Alta na dívida pública é preocupante
O Globo
Endividamento cresceu para quase 75% do PIB
em 2023. Equilíbrio fiscal é essencial para controlá-lo
Um item das finanças públicas deveria
interessar a todo cidadão: a dívida bruta do governo geral, que inclui governo
federal, INSS, governos estaduais e municipais. Medido como proporção do PIB, esse número indica o
peso do endividamento público e traduz seus principais efeitos negativos, em
particular o volume de recursos necessários para pagar juros. Para pagar o que
deve, o governo tem dois caminhos: gerar resultado fiscal positivo ou tomar
mais dinheiro emprestado no mercado, pagando juros mais altos para isso. Com a
sucessão de déficits fiscais nos últimos anos, o endividamento tem atingido
patamares a cada dia mais preocupantes.
O Banco Central divulgou na quarta-feira o número para 2023. Com um aumento de 2,7 pontos percentuais em relação ao ano anterior, a dívida bruta alcançou 74,3% do PIB, ou R$ 8,1 trilhões — quase R$ 40 mil por brasileiro. É um resultado bem acima do considerado razoável para países emergentes com as características do Brasil.
É preciso reconhecer que existem vários
senões sobre o salto registrado entre 2022 e 2023. De certa forma, o último ano
do governo Jair Bolsonaro foi atípico. O BNDES pagou antecipadamente R$ 83,2
bilhões em dívidas que tinha com o Tesouro Nacional, e a inflação mais alta
ajudou a elevar o PIB, o denominador no cálculo do endividamento, contribuindo
para reduzi-lo. Ainda assim, o resultado é motivo de inquietação e reforça a
necessidade, reiterada pelo ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, de buscar equilíbrio nas contas
públicas.
O déficit do governo foi de R$ 230 bilhões em
2023, ante superávit de R$ 46 bilhões em 2022 — piora fiscal de R$ 276 bilhões,
aproximadamente os 2,7% do PIB adicionados à dívida. O governo atribui, com
razão, grande parte dessa piora à gestão anterior, que legou as obrigações de
compensar estados e municípios pela redução do ICMS e de zerar as dívidas sem
possibilidade de recurso na Justiça, os precatórios. Mesmo com ajustes, a piora
fiscal foi da ordem de 1,2% do PIB.
A situação fiscal permanece inalterada: as
contas públicas fecharam o ano no vermelho, e a dívida cresceu. Haddad tem dado
repetidas provas de estar atento ao problema. Conseguiu aprovar no Congresso um
novo marco de controle fiscal e diversas medidas para aumentar a arrecadação.
Dentro do governo, tem resistido e mantido a meta de zerar o déficit em 2024.
Isso é fundamental para manter a credibilidade. “Se o governo não conseguir
cumprir a meta no primeiro ano, a distância para o ano seguinte vai aumentar”,
diz o economista Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal
do Ibre/FGV.
Nos próximos meses, é até possível que as
receitas adicionais resultantes das medidas tributárias surpreendam e fiquem
acima do previsto. Mas isso não deveria servir para escamotear o problema: a
resistência do governo a controlar despesas. Cardeais do PT teimam em
contradizer todo o conhecimento acumulado no Brasil e no mundo, criticando
sistematicamente a austeridade por reduzir o crescimento da economia. Todas as
evidências mostram que, sem equilíbrio fiscal, não há confiança. E, sem
confiança, não há investimento, condição necessária para o crescimento do PIB
(e redução do endividamento). Para avaliar o desempenho da gestão petista na
economia, será preciso acompanhar com atenção a trajetória da dívida bruta.
Censo detalhado permitiria dar melhor destino
a imóveis da União
O Globo
Auditoria do TCU constatou haver 2.829
prédios, casas ou terrenos abandonados ou invadidos
Enquanto a União tem 2.487 imóveis vazios e
342 invadidos, há filas nos programas sociais de moradia. A constatação, feita
por auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU),
atesta a má administração do patrimônio público
pelos governos e a dificuldade de articulação entre as esferas federal,
estadual e municipal para dar destino razoável a esses imóveis.
A auditoria constatou que os imóveis não são
avaliados da maneira correta e que os sistemas de controle são precários. Não
há na Secretaria do Patrimônio da União (SPU), subordinada ao Ministério da
Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, técnicos qualificados para gerenciar
os imóveis. O órgão nem sequer tem carreira própria para atraí-los. É possível,
segundo o TCU, que uma administração competente economizasse parte do R$ 1,1
bilhão que o governo federal paga todo ano em aluguéis.
Na gestão Jair Bolsonaro, a determinação era
vender os imóveis, reduzir as despesas com eles e aumentar a arrecadação. O
governo atual chegou à conclusão de que a venda apressada de 2,8 mil prédios,
casas e terrenos públicos abandonados poderia trazer prejuízo ao poder público.
Mas selecionou cerca de 500, a maior parte abandonada ou ocupada, para
transferir a prefeituras ou ao setor privado para fins habitacionais, culturais
e educacionais. O objetivo é múltiplo: alguns prédios precisam ser concluídos,
outros precisam de reforma para ser convertidos em habitações populares, e
existem também terrenos vazios para novas construções.
A SPU administra 740 mil imóveis, avaliados
em R$ 1,5 trilhão. É nesse vasto patrimônio imobiliário que estão os 2,8 mil
imóveis e terrenos abandonados e invadidos. É evidente que deve haver melhor
uso para eles. Um exemplo é o plano de
transformar a abandonada Estação Ferroviária Leopoldina, no Centro do Rio, em
polo cultural, como quer a Prefeitura carioca. Casos assim
podem ser encontrados noutras cidades.
Também faz sentido destinar parte desse
patrimônio a quem não tem casa. Embora os imóveis representem apenas uma fração
ínfima do déficit habitacional, estimado em 6 milhões de residências pela
Fundação João Pinheiro, faz sentido aproveitá-los em programas adequados de
habitação.
O plano do governo de destinar 500 imóveis a
fins sociais ainda é tímido diante do patrimônio. Apenas o INSS é dono de 3 mil
casas, terrenos e prédios, grande parte obtida na execução de sentenças de
empresas inadimplentes com a Previdência. A falta de política consistente
permite haver milhares de prédios, casas e terrenos sem uso. É preciso
conhecê-los, por meio de um censo imobiliário detalhado, para encontrar a
melhor destinação. Do contrário, persistirão a degradação e o desperdício.
TSE precisa conter tentações censórias
Folha de S. Paulo
Grupo anunciado por Moraes para combate a
fake news suscita temor quanto à liberdade de expressão, imprescindível numa
democracia
Já causa estranheza que um magistrado como o
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, esteja empenhado
numa campanha por uma regulação mais dura da internet, tarefa que cabe a
legisladores eleitos. Mais inquietantes ainda são as mostras de que se cogita
compensar a suposta lacuna na lei à base de voluntarismo.
Na mais recente delas, Moraes anunciou, na
condição de presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a criação de um
"grupo de execução" para "o rastreamento daqueles que atentam
contra democracia, que atentam contra a livre vontade dos eleitores,
disseminando discurso de ódio, discursos antidemocráticos".
Trata-se, mais uma vez, do combate declarado
a fake news, preconceito, intolerância e golpismo que proliferam nas redes
sociais —no qual um problema complexo costuma suscitar soluções não apenas
simplórias como temerárias.
Segundo o magistrado, a estratégia neste ano
eleitoral unirá esforços do TSE, da Polícia Federal e de tribunais regionais
para "avançar no sentido da prevenção e da repressão contra esses
criminosos". A seu lado estava o novo ministro da Justiça, Ricardo
Lewandowski, até outro dia colega de STF e TSE.
As palavras de Moraes indicam escassa confiança na capacidade dos eleitores de escolher e interpretar o conteúdo que acessam na internet —o que reflete velhos cacoetes paternalistas da legislação e das cortes eleitorais brasileiras.
A isso se soma o risco de censura na
pretensão de barrar mensagens que seriam produzidas de má-fé para manipular
votantes incautos ou conspirar contra as instituições democráticas. Tais
postagens circulam ao lado de outras que contêm equívocos não intencionais,
teses controversas, crenças infundadas e críticas virulentas.
Não foram poucas as decisões
arbitrárias do TSE no afã de tutelar conteúdos nas eleições de 2022.
Num dos casos, ordenou-se a retirada de um vídeo que rememorava fatos
conhecidos sobre corrupção em administrações petistas.
Na ocasião, o então magistrado Lewandowski
argumentou que "o cidadão comum, o eleitor, não está
preparado para receber esse tipo de desordem informacional".
Não se ignora que o alcance inaudito das
redes sociais trouxe novos desafios à organização de eleições, que apenas
começam a ser enfrentados. À Justiça cabe, sim, deliberar à luz da lei sobre o
que é aceitável ou não nas campanhas e nas manifestações públicas.
Tal ofício, no entanto, deve ser exercido com
autocontenção e atenção ao valor fundamental da liberdade de expressão,
imprescindível numa democracia.
Ensino sem celular
Folha de S. Paulo
Aumenta a restrição aos aparelhos em escolas,
mas deve-se evitar radicalismo
Cresce o número de países, cidades e escolas
que estão restringindo, ou até proibindo, a utilização de telefones celulares
por alunos.
Relatório da Unesco, publicado em julho do
ano passado, mostra que
esses aparelhos podem prejudicar o aprendizado. O impacto negativo
mais óbvio é a distração —jogos e redes sociais são mais atraentes do que aulas
expositivas.
Segundo o Programa Internacional de Avaliação
dos Estudantes (Pisa), 65% dos alunos de 15 anos nos países pesquisados em 2023
disseram que se distraem nas aulas de matemática com o celular; no Brasil, a
média atinge 80%.
Mas não só. Mesmo quando o apetrecho fica na
mochila, o toque da mensagem que o aluno não poderá conferir tende a deixá-lo
ansioso, numa reação similar à síndrome de abstinência de drogas.
Até tecnologias supostamente mais benignas,
como e-readers, que servem quase exclusivamente para ler livros e textos,
apresentam problemas. Estudos mostram que a leitura em tela gera menos retenção
do que em papel.
Com base nessas evidências, um em cada quatro
países monitorados pela Unesco —como Espanha, Portugal, Finlândia, Holanda,
Suíça e México— já baniu ou restringiu o uso de celulares e tablets.
No Brasil não há norma federal sobre o tema,
mas, no Rio de Janeiro, a prefeitura
proibiu celulares nas escolas da rede até durante o recreio. E não
são poucos os colégios particulares em todo o país que caminham na mesma
direção.
Contudo, se há razoável consenso de que a
utilização de celulares e tablets em instituições de ensino deve ser
restringida, a forma de fazê-lo permanece em aberto.
É apenas por tentativa e erro que se chegará
a protocolos adequados, que não serão os mesmos em contextos diversos. O nível
de restrição depende muito da faixa etária, por exemplo, e é preciso cuidado
para não pecar por radicalismo.
A chamada educação midiática é fundamental, principalmente em tempos de desinformação e bullying virtual. O celular pode ser usado de forma guiada para que os alunos aprendam como obter aquilo que a internet tem de melhor e se protejam daquilo que nela há de pior.
Por uma comunicação humana no século 21
O Estado de S. Paulo
Mensagem do papa sobre IA reforça que a tecnologia não serve bem quando afasta as pessoas de sua humanidade. Ela deve ser um meio para enriquecer as capacidades humanas
O papa Francisco publicou há poucos dias sua
mensagem para o 58.º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que, neste ano, será
celebrado pela Igreja Católica em 12 de maio. A mensagem papal revela desde o
título – Inteligência artificial e sabedoria do coração: para uma comunicação
plenamente humana – a preocupação do pontífice com o desenvolvimento e o
alcance de ferramentas de inteligência artificial (IA) e de que modo isso pode
afetar uma das mais humanas das capacidades. Com uma singela pergunta, Francisco
sintetiza uma apreensão que não é só dele, mas de boa parte dos líderes
mundiais nesta quadra da história: “O que então é o homem, qual é a sua
especificidade e qual será o futuro desta nossa espécie chamada homo sapiens na
era das inteligências artificiais?”.
A resposta a essa questão, fundamental para o
entendimento de como serão as relações entre os indivíduos e as nações no
século 21, não é de interesse circunscrito aos muros do Vaticano. Basta lembrar
que o Global Risks Report 2024, do Fórum Econômico Mundial, classificou as fake
news geradas por IA como “a maior ameaça global a curto prazo”. Por sua vez, o
Fundo Monetário Internacional (FMI) apontou para o possível aprofundamento de
desigualdades a partir da disseminação do uso de IA nas mais variadas cadeias
produtivas, além, é claro, de mudanças significativas que a IA empreenderá no
mundo do trabalho. Essas visões, contudo, embora demonstrem preocupação, passam
longe do pessimismo. Como bem resumiu a diretora-geral do FMI, Kristalina
Georgieva, “a IA pode ser assustadora, mas também pode representar uma grande
oportunidade para todos. Cabe a nós usá-la da melhor forma possível”.
Eis a chave para a humanidade lidar bem com
essa nova etapa do imparável progresso tecnológico. Não foi por acaso que o
papa Francisco, com muita sensibilidade, uniu as palavras “inteligência” e
“sabedoria” em sua mensagem. O desenvolvimento da IA, não resta dúvida,
contribuirá cada vez mais para a resolução de problemas de toda ordem, o que
não é outra coisa senão uma das manifestações de inteligência como habilidade
analítica, criatividade e exercício lógico. Contudo, todo esse instrumental
prático terá serventia limitada ou danosa se for usado sem sabedoria, vale
dizer, desacompanhado de uma compreensão ampla da vida e das relações humanas
e, não menos importante, de uma consideração ética sobre as implicações futuras
de decisões tomadas hoje.
O papa Francisco já demonstrou ser um líder
religioso que compreende o mundo de seu tempo. O pontífice sabe que o
desenvolvimento científico não só é virtualmente ilimitado, como é inerente à
própria natureza humana. E é exatamente com essa visão – atenta, mas não
assustada – que Sua Santidade abordou a IA na mensagem preparatória para o Dia
Mundial das Comunicações Sociais, recomendando que, ao lidar com essa
tecnologia, os indivíduos devem antes “limpar o terreno das leituras
catastróficas e de seus efeitos paralisadores”. Com essas palavras, Francisco
convida à reflexão sobre o desenvolvimento tecnológico não como algo que afaste
os indivíduos de sua humanidade, mas, ao contrário, sobre como a tecnologia
pode ser um meio de aprimorar e enriquecer as capacidades humanas, entre as
quais a comunicacional.
“A sabedoria do coração”, concluiu o papa
Francisco, “é a virtude que nos permite combinar o todo com as partes, as
decisões com suas consequências, as grandezas com suas fragilidades, o passado
com o futuro, o eu com o nós.”
A comunicação entre as pessoas é regida por
emoções, nuances culturais e contextos históricos e sociais. A IA, por outro
lado, opera sob uma lógica binária, buscando padrões orientada por uma
programação voltada exclusivamente à eficiência, sem perscrutar, obviamente, as
profundezas da experiência humana. A questão levantada pelo papa Francisco,
portanto, não é se podemos integrar a IA ao processo comunicacional, mas como
podemos fazê-lo de maneira que a ferramenta preserve a essência humana, não
fomente a discórdia e assegure a paz.
Manual para afugentar investidores privados
O Estado de S. Paulo
Com uma infraestrutura deficiente e
debilitada, o País não deveria se dar ao luxo de dispensar investimentos
privados, mas será preciso bem mais do que retórica para atrair novas empresas
O governo quer atrair novas empresas para
projetos de concessão e Parcerias Público-Privadas (PPPs) da nova edição do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O ministro da Casa Civil, Rui
Costa, disse que é preciso diversificar, uma vez que os grupos que já atuam no
País estariam sobrecarregados.
O diagnóstico do ministro não é exatamente
novo. O certame para a concessão de estradas no Paraná realizado no ano passado
foi disputado por dois fundos de investimento que já atuavam na área e no País.
Já o leilão da chamada “rodovia da morte”, em Minas Gerais, não teve
interessados.
Nas ferrovias, a opção do governo foi a de
renovar os contratos de concessão das atuais administradoras em troca da
antecipação dos investimentos. Com algumas exceções, os leilões de aeroportos
também têm registrado uma certa concentração de empresas que já haviam
adquirido outros ativos.
Com uma infraestrutura deficiente e um
orçamento estrangulado, o Brasil não deveria se dar ao luxo de dispensar os
investimentos da iniciativa privada. Porém, ao contrário do mercado financeiro,
capaz de atrair capital externo interessado no diferencial das taxas de juros,
o setor de infraestrutura ainda desperta muitas dúvidas nos investidores. E não
sem razão.
Basta lembrar o então prefeito do Rio de
Janeiro Marcelo Crivella destruindo as praças de pedágio da Linha Amarela em
outubro de 2019. Mais recentemente, após uma tempestade que deixou regiões da
capital paulista por dias sem luz, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes,
entrou em uma saga judicial demagógica para tentar rescindir o contrato com a
Enel.
Cenas e atitudes como essas ocorreram nas
duas principais cidades do País. É importante que se diga, no entanto, que atos
de irresponsabilidade nessa seara não são exclusividade dos prefeitos.
O edital de privatização do Porto de Santos
chegou a ser enviado para apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU) no
governo Bolsonaro, mas o processo foi suspenso após a eleição do presidente
Lula da Silva.
No caso da privatização da Eletrobras,
aprovada pela Câmara e pelo Senado, o governo federal, por meio de uma ação no
Supremo Tribunal Federal, tenta reverter sua perda de influência nos rumos da
empresa, materializada no menor número de assentos no Conselho de
Administração.
Para dar sobrevida a estatais estaduais, o
Executivo tentou passar por cima do marco do saneamento, também aprovado pelo
Congresso, por meio de decreto, ainda que a incompetência dessas empresas em
universalizar o acesso à água e ao esgoto tratados esteja mais do que atestada.
Como explicar essas idas e vindas, de maneira
convincente, para os investidores privados que tanto se pretende atrair? Eis o
tamanho do desafio do ministro da Casa Civil, que precisará muito mais do que
retórica para mostrar que o Brasil respeita contratos e tem segurança jurídica,
regras claras e agências reguladoras independentes. Também será preciso dobrar
a aposta em medidas que favoreçam o ambiente de negócios.
Algo que também faria diferença nessa área
seria a reconquista do grau de investimento. Fundos de pensão estrangeiros, que
tradicionalmente investem em ativos de infraestrutura, têm limitações para
aplicar recursos em países mal avaliados pelas agências de classificação de
risco.
No caso brasileiro, a maior dúvida das
agências não é a exposição ao setor externo, mas a política fiscal. Não por
acaso, ao elevar o rating soberano do País, logo após a aprovação da histórica
reforma tributária pelo Legislativo, a agência de classificação de risco
S&P enfatizou a importância de que o País permaneça na rota do pragmatismo
para criar as bases para um crescimento econômico sustentável e perene.
Nesse sentido, a defesa do déficit zero é
importante, mas insuficiente. Como mostrou o Banco Central, a dívida bruta do
País voltou a subir pela primeira vez em três anos e atingiu 74,3% do Produto
Interno Bruto (PIB). Garantir que a curva do endividamento público pare de
crescer e atinja a estabilidade é fundamental para que o País passe a ser visto
como um destino seguro para os investidores de longo prazo.
A imagem do antissemitismo
O Estado de S. Paulo
Agressão a lojista judia na Bahia expõe
cinismo do governo no combate ao antissemitismo
O governo que prometeu respeito à diversidade
e que faz do combate ao racismo uma de suas principais bandeiras levou nada
menos que dois dias para se manifestar a respeito de um ataque de
antissemitismo explícito ocorrido na Bahia, devidamente registrado em um vídeo
que chocou o País.
É o caso de perguntar o que fez esse governo
progressista esperar longas 48 horas para finalmente condenar aquele ato de
ódio explícito movido por preconceito contra judeus. É legítimo perguntar por
que o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, que não existe para outra
finalidade, hesitou tanto para fazer o trabalho para o qual recebe recursos
recolhidos de todos os cidadãos – inclusive judeus.
Quando finalmente decidiu tocar no assunto,
dada a enorme repercussão do caso, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio
Almeida, condenou o antissemitismo, mas conseguiu a proeza de juntar na mesma
frase uma condenação à “islamofobia” – sem que o caso em si envolvesse
muçulmanos.
Chega a ser perverso. Aparentemente, para
progressistas como o sr. Almeida, os ataques aos judeus não merecem pronto
repúdio e, quando afinal esse repúdio vem, sonega-se aos judeus a condição
singular de vítimas, mesmo num caso em que o antissemitismo é tão evidente. Ou
seja, a esquerda concede alguma atenção ao antissemitismo desde que se repudie
o ódio aos muçulmanos, ausentes no vídeo que indignou todos.
Que ninguém se engane: para a esquerda, o
caso da Bahia diz respeito aos palestinos, e não a uma mulher judia agredida
por ser judia. No discurso progressista, os judeus são vistos, coletivamente,
como o povo que, encarnado em Israel, “massacra o povo palestino”, nas palavras
do ministro dos Direitos Humanos. Logo, na mesma frase em que, com certa
dificuldade, cumpre o dever de condenar o antissemitismo, o ministro dá carona
para o que realmente importa, que é condenar Israel.
O fato incontestável é que a esquerda, tão
bem representada pelo sr. Almeida, jamais foi capaz de se solidarizar com os
judeus que padecem de antissemitismo explícito desde o covarde ataque do Hamas
a Israel. Pelo contrário: a agressão à comerciante judia em Arraial d’Ajuda por
uma mulher que a chamou de “maldita sionista” e “assassina de crianças”
obviamente foi fomentada pelo discurso raivoso da esquerda, que culpa
coletivamente os judeus pelos atos de Israel e deslegitima a autodeterminação
do povo judeu depois do genocídio promovido pelos nazistas.
O antissemitismo existe há bastante tempo e não há razão para acreditar que um dia acabará. O que se espera, no entanto, é que o governo do Brasil não fique inerte ou reaja de modo apenas protocolar diante do crescimento exponencial do ódio aos judeus verificado nos últimos tempos. A menos que os judeus não sejam titulares dos mesmos direitos humanos que são reivindicados por outras minorias, defendidas de modo aguerrido pela esquerda, é dever do Estado brasileiro deixar explícito, sem meias palavras ou cinismo retórico, que o antissemitismo, do mesmo modo que a homofobia, o racismo e a misoginia, é intolerável numa sociedade que se pretende livre.
Depois da festa do povo, a realidade
Correio Braziliense
Não há tempo a ser desperdiçado por disputas
políticas que possam colocar em risco um projeto que atenda as demandas da
sociedade e priorize, sobretudo, os vulneráveis
O carnaval chegou com toda a sua força e
importância sociocultural. Trata-se de uma festa coletiva, inclusiva, alegre,
diversa, que ocupa as ruas. É um sopro de esperança em tempos de tanta
intolerância e ódio. Mas a folia tem prazo limitado e enormes são os desafios
do Brasil real. Há muito a ser feito pelo governo e pelo Congresso para que,
enfim, o país possa caminhar em direção a um futuro com mais oportunidades e
menos desigualdades. Não há tempo a ser desperdiçado por disputas políticas que
possam colocar em risco um projeto que atenda as demandas da sociedade e
priorize, sobretudo, os vulneráveis. O que de pior prevaleceu nos últimos anos,
as tentativas golpistas, os brasileiros venceram.
A agenda no Congresso no pós-carnaval está
pesada. Deputados e senadores têm a missão de regulamentar a reforma tributária
que foi aprovada depois de mais de 30 anos de debates frustrados. Há um prazo
para que isso aconteça. Todos os entes da Federação têm muito a contribuir
nesse processo, cujo principal ganho será um sistema de impostos simplificado e
mais justo. Ao mesmo tempo, os parlamentares terão de cumprir a segunda etapa
da reforma, dessa vez, atacando as distorções do Imposto de Renda e obrigando que
os mais ricos, finalmente, cumpram as suas obrigações com o Fisco. O
Legislativo não pode frear esse processo de mudança, que só trará benefícios
para o país.
O pacote do Congresso incluiu, ainda, uma
série de medidas para consolidação do ajuste fiscal. O governo mantém firme a
promessa de zerar o rombo fiscal neste ano, mas, sem o apoio de deputados e
senadores, o Brasil conviverá com as ameaças provocadas pelo desequilíbrio das
contas públicas. Não se pode esquecer de que, no ano passado, o rombo
consolidado do Executivo federal, de estados, municípios e Previdência Social
atingiu R$ 249 bilhões. Com isso, a dívida bruta, um dos principais índices de
solvência do país, voltou a crescer depois de três anos, superando os 74% do
Produto Interno Bruto (PIB). Contas desajustadas significam mais inflação e
juros mais altos, combinação perversa para a economia.
Há, no entender do Banco Central, boas
notícias no horizonte, justamente resultado dos avanços conquistados com a
ajuda do Congresso, que priorizou temas importantes do ponto de vista
econômico. A perspectiva é de que o crescimento do PIB no primeiro trimestre
deste ano surpreenda e seja maior do que o projetado inicialmente. Também se
tornou consenso que não houve queda na atividade nos últimos três meses do ano
passado, o que sustenta um avanço de 3% da atividade no consolidado de 2023.
Está cada vez menor o número de especialistas prevendo um salto inferior a 2%
do PIB neste ano. Contudo, é preciso que o Legislativo supere eventuais
divergências, naturais em uma democracia, e faça o seu trabalho.
O Banco Central já se comprometeu com mais
dois cortes de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic), que está
em 11,25% ao ano, nas duas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária
(Copom). Ainda assim, o custo do dinheiro estará acima de dois dígitos. Os
passos seguintes, porém, dependerão de como o Congresso agirá em relação aos
projetos da área econômica. E, claro, das decisões do governo, que,
ressalte-se, vem flertando com um certo saudosismo quanto a políticas que, no
passado, empurraram o Brasil para a beira do precipício, com uma recessão que
tirou mais de 6% das riquezas produzidas em apenas dois anos. Bom senso é
sempre bom, assim como a humildade de se aprender com os erros.
Nos próximos quatro dias, que os brasileiros possam extravasar as emoções, curar as feridas provocadas pelo ódio e retomar o sentido da coletividade, em que cada um tem o direito de ser o que é. A beleza da vida está na diversidade humana, na pluralidade do pensamento, sempre, claro, respeitando o direito do outro. Ótimo carnaval!
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