domingo, 19 de novembro de 2023

Míriam Leitão - Ministro Haddad e as vitórias difíceis

O Globo

Titular da Fazenda venceu diversas batalhas no governo, mas os que perderam podem jogar sobre ele qualquer custo de problemas futuros

O ministro Fernando Haddad reverteu um jogo perdido, mas a cobrança sobre ele continuará forte. Os que perderam o debate sobre a mudança da meta fiscal começaram a segunda discussão: qual é o tamanho do contingenciamento necessário para que a meta seja mantida em zero? O ministro terá que continuar fazendo uma delicada costura interna porque o ano que vem tem ainda muitas incertezas.

Mesmo que aprove todas as medidas que mandou para o Congresso pode não chegar nos R$ 160 bilhões de receitas a mais que projetou. Tem ainda o fator político, porque 2024 é ano eleitoral e qualquer mau desempenho do governo será jogado sobre ele.

Quem avalia assim não são os que divergiram de Haddad, mas pessoas com proximidade com o ministro e que acham que ele está certo no que fez. O temor que se tem é que o fato de ter vencido a queda de braço com os ministros que queriam expansão de gastos possa ser usada para jogar sobre ele qualquer custo de problemas futuros.

Haddad está certo. Mudar a meta antes de tentar atingi-la enfraqueceria o projeto do governo de reforçar a arrecadação com as propostas que estão no Congresso e daria sinais para os agentes econômicos que poderiam levar à alta dos juros no mercado privado. Isso geraria o oposto do que se quer.

Aumentar gastos seria expansionista e, teoricamente, alimentaria o ritmo de crescimento. Mas se isso fosse entendido como descontrole, os juros futuros subiriam afetando diretamente o custo de captação das empresas, ou seja, acabaria tendo efeito contracionista.

Foi isso que Haddad explicou internamente para evitar a mudança da meta. “Segundo ele disse, se mudasse a meta, perderia o Congresso, com as dificuldades que teria para aprovar as medidas, e perderia a possibilidade de ver o Banco Central continuando a cortar os juros”, relatou uma fonte que participou das conversas. E acrescentou: “essa é uma vitória que amanhã pode cobrar seu custo”.

Que custo? Em todas as conversas sobre o assunto, a Casa Civil alertava que seria mais fácil mudar a meta agora na aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), do que em março, quando terá que ser enviado um projeto de lei ao Congresso (PLN), cuja tramitação pode ser mais difícil.

Outro custo é o seguinte: o governo aceitou manter em zero a meta, mas não quer contingenciamento. Se for feito o contingenciamento, Haddad será cobrado por cada projeto que não sair do papel. A saída para a Fazenda é limitar o contingenciamento a um valor menor, que seja compatível com as possibilidades do arcabouço, em torno de R$ 25 bilhões.

No seminário “E agora, Brasil?”, que eu mediei junto ao jornalista Alex Ribeiro, do Valor, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto apoiou a decisão de manutenção da meta. Ele explicou que se os agentes econômicos entendessem que o fiscal terá uma trajetória ruim, isso afetaria câmbio, juros futuros e inflação. Ele lembrou que o governo gastou um grande tempo desenhando e aprovando um arcabouço, por isso não deveria desistir dele.

—Você fez o arcabouço, lutou por ele, fez o trabalho de convencimento do Legislativo, teve o trabalho de comunicação com a sociedade e, no primeiro desafio, você o abandona? Haverá uma dificuldade muito grande de estimar os números futuros. Se mudar 2024, como será 2025? 2026? É um jogo de credibilidade. Por isso, na nossa opinião, é importante manter a meta — disse Campos Neto.

A resistência e a capacidade de convencimento interno do ministro Fernando Haddad foram testadas, com sucesso, várias vezes desde o início do governo. Ele manteve a meta de inflação de 2023, quando muitos queriam a elevação. E a inflação ficará no intervalo de flutuação, o que, no começo do ano, parecia impossível. Ganhou a briga de reoneração dos combustíveis fósseis. Venceu a disputa interna e manteve a meta de inflação inalterada em 3% nos próximos anos. Convenceu o governo a fazer o arcabouço. Agora, quando parecia ter perdido o debate da meta fiscal zero em 2024, não jogou a toalha e acabou virando o jogo.

Mas a briga interna continua, com os que perderam esperando para jogar sobre ele quaisquer dificuldades futuras. O que deveriam se perguntar é onde estariam os juros, o dólar, a inflação e o PIB caso o ministro da Fazenda tivesse escolhido outro caminho? As experiências passadas deveriam ter convencido todo o PT de que o caminho fácil da expansão descontrolada do gasto cobra um preço impagável.

2 comentários:

EdsonLuiz disse...

A Âncora Fiscal que este governo fez não ancora nada!
■Pelo contrário:: esta Âncora Fiscal que nem o PT arrisca chamar de âncora e por isto chama de Arcabouço Fiscal autoriza aumentar gastos até mesmo quando faltar dinheiro.

Um arcabouço é apenas um rascunho (arcabouço também pode ser uma estrutura a ser preenchida) ; arcabouço não é uma âncora. Isto leva a pensar que até hoje o PT não tem uma Política Fiscal e nem quer ter:: para ter uma Política Fiscal teria que adotar, no mínimo, uma âncora contra gastanças digna de ser uma âncora, e o rascunho que o PT fez, ao contrário de ser uma âncora contra gastos, permite preencher a estrutura com qualquer coisa e permite gastar mais mesmo se não entrar mais dinheiro.

Podem preencher com qualquer coisa o rascunho que fizeram, dentro de certos limites (se Lula respeitar), mas mesmo se Lula respeitar os limites o arcabouço permite gastos até quando não pode.

E como vocês acham que Lula vai preencher o arcabouço? O que vocês acham que vai acontecer com a Carga Tributária e com os gastos, sendo Lula quem está no comando do executivo e em conluio com Arthur Lira na Câmara?

Como Lula e Lira vão aumentar a Carga Tributária e os gastos, sendo que o Brasil já tem um déficit primário por perto de 1% do PIB e tem uma dívida que consome mais de 6% do PIB, a situação da economia não vai melhorar até o final deste atual mandato e início do próximo.

O governo teria que ser responsável, controlar os gastos e gerar superávit para pagar a dívida, evitar seu aumento e não gerarando déficit.

Para conseguir este resultado e voltar ao equilíbrio o governo teria que cortar gastos.
Pergunto:: Um governo populista vai ser sério com o país e com o povo e vai cortar gastos?
▪Não, né? Esperar Lula e o PT populistas cortarem gastos, em vez de fazerem a farra de gastança sem ter dinheiro e a corrupção que fazem, é a mesma coisa que esperar que qualquer destes politicozinhos rastaqueras que nós temos na América Latina corte gastos e não se corrompa.

E mesmo este rascunho rascunho que o PT só agora tem, ninguém sabe como o PT vai preencher.
■Mas sabemos que de partida ele permite aumentar gastos até mesmo em anos em que não houver crescimento de receita.

Então, este arcabouço não dá estrutura para ancorar a economia ; este arcabouço foi feito como uma forma de dar desculpas para fazer gastos até quando não tiver dinheiro.

O resultado vai ser inflação, Câmbio e taxas de juros maiores no futuro.

ADEMAR AMANCIO disse...

Lendo e tentando entender,artigo e comentário.