sábado, 30 de dezembro de 2023

Oscar Vilhena Vieira* - Segurança pública: prioridade para 2024

Folha de S. Paulo

Reduzir a violência é não apenas um imperativo moral, mas também uma condição para a prosperidade econômica

Em 2023 a democracia foi salva e a economia parece estar entrando nos eixos. A agenda climática foi retomada, assim como as principais políticas sociais. Feitos nada triviais para um governo minoritário e recebido com grande desconfiança pelo mercado.

O centrão, como era de se esperar, demonstrou-se mais leal aos seus interesses pragmáticos que à agenda obscurantista dos antigos habitantes da Esplanada (com exceções). O governo soube alinhar suas prioridades às ambições da maioria parlamentar. Tudo isso, evidentemente, ao régio custo de emendas. O fato, porém, é que a coisa andou. O governo governou.

O grande desafio para 2024 é estabelecer alguma ordem e racionalidade no campo da segurança pública. A redução da violência e da criminalidade, que brutalizam a vida de milhões de brasileiros todos os dias, constitui não apenas um imperativo moral, mas também uma precondição para a prosperidade econômica e para a sobrevivência do próprio Estado democrático de direito.

Desde a transição para a democracia os diversos governos federais têm se evadido da responsabilidade de coordenar as políticas e modernizar as agências de justiça e segurança, alegando que essa é uma responsabilidade dos estados. Essa omissão levou ao crescimento do crime organizado, à deterioração do sistema de segurança, assim como abriu um enorme mercado eleitoral para a extrema direita, com suas receitas simples, diretas e, sobretudo, erradas no campo da segurança pública. Armar a população, aliviar os controles sobre a atividade policial, promover o encarceramento indiscriminado e fechar os olhos para as milícias pode gerar votos, mas, no final do dia, apenas contribui para o aprofundamento da crise de segurança, levando a mais mortes e degradação do tecido social.

Nas últimas décadas houve um avanço muito grande no campo da segurança pública, com forte impacto sobre a redução da violência em diversas partes do mundo e também no Brasil. Como não se cansava de salientar Paul Chevigny, professor emérito da Universidade de Nova York e autor de dois clássicos estudos sobre polícia, falecido no último mês, múltiplos são os fatores que promovem a criminalidade e a violência. Múltiplas, portanto, devem ser as políticas e instituições envolvidas na contenção da criminalidade. Logo, não é uma tarefa apenas das polícias estaduais, no caso brasileiro.

Isso impõe ao governo federal assumir um protagonismo, ainda que partilhado, na construção de política nacional de segurança pública, com foco na redução dos homicídios e na retomada dos territórios hoje dominados pelo crime e pelas milícias. Perdoem o truísmo, mas estados são constituídos e governos são eleitos para enfrentar os problemas centrais de uma sociedade. E assegurar a paz é o problema primordial de qualquer sociedade.

Se o governo federal não entende ser conveniente criar um Ministério da Segurança Pública para executar políticas de segurança, deveria ao menos criar uma Secretaria de Estado, com mandato e autoridade para articular junto ao parlamento, aos governadores e mesmo às polícias uma ampla reforma das políticas criminais, bem como a modernização das agências de aplicação da lei, além de promover a integração de outras políticas sociais com as políticas de segurança. A indisposição para enfrentar racionalmente os desafios da segurança pública será inevitavelmente punida pelo eleitor. Desnecessário lembrar que as principais vítimas continuarão a ser pretos e pobres.

Desejo às leitoras e aos leitores um bom ano! Lembrando, apenas, que o ano não será melhor se cochilarmos no ponto.

*Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP. Autor de "Constituição e sua Reserva de Justiça" (Martins Fontes, 2023)

2 comentários:

marcos disse...

Segurança com PM sem controle algum, Civil estável e MP covarde...enxugar gelo.

PM e CB têm que acabar; policia tem que ser civil, municipal, técnica, profissional e sem estabilidade.

A segurança chegou a tal ponto que somente Brasília tem condições de reverter. Obviamente, sem Lula ou Bolsonaro, pois um é parceiro das nações traficantes e o outro é braço político das Milícias.

MAM

Anônimo disse...

■■■Eu concordo que a segurança no Brasil está um caso ainda mais terrível do que os outros e precisa ser revolucionado, como a educação no Brasil precisa ser revolucionada. Mas eu acho que com isso todos concordam, inclusive bolsonaristas e petistas.

■Uma inteligência, pesquisas, estudos e investigações importantes de segurança totalmente centrada e sob a responsabilidade do Governo Federal, que eu penso que pode ser feita em grupo conjunto de Polícia Federal, Ministério da Justiça, Forças Armadas, especialistas indicados pela sociedade e com coordenação de um Ministério de Segurança a ser criado, e com a parte operacional totalmente municipalizada, isto é, sim, uma ideia revolucionária e que eu acho que merece ser considerada.

Eu nunca havia visto uma proposta assim para a segurança pública:: Cidades-Governo Federal.

Claro que se especialistas entendesem ser esta uma proposta a ser estudada, considerariam um papel para os Governo Estaduais, talvez o de supervisão.

■■■MAS eu resolvi responder aqui para, de fato, ripostar.
=>Ripostar sobre outra coisa que foi escrita.
■Foi escrito que::
" A segurança chegou a tal ponto que somente Brasília tem condições de reverter. Obviamente, sem Lula ou Bolsonaro, pois um é parceiro das nações traficantes e o outro é braço político das Milícias.".

NÃO!
■Lula não é "parceiro das nações traficantes".
=>Bolsonaro, ok:: Bolsonaro é, de vários modos, "braço político da Milícias".