer passe livre para levar alguma ajuda para os palestinos presos no
"buraco do inferno", para usar as palavras da agência da ONU dedicada
ajudar os palestinos.
O Egito não quer receber refugiados por não
ter meios de cuidar deles, por receio de importar gente do Hamas e porque, como
dizem tantos países árabes e mesmo palestinos, o êxodo acabaria por entregar
território a Israel, como em 1948.
Esse cenário dá o que pensar não apenas sobre
o horror de agora, mas sobre o que será depois da invasão israelense, se houver
amanhã.
Suponha-se que Israel aniquile o Hamas, uma
frase que nem tem sentido claro. O que ficará no lugar da ditadura islâmica da
milícia do horror? Não que o Hamas administre grande coisa, se alguma, mas terá
de haver um interregno e, depois, um governo —alguém que mande, com algum
controle.
Quem vai ocupar Gaza para entregar o governo
a alguém, talvez à Autoridade Nacional Palestina? Quem evitaria uma
guerra-guerrilha civil desse novo governo com possíveis herdeiros do Hamas ou
similares?
Supondo que haja qualquer coisa que se possa
chamar de governo, que armas terá? Haverá uma tropa internacional, "força
de paz", para manter a ordem? Gente do governo israelense diz para a mídia
ocidental que não vai ocupar Gaza nem dar ajuda alguma.
Quem vai administrar e financiar a
reconstrução mínima, se sobrar alguma coisa para reconstruir? De onde virão
eletricidade e combustível e, pois, água? De Israel, que limita a água até da
Autoridade Nacional Palestina, na Cisjordânia, que ocupa mais e mais, aliás?
2 comentários:
Excelente! O direito de Israel "se defender" inclui matar mais de 700 crianças palestinas e criar a situação descrita nesta coluna?
Um horror!
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