Valor Econômico
Há ainda duas guerras, na Ucrânia e na Faixa
de Gaza, que ainda não está claro como vão transcorrer, e o risco de um
conflito regional no Oriente Médio
Bem-vindo a 2024. O ano começa com uma
escalada de bombardeios entre Rússia e Ucrânia e a continuidade dos ataques
israelenses na Faixa de Gaza. Há dúvidas importantes com relação à economia dos
EUA e da China, assim como com a exuberância dos mercados financeiros,
especialmente o americano. Mas o evento previsível mais importante no mundo
será sem dúvida a eleição presidencial nos EUA, em novembro, principalmente
pela sua capacidade de trazer mudanças globais profundas e duradouras. O fator
Donald Trump estará em todas as avaliações de risco.
Claro, haverá outros eventos importantes em 2024. Existem as duas guerras de amplo impacto em andamento, na Ucrânia e em entre Israel e o grupo palestino Hamas, e não está claro ainda como elas vão transcorrer. Há o risco de um conflito regional no Oriente Médio. Além disso, as duas maiores economias nacionais do mundo, EUA e China, devem desacelerar neste ano, e esse processo, que afetará diretamente a vida de boa parte da população do planeta, também é incerto.
Este ano será também repleto de eleições
importantes. Na Índia, que possivelmente já é o país mais populoso do mundo, o
premiê nacionalista Narendra Modi tentará uma nova reeleição (em data a ser
definida). Em junho, a União Europeia (área que detém o maior PIB do mundo) vai
renovar o seu Parlamento, numa votação que é importante tanto para a definição
de políticas da UE (como a taxa de carbono) como para a política interna dos
países-membros. Há uma probabilidade grande de eleição antecipada no Japão. No
Reino Unido, há uma boa chance de a oposição trabalhista (esquerda) voltar ao
poder após 14 anos nas eleições parlamentares (em data a ser definida). E
haverá em março a eleição presidencial na Rússia, que se sabe que será vencida
pelo presidente Vladimir Putin, uma vez que qualquer oposição de fato está
impedida de participar.
Ainda assim, nada disso terá tanta relevância
para o mundo quanto as eleições americanas, já que os EUA são a maior potência
econômica, política e militar.
É claro que eleições presidenciais nos EUA
são sempre importantes. É por isso que, a cada quatro anos, ganham destaque na
mídia global. Mas esta será particularmente crucial, devido à possibilidade de
determinar mudanças profundas e duradouras no país e no mundo, caso o
ex-presidente Donald Trump seja eleito. As pesquisas indicam hoje que ele
lidera com folga a corrida pela candidatura do Partido Republicano (o processo
de prévias partidárias começa em duas semanas) e que seria um adversário
difícil de ser batido nas eleições de novembro.
Sim, Trump já foi eleito uma vez e governou
por quatro anos, e tanto os EUA como o mundo continuam mais ou menos como eram
antes. Mas na primeira eleição não estava claro o que ele pretendia de fato ou
conseguiria fazer. Hoje já sabemos o significa uma Presidência Trump. E os
sinais emitidos até agora pelo ex-presidente são de que ele pretende insistir e
aprofundar as suas políticas, e não moderá-las.
Trump é famoso por suas bravatas verbais, e
nem tudo o que ele defende torna-se realidade. Na atual campanha eleitoral, por
exemplo, ele vem repetindo sua proposta de que saqueadores de lojas deveriam
ser mortos no local, seja pela polícia ou por qualquer pessoa armada. Segundo
relatos de ex-assessores, Trump propôs no seu governo um ataque nuclear à
Coreia do Norte. Como até partidários republicanos admitem, Trump propõe toda
semana vários absurdos, muitos ilegais, e nem tudo deve ser levado a sério.
Mas parte do que ele diz é levado muito a
sério. Governos, empresas e os mercados pelo mundo já estão fazendo isso. Trump
é o fator número um nas análises de risco relativas a este ano. E os riscos
mais importantes associados a um novo governo Trump são os seguintes:
Político. Trump tentou ativamente
reverter a derrota eleitoral de 2020 e impedir a posse de Joe Biden. Não
conseguiu. Ele irá a julgamento (num dos quatro processos criminais que
enfrenta) acusado de estimular a invasão do prédio do Congresso, em 2001. Nada indica,
muito menos o próprio, que ele não tentará novamente subverter o sistema
político americano com uma guinada autoritária. Além disso, mesmo não sendo a
causa, e sim uma consequência da atual polarização política nos EUA, o
ex-presidente promove essa divisão e dela se alimenta politicamente. E esse
ambiente polarizado ameaça tornar o país ingovernável.
Econômico. Sem ir a debates e
esquivando-se de entrevistas difíceis, Trump tem dado poucas dicas sobre sua
eventual política econômica. Mas já adiantou que pretende sobretaxar em 10%
todos os produtos importados pelos EUA para zerar o déficit comercial. Segundo
analistas, isso provocaria instabilidade na economia global. Ele anunciou
também que pressionaria o Fed a reduzir os juros. Agir contra a independência
do banco central americano possivelmente geraria tensão nos mercados.
Segurança. Trump chamou Putin de
“genial” pela invasão da Ucrânia e tem criticado o apoio ocidental ao país na
guerra contra a Rússia. Essa posição preocupa os aliados europeus, segundo
relatos da mídia europeia. Muitos na Europa temem que Trump retire os EUA da
Otan, a aliança militar ocidental, o que liquidaria o sistema de segurança
internacional do pós-Segunda Guerra.
Relação com a China. Uma vitória de
Trump possivelmente aumentaria muito o antagonismo com Pequim, que já é grande.
Ele disse que pretende acabar gradualmente com as importações de uma série de
produtos chineses, como eletrônicos e farmacêuticos, entre outros. E proibir
empresas chinesas de muitos setores de operarem nos EUA. Há o risco de uma
aceleração da corrida armamentista entre as duas potências e no descolamento
das duas economias. Biden manteve algumas das medidas de Trump contra Pequim,
mas vem tentando apaziguar as relações, numa estratégia de morder e assoprar.
Questão climática. O ex-presidente não
acredita em mudanças climáticas causadas pelo homem. No primeiro mandato, ele
retirou os EUA do acordo de Paris. Deve fazê-lo novamente. Trump promete dar os
incentivos necessários para aumentar a produção de petróleo dos EUA e deve
reverter políticas de Biden para redução de emissões de gases. E, sem a
participação dos EUA, a possibilidade de avanços internacionais em questões
ambientais é mínima.
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