O Globo
Só por isso ficou com Nikolas Ferreira. O PT
escolheu a de Saúde. O resto é fita para afetar indignação
As emendas de comissão foram preparadas para
ser — neste ano eleitoral — o novo abrigo (nova fachada) à dinâmica autoritária
do orçamento secreto; que nunca acabou e que, mantido o núcleo duro de sua
operação, vai se adaptando, de rubrica em rubrica, à natureza da superfície em
que se desenrola. Com o aval do governo Lula e
o despercebimento do STF — Corte constitucional cuja onipresença proativa
tornou fútil o controle de constitucionalidade.
Não importa se afinal reunindo (o veto do presidente posto na pista para negócio) R$ 16 bilhões ou R$ 11 bilhões. Ali, nas emendas de comissão, constituiu-se um fundo eleitoral paralelo; não à toa a carga — e o pacto informal entre Planalto e Parlamento — pela liberação das verbas até junho.
Para que se estime o potencial da cousa, o
fundo eleitoral oficial aprovado terá menos de R$ 5 bilhões.
Desnecessário, doravante, explicar a
importância extraordinária-estratégica de controlar as comissões mais bem
dotadas. Ter poder sobre parte desses recursos é garantir competitividade — e
se blindar contra os adversários. E o adversário do governo na Câmara, hoje,
não é o bolsonarismo de Nikolas Ferreira. É o Lirão dominador do Orçamento.
Foi em função da grana, do acesso aos
dinheiros, que se batalhou a distribuição dos comandos dos colegiados. Esse é o
jogo grande; aquele em que o PL bolsonarista, por robusta e barulhenta que lhe
seja a bancada, não tem lugar.
A comissão de Educação (apenas R$ 180 milhões
para emendas) foi tornada xepa, só por isso ficou com Nikolas Ferreira. O resto
é fita para afetar indignação.
Leu-se por aí variação sobre esta manchete:
“Base tenta conter danos após revés em comissões”. Que base? O governo Lula não
tem a que apregoa. Está aí o União Brasil, uma confederação de patrimonialismos
e outros oportunistas, com seus bivares em guerra, para exemplificar
impossibilidade e inexistência. A base governista — aquela, modesta, com que se
pode contar sempre — sendo composta por parlamentares de PDT, PSB e,
quase sempre, PSOL,
afora os do PT.
E então o “revés” — a eleição de
bolsonaristas para o comando das comissões de Educação e de Constituição e
Justiça — cujos “danos” se tentaria “conter”. Que revés? Um que é produto de
acordo? O governo Lula fez acordo, donde escolha. O PT, segunda maior bancada,
poderia ter pegado a Comissão de Educação — e, pois, não haveria Nikolas
Ferreira. Não quis. (Daí Nikolas Ferreira, o “dano”.)
Preferiu a de Saúde, bilionária em emendas
parlamentares (R$ 4,5 bilhões), para se proteger — para proteger o governo —
contra o Lirão, interessadíssimo na bufunfa e agente pelo enfraquecimento da
ministra da Saúde. Dano e danos. Daninhos e danões. O mundo real que se impõe.
Esse é o jogo grande, em que a Comissão de
Educação se transformou em preocupação menor. A chegada do PL bolsonarista ao
comando de comissão outrora tão cara ao petismo derivando de oportunidade no
vácuo da peleja real. Disputa da qual saíram um Lira menos vitorioso do que
vende a propaganda e um governo menos derrotado do que pretenderia o “revés”. O
PL bolsonarista a ocupar as brechas — a vitória possível aos ora irrelevantes.
Este é o choque — governo versus Lirão. A
oposição, a que se exerce materialmente via controle de fundos orçamentários,
com que o Planalto se preocupa. O resto, nas sobras, sendo onda, que faz volume
e desvia as atenções: “Partidos da base governista estão montando tropa de
choque para tentar conter possíveis iniciativas da ala mais radical do PL”.
Partidos da base governista armam tropa de
choque para dividir o protagonismo instagramável numa comissão de cujo comando
o governo abriu mão. Bom para todos os envolvidos, “base” incluída. Muito
barulho. Muita produção de vídeos curtos para as redes. Muito engajamento.
Muita espuma — a espuma da resistência — para tapar a realidade que José
Guimarães, líder do PT, expõe:
— Tem compromisso do líder [do PL] Altineu
Côrtes de não criar nenhuma dificuldade nas políticas que o ministro
Camilo [Santana] está desenvolvendo.
Pode-se desconfiar da capacidade de o PL
bolsonarista criar dificuldades reais — que não a convocação semanal de
ministros ao Parlamento — para o governo. (Questão de competência.) Não se pode
confiar em compromisso de líder de oposição que consista em não tentar fazer
oposição.
O ministro Camilo pagará a conta, chamado ao
palco da lacração. Daninho. O sacrifício, no tablado da segunda divisão, em
troca de dividir o fundo eleitoral paralelo e evitar o danão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário