Valor Econômico
A tragédia do Rio Grande do Sul mudou o rumo
da prosa na “Semana do Brasil” em Nova York. O bicentenário das relações
bilaterais continua como pano de fundo. Os desafios e as principais
oportunidades de negócios entre os dois países permanecem no topo da pauta, por
exemplo, do Summit Valor Econômico Brazil-USA desta quarta-feira (15). Mas o
atendimento emergencial e a reconstrução do Estado permeiam discursos e
conversas de bastidores. Para muitos, é inevitável a comparação com a
catástrofe provocada pelo furacão Katrina em Nova Orleans, em 2005. E o Brasil
deveria dar atenção à experiência dos americanos.
Já é possível dar um ponto positivo para o
Brasil, quanto à articulação federativa que não se deixou prejudicar pela
polarização política.
Em Nova Orleans, o ex-presidente George W. Bush foi bastante contestado pela demora em mobilizar a máquina para cuidar da região. E quando o fez, alegam seus críticos, não teria atendido bem seus adversários políticos locais.
Mas nada disso impediu que sua própria
administração admitisse erros e, mais do que isso, elaborasse um longo estudo
sobre as falhas ocorridas e o que deveria ser aprimorado para que os Estados
Unidos estivessem mais bem preparados para as próximas catástrofes provocadas
pela natureza ou pelo homem.
O relatório produzido pelo “staff” de Bush
está nos arquivos da Casa Branca. A ideia não era apontar culpados, destacam os
autores do texto, mas identificar lacunas sistêmicas e melhorar o preparo do
país. E é justamente por isso que a experiência americana deixa como herança
alguns pontos de atenção que não deveriam ser desprezados pelas autoridades
brasileiras - sobretudo em relação à prevenção e ao cuidado que se deve ter na
utilização dos recursos emergenciais enviados para as áreas atingidas.
Foram listadas 17 lições aprendidas pelo
governo Bush. Elas abrangem desde planejamento de alto nível, por exemplo o uso
integrado de capacidades militares, a questões operacionais, como busca e
resgate. Entre as centenas de recomendações de ações corretivas, foram
apontadas iniciativas de treinamento, exercícios práticos, ações de
desenvolvimento profissional e de educação em segurança interna, além da
preparação de cidadãos e comunidades.
Para as autoridades americanas, ficou
evidente que a gestão eficaz de incidentes de eventos catastróficos requer
coordenação de uma ampla gama de organizações e atividades, públicas e
privadas. No entanto, apontam elas, no caso em análise também restou claro que
o modelo legal vigente era muito burocrático e acabou limitando o governo
federal a ter um papel de coordenador do envio dos recursos para os locais
necessitados com base nos pedidos de assistência.
O poder central, concluíram os auxiliares do
então presidente americano, não pode e não deve ser o responsável pelo primeiro
atendimento da população afetada por catástrofes. Ainda assim, acrescentam, é
natural que o cidadão exija que ele exerça um papel de protagonismo nos
esforços de atendimento, recuperação e reconstrução. Até porque é a única
esfera de poder com os meios e recursos necessários para levar a tarefa
adiante, em meio ao risco de os gestores locais e estaduais estarem
sobrecarregados ou incapacitados.
Nesse contexto, é fundamental que o país
tenha uma robusta infraestrutura de comunicações. Quando Katrina atingiu a
terra, autoridades locais e estaduais logo entenderam a gravidade da situação.
No entanto, não tinham a capacidade de se comunicar e coordenar uma reação. Na
sequência, socorristas e cidadãos também ficaram sem uma rede confiável.
Nesses momentos, o excesso de burocracia foi
considerado um problema. A logística também demanda atenção: neste caso, a
recomendação foi ter um sistema logístico transparente e implementado em quatro
níveis.
O primeiro nível visa incentivar que os
governos estaduais e locais façam contratos prévios para garantir os recursos e
commodities necessários para responder a todos os riscos de abastecimento. Num
segundo nível, deve haver um processo pré-estabelecido entre os Estados para
ajuda mútua. Se essa rede falhar, o governo federal deve então entrar
rapidamente para atender a unidade da federação em apuros. Mas, acima de tudo,
uma agência federal já deve estar preparada para suplementar de maneira ágil os
elos estaduais e locais que falharem.
Enquanto governadores defendiam em Nova York
que a Casa Civil da Presidência da República assumisse o papel de coordenar os
esforços empreendidos em todos os níveis, o governo Lula sinalizava a criação
de uma autoridade federal para o Rio Grande do Sul. É preciso ver se essa
pessoa terá os poderes suficientes e, se depois de resolvida a crise no Estado,
não será o caso de já ter alguém apontado para essa função de forma permanente.
É fundamental, contudo, possuir um sistema de
rastreamento dos recursos. Essa é uma das recomendações dos americanos. No caso
do Sul, a expectativa é que o governo federal não realize licitações e passe
essa atribuição para os entes subnacionais. Dessa forma, o Tribunal de Contas
da União (TCU) tampouco deve olhar todas as operações. Essa é uma questão para
se preocupar em um segundo momento, mas já apareceu, aqui e ali, nas conversas
que antecederam o Summit Valor Econômico Brazil-USA.
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