O Globo
No início deste ano, o clima mundial era de
inflação alta, com juros subindo, situação nada propícia para o crescimento
O presidente Lula manifesta especial
satisfação em atacar ou zombar do mercado financeiro, quando este erra
previsões. Neste ano ofereceu boas oportunidades.
Em janeiro, o mercado esperava, para o ano,
inflação de 5,36% e crescimento do PIB de 0,78%. Sobre a
inflação, ainda não temos os números finais, mas deverá ficar na casa dos 4,5%.
No caso do PIB, o desvio será bem maior. Saberemos o resultado lá por abril,
mas já se dá como certo, no próprio mercado, que terá crescido em torno de 3%.
Para Lula e Haddad, não há dúvida. O mercado
apostava no desastre.
Será?
A questão é saber o que explica os desvios. Para isso, é preciso entender como são feitas as previsões. Elas aparecem semanalmente no site do Banco Central, no Relatório de Mercado, também conhecido como Boletim Focus. Fazem parte do regime de metas de inflação.
O BC recebe do Conselho Monetário Nacional a
meta a ser cumprida ano a ano. E trata de alcançá-la fixando a taxa básica de
juros, a Selic. Para cima quando a inflação está em ritmo de alta — e
inversamente quando cai. Uma questão essencial nesse regime é a credibilidade
do BC. O mercado, a sociedade, os meios econômicos e políticos acreditam que o
BC alcançará as metas? Por isso o BC tem de saber o que o pessoal de fora está
pensando.
O Focus é parte essencial. Bancos,
consultorias, departamentos econômicos — algo como 140 instituições participam
do sistema. Toda semana, rodam seus modelos e montam cenários para os
principais dados macroeconômicos para três anos à frente. O BC recebe isso na
sexta-feira, tabula no fim de semana e na segunda, às 8h30, coloca no seu site
a tabela com as projeções.
Reparem: isso é feito toda semana, pela
simples e boa razão de que a economia muda por fatores variados ao longo do
período. Assim, as previsões feitas em janeiro de 2023 estão baseadas em dados
conhecidos até aquele momento.
Naquele mês havia dúvidas razoáveis sobre a
capacidade (ou vontade) do governo em aplicar algum modelo de ajuste fiscal.
Haddad teve de brigar muito, até dentro do seu partido, para aprovar o
arcabouço fiscal. Não foi um modelo dos sonhos, mas pelo menos se tinha alguma
regra. O ambiente no mercado melhorou com o arcabouço.
Do mesmo modo, no início deste ano, o clima
mundial era de inflação alta, com juros subindo, situação nada propícia para o
crescimento. Hoje, é quase o contrário. O mundo espera queda de juros em 2024,
inclusive e principalmente nos EUA, o que favorece crescimento global. E a
China, nossa cliente, não vai tão mal quanto se temia.
Finalmente: se as previsões saíssem de uma
bola de cristal vendo futuro imutável, então não seria preciso refazer os
prognósticos toda semana, não é mesmo? No início do ano, o Focus dizia que
o dólar chegaria
hoje a R$ 5,28, pois se entendia que o juro alto nos Estados Unidos valorizaria
a moeda americana. Pois ontem o dólar estava em R$ 4,85, refletindo a
perspectiva de juros menores.
No Focus desta semana, as previsões para o
dólar são: R$ 4,90 para este ano (quase certo); R$ 5,00 em 2024; e R$ 5,05 em
2025. Prestem atenção, o mercado está nos dizendo que, em 31 de dezembro de
2025, o dólar será negociado a R$ 5,05. Qual a chance de cravar? Zero.
Dirão: então para que servem as previsões?
Para dizer que os analistas esperam um dólar estável ao longo dos próximos dois
anos, isso considerando as condições atuais no país e no mundo.
Tudo considerado, o BC monitora as
expectativas e age de acordo. E as expectativas mudam com os fatos e com ações
do governo.
Ou pelo que o governo não faz.
O presidente Lula esculachava o presidente do
BC, prometia reverter a privatização da Eletrobras e
mudar o Marco Legal do Saneamento. O ministro Luiz Marinho dizia que a reforma
trabalhista (do governo Temer) era destruidora de empregos e, pois, pretendia
mudá-la.
Não conseguiram fazer nada. Segue a
Eletrobras, esperam-se mais investimentos privados em saneamento, e o ano vai
terminando com recorde de pessoas trabalhando, mais de 100 milhões. E o
presidente do BC foi à festa de fim de ano com Lula. Mudou, né?
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