O Estado de S. Paulo
Atuação monocrática de juízes sem controle é um risco, mas risco maior é um presidente sem controle
O presidente no Brasil é um dos mais
poderosos do mundo, para que seja capaz de governar em ambiente
multipartidário. E para que houvesse equilíbrio entre os poderes, o legislador
constituinte de 1988 também delegou amplos poderes ao Judiciário para que tivesse
condições de controlá-lo. Essa escolha, no entanto, vem desagradando parte
importante da sociedade representada no Legislativo.
O Supremo percebeu esses sinais de insatisfação e decidiu se autoconter por meio de uma reforma de seu regimento interno, liderada pela ex-ministra Rosa Weber em dezembro do ano passado, quando estabeleceu que decisões monocráticas poderiam ser apreciadas imediatamente pelos colegiados e também impôs prazos mais rígidos para a apreciação de pedidos de vista.
Essas iniciativas, entretanto, parecem não
ter atendido a preferência da maioria dos senadores. O Senado acaba de aprovar
uma PEC que restringe ainda mais o Supremo, ao proibir que Ministros tomem
decisões monocráticas para suspender a eficácia de leis e atos dos presidentes
da República, do Congresso, do Senado e da Câmara dos Deputados.
A PEC permite decisões monocráticas apenas do
Presidente do STF em períodos de recesso e em situações de grave urgência ou
perigo de dano irreparável. Se aprovada pela Câmara, diminuirá a agilidade da
Corte e aumentará os custos de coordenação ex ante dos ministros do Supremo
para que decisões majoritárias no colegiado possam sustar decisões de outros
poderes.
Naturalmente que decisões monocráticas nem
sempre seriam motivadas para controle do executivo. Pode acontecer justamente o
inverso, de decisões individuais empoderarem ainda mais o presidente, ou serem
utilizadas de forma abusiva e extemporânea. Mas esse é o preço que o
Legislativo decidiu pagar, pelo menos até o momento, para ter quem controlasse
um Executivo extremamente forte.
Ajustes sempre podem ser feitos, mas deve-se
ponderar as suas consequências sistêmicas. É importante perceber que não existe
saída ótima nesses dilemas.
Legisladores já restringiram alguns poderes
do presidente, com a alteração do rito das MPs e com o orçamento impositivo.
Mas o efeito não antecipado foi a inflação
dos custos de governabilidade e uso de emendas pouco republicanas.
Outro risco da PEC aprovada pelo Senado é o
de que ela seja percebida pela sociedade como um enfraquecimento da Suprema
Corte, bem como seja interpretada pelos legisladores como uma brecha para que
novas reformas sejam implementadas que venham a diminuir, não apenas os poderes
individuais dos seus ministros, mas também diminuir de fato os poderes da
própria Suprema Corte.
*Professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV Ebape) e sênior fellow do Cebri
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