Correio Braziliense
Com o fundo eleitoral e 7.900 emendas
parlamentares, no valor total de R$ 53 bilhões, deputados e senadores terão R$
5 bilhões a mais do que os investimentos do PAC
A quinta-feira não foi de bom agouro para as
relações entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente do
Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em 2024, um ano eleitoral, ao menos
simbolicamente. Embora a política se pareça com as nuvens, como diria o antigo
político mineiro Magalhães Pinto — “você olha e ela está de um jeito; olha de
novo e ela já mudou” —, pode ser até que tudo não passe de um jogo de cena,
cada qual para sua plateia, mas o choque tem bases objetivas que devem ser
levadas em conta.
No mesmo dia em que Pacheco promulgou o marco temporal e a nova lei de desoneração da folha de pagamento, cujos vetos presidenciais foram derrubados pelo Congresso, Lula sancionou a nova Lei dos Agrotóxicos, com novos vetos que restabelecem o poder do Ibama e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em relação ao Ministério da Agricultura. É mais uma queda de braços entre o Executivo e o Legislativo, na qual a bancada do agronegócio, com toda certeza, levará a melhor, em razão da correlação de forças no Congresso.
O PL do Veneno, como é chamado pelos
ambientalistas, tramitou 24 anos no Congresso, antes de ser aprovado, em
novembro. Os 14 vetos, segundo comunicado do governo, “vão garantir a adequada
integração entre as necessidades produtivas, a tutela da saúde e o equilíbrio
ambiental”. Será? Para derrubá-los, os ruralistas precisarão apenas de maioria
simples no Congresso, no qual o governo é minoritário em temas que envolvem
interesses do agronegócio, da bancada da bala e dos evangélicos, a coalizão que
elegeu e apoiou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), imbatível quando se une.
Isso vem ocorrendo com mais frequência do que
se esperava, embora o governo Lula tenha conseguido algumas vitórias
estratégicas no Congresso, como a reforma tributária, que precisa ser
regulamentada no próximo ano. A aprovação do Orçamento da União consolidou a
perda de controle do governo sobre grande parcela das despesas discricionárias,
aquelas que não são obrigatórias, como recursos para custeio e investimentos.
As despesas obrigatórias são, principalmente, pagamento de pessoal e benefícios
previdenciários. Sem a maior parte das discricionárias, o governo não
funcionaria.
Emendas parlamentares
O Orçamento da União para 2024 (PLN 29/2023),
aprovado na semana passada pelo Congresso, prevê receitas e despesas de R$5,5
trilhões. Pelo texto, o salário mínimo passa dos atuais R$ 1.320 deste ano para
R$ 1.412 em 2024. O maior debate no Plenário foi em relação ao Fundo Eleitoral,
que era de R$ 939,3 milhões e passou para R$ 4,9 bilhões, destinados às
eleições municipais do próximo ano. O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC),
coração da política de investimentos de Lula, foi tungado em R$ 6,3 bilhões. O
total destinado ao PAC em 2024, portanto, será de R$ 54 bilhões. Na proposta
original do governo, o valor previsto era de cerca de R$ 61 bilhões.
Foram acolhidas 7.900 emendas parlamentares
individuais, de bancadas estaduais e de comissões, no valor total de R$ 53
bilhões, ou seja, deputados e senadores terão R$ 5 bilhões a mais do que os
recursos de investimentos do governo, se considerarmos o fundo eleitoral. Desse
total, R$ 16,7 bilhões são de emendas de comissões, valor mais que o dobro do
que foi aprovado em 2023 (R$ 7,5 bilhões), que substituiu o orçamento secreto.
Para as emendas individuais obrigatórias, foram fixados R$ 25 bilhões e R$ 11,3
bilhões para emendas de bancadas, seguindo porcentagens fixadas na Constituição
Federal.
A distribuição de recursos entre as comissões
não tem nada a ver com as demandas reais da população. Por exemplo, no Senado,
a Comissão de Educação recebeu R$ 7,9 milhões, ao passo que R$ 4 bilhões vão
para a Comissão de Desenvolvimento Regional. A Comissão de Meio Ambiente
recebeu R$ 550 milhões. O critério para a partilha dos recursos não são as
políticas públicas, mas os interesses paroquiais de deputados e senadores, que
miram suas bases eleitorais.
Nesta quinta-feira, o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, anunciou novas medidas para zerar o deficit das contas
públicas federais nos próximos anos: “Nós havíamos já sinalizado que depois da
promulgação da reforma tributária encaminharíamos medidas complementares. O que
estamos fazendo, enquanto equipe econômica, é um exame detalhado do Orçamento
da União, isso vem acontecendo desde o ano passado, antes da posse.”
Por medida provisória, a ser publicada hoje
ou amanhã, o governo pretende compensar as desonerações por meio de novas
tributações. Apertem os cintos.
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