O Globo
O Congresso aprovou R$ 53 bilhões para
emendas parlamentares no Orçamento de 2024 — valor próximo ao que a Fazenda,
não prevalecentes os puxadinhos, terá de bloquear no próximo ano, jornada em
que o presunto do natimorto arcabouço fiscal será exposto, o compromisso com a
meta zero tendo cumprido o papel de fantasiar uma regra que alivia o controle
de despesas, garante aumento de gastos e pretende sobreviver via arrecadação
exclusivamente.
A conta não fecha; daí Haddad a despejar, mal saído o Papai Noel, Medida Provisória por meio da qual promoverá justiça tributária limitando a compensação a quem pagara mais em decorrência de cobrança ilegal. A empresa tungada, na hora de usar créditos tributários para abater impostos, a receber uma espécie de tunga da tungada. Faz lembrar Guedes e o teto pedalador dos precatórios, contra o que — calote — a grita fora imensa. Como a democracia voltou, ora se faz justiça.
A conta não fechará. Também porque ninguém —
o Judiciário e seus penduricalhos acima de todos — parece disposto a sacrificar
o próprio orçamento. O Parlamento joga o jogo haddadiano e lhe aprova os
projetos caça-níqueis, se esse for o caminho para que não faltem os dinheiros.
(Até para cassino, atividade ilegal, a taxação — em sua versão on-line — foi
aprovada.) Como — mesmo sob a criatividade petista — há limites para a
multiplicação das receitas, o Congresso se blinda. Porque faltarão os
dinheiros. Que não sejam os meus!
Os R$ 53 bilhões em emendas serão, na
prática, impositivos. Divididos em porções de impositividade formais e
informais. Os mais de R$ 16 bilhões para as emendas de comissão, cuja
distribuição não é obrigatória, serão obrigatoriamente disparados. Ou não terá
a imprensa noticiado — sem que o Planalto contestasse — um acordo entre Lirão e
governo para que sejam pagos à margem dos contingenciamentos?
É a impositividade informal. Que fundamenta a
nova versão do orçamento secreto. Dezesseis bilhões de reais a ser, sob a
fachada do comando das comissões, distribuídos opaca, autoritária e (agora)
obrigatoriamente a aliados dos donos do Congresso: Lira, Alcolumbre e seus
elmares e pachecos. No ano de eleições municipais.
E quem indica o comando das comissões? O
Lirão concentrador de poder se blinda. Aprendeu com o ano que terminou.
Recapitule-se. Quando da formulação do
Orçamento de 2023 e da costura pela PEC da Transição, e em função de o Supremo
haver interditado a perversão da emenda do relator, o futuro governo Lula e o
Lirão permanente firmaram acordo pela continuidade do orçamento secreto; que,
deslocando-se, teria como nova fachada os gastos discricionários dos
ministérios. As granas, formalmente sob os cuidados das pastas, seriam —
conforme repartido antes da intervenção do STF — propriedade dos parlamentares.
O governo destratou esse acordo pelo mais que
pôde. Queria influir nas destinações. Sem sucesso. E se chegou a dezembro com
Alexandre Padilha prestando conta aos chefes sobre quantos dinheiros lhes
liberara e como soltaria os que faltavam. Foi nessa afobação — por aprovar as
medidas arrecadatórias — que se pactuaria pela impositividade informal das
emendas de comissão.
O Lirão, afinal, levou tudo. Não sem se expor
ministrando paralisias à agenda governista. Razão por que também força pelo
calendário de empenho para emendas. Quer secar o poder de o Executivo gerir ao
menos o tempo de processamento das demandas. Vai que descumpra novamente o
acordo...
O descasamento — a desconfiança — entre
governo e Lirão tem boa medida no choque entre expectativas e o que se aprovou
no Orçamento. O Planalto gostaria de que os parlamentares destinassem emendas
para robustecer projetos do PAC. O Congresso chancelou texto que não apenas
ignora esse desejo, como robustece as emendas tomando bilhões do PAC.
(Descasados orçamentariamente, casam-se na confiança em como o Supremo decidirá
sobre a Lei das Estatais, a saber se o senador Dino, a ser líder do governo na
Corte constitucional, cumprirá a profecia de encarnar o desenvolvimento de
Lewandowski.)
Dezesseis bilhões sob a fachada das emendas
de comissão. Pense-se nos quase R$ 5 bilhões definidos para o fundo eleitoral e
se estime o potencial de valor triplamente maior para financiamento paralelo
das campanhas do Lirão Brasil adentro.
Gleisi Hoffmann, presidente do PT, sacou.
Donde o ataque à distorção gerada pelo parlamentarismo orçamentário. Menos por
valores conceituais, de defesa do equilíbrio da República, e mais por
preocupações objetivas; com essa espécie raríssima de aliados, que ganha
ministérios, codevasfs e caixas sem formar base de apoio confiável no Congresso
e que — quase imune aos mecanismos de fiscalização — disporá de bilhões para
remeter, ao gosto alcolúmbrico, a suas pontas.
Será surra nas urnas, surrada — sem
precedentes até para os padrões deste país — a qualidade do gasto público.
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