*Antonio Gramsci (1891-1937). Cadernos do Cárcere, 3ª Edição, pp.77-8. Editora Civilização Brasileira, 2007.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
terça-feira, 30 de dezembro de 2025
Opinião do dia – Antonio Gramsci* (circunstância)
O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões
Ganho real do salário mínimo semeia crise futura
Por O Globo
Medida faz crescer a dívida pública, alimenta
a inflação e corrói a confiança no governo
Ao determinar o valor do salário mínimo para
2026, mais uma vez o governo decidiu conceder reajuste de quase 2,5% acima da
inflação, o limite das regras adotadas com base no arcabouço fiscal. O mínimo
irá de R$ 1.518 para R$ 1.621, alta de 6,8%. Será o terceiro ano consecutivo em
que subirá além da inflação. Nos três anos desde que o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva assumiu o governo, terá aumentado 24,5%, ante inflação estimada
em 14,6% no período — ganho real de quase 10%.
A política de aumento real do salário mínimo é celebrada pelo governo como conquista dos mais pobres. Ela tem sem dúvida impacto na renda do estrato social que Lula enxerga como sua base eleitoral — e de cujo apoio precisará em sua tentativa de reeleição no ano que se avizinha. Na economia, contudo, tal política tem três consequências nefastas com que infelizmente as gestões petistas têm se revelado recorrentemente incapazes de lidar.
Onda da direita terá mais dificuldades no Brasil. Por Christopher Garman
Valor Econômico
O presidente Lula entra no pleito com índices
de aprovação mais altos que os de seus pares de esquerda na região
A América Latina está claramente passando por
uma transformação política: candidatos da direita venceram nos últimos anos e
estão bem posicionados para os próximos pleitos. A tendência começou com a
eleição de Javier Milei na Argentina em 2023 e seguiu com as vitórias de
conservadores na Bolívia, no Equador, no Chile e em Honduras em 2025. Em 2026,
candidatos da direita têm boas chances de vencer na Colômbia, na Costa Rica e
no Peru. Após uma onda eleitoral que elegeu várias lideranças de esquerda há
cerca de quatro anos, o mapa político da região está claramente em
transformação.
No Brasil, a direita certamente entrará em 2026 competitiva — em parte, pelas mesmas razões que têm rendido vitórias aos conservadores. Mas a situação do Brasil difere da de seus vizinhos por uma simples razão: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva entra no pleito com índices de aprovação mais altos que os de seus pares de esquerda na região — fazendo dele um leve favorito e abrindo a possibilidade de que o Brasil contrarie essa tendência regional.
Master exibe viela de Lula entre STF e Congresso. Por Maria Cristina Fernandes
Valor Econômico
Caso exibe a ocupação, pelo STF e pelo
Congresso, do vazio deixado por Lula na arbitragem dos negócios da República
Cinco meses antes da cópia de um contrato
entre o escritório de Viviane Barci de Moraes e o Master aparecer no celular do
dono do banco, Daniel Vorcaro, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento
de uma ação que derrubou dispositivo do Código de Processo Penal vedando a participação
de juiz em processo de escritório em que atuem seus parentes. A ausência de
debates na turma ou no plenário, além de celeridade, costuma revestir esses
julgamentos virtuais de discrição. Revisitar seus votos revela o carimbo dos
negócios da República às vésperas de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
iniciar o último ano de seu terceiro mandato.
A questão foi suscitada pela Associação dos Magistrados Brasileiros em 2018, três anos depois da aprovação do CPC. De avessos ao corporativismo da AMB, que chegou a acionar o STF contra a criação do CNJ, os ministros passaram, majoritariamente, a convergir com suas pautas. Foi a AMB também quem acionou o STF, ao lado do Solidariedade, contra o impeachment no STF.
Os deuses estão loucos. Por Merval Pereira
O Globo
Os “deuses” do Olimpo jurídico manobram para
que ninguém, ou nenhuma instituição, possa limitar seus poderes.
A maior prova de que a acareação marcada pelo
ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli sobre o caso Master
estava tecnicamente errada e era injustificada foi o presidente do banco,
Daniel Vorcaro, e o ex-presidente do Banco Regional de Brasília Paulo Henrique
Costa, o pretenso comprador, terem sido convocados para um interrogatório que
não estava previsto. Continuamos assistindo a um simulacro processual, pois,
antes mesmo dos depoimentos oficiais dos envolvidos, pressupõe-se que haverá
contradições, justificando a acareação.
Todo o atropelo do processo, desde o momento em que foi transferido ao STF sem razão de ser, dá a impressão à sociedade de que querem acobertar alguma coisa. Não é a primeira vez que o dono de um banco liquidado pelo Banco Central (BC) reclama, alegando prejuízos provocados pela ação saneadora da instituição fiscalizadora do sistema financeiro nacional. A diferença hoje é que o Supremo entrou na briga, aparentemente a favor de Vorcaro, embora o BC tenha se livrado da subordinação aos demais Poderes e seja autônomo legalmente.
STF corre risco com o caso do Banco Master. Por Fernando Gabeira
O Globo
O que aconteceria se os fatos de agora
levassem à desmoralização da Justiça, principalmente do Supremo?
Essa história do Banco Master e do STF
atravessará o ano. Posso deixar de lado os detalhes e me concentrar agora num
tema mais abstrato. Olhando para trás, constato que a Operação Lava-Jato
desmoralizou a política e contribuiu para a ascensão de uma proposta radical de
direita. O que aconteceria se os fatos de agora levassem à desmoralização da
Justiça, principalmente do Supremo?
Imagino que estejam preocupados com isso alguns dos milhares que pedem um código de conduta para o STF. A partir de um conjunto de regras claras ficaria mais difícil transgredir e estaria construída, mesmo independentemente delas, uma forte blindagem para um organismo que dá a última palavra em todas as nossas questões.
A jornalista e o ministro. Por Pedro Doria
O Globo
Uma das perguntas que mais tenho ouvido de
amigos e familiares, nestes dias de Festas, é: "Qual o objetivo?".
Querem entender o que deseja a imprensa
quando traz notícias de que o ministro Alexandre de Moraes pode ter pressionado
o Banco Central em favor do Banco Master. A resposta não é complicada. O que a
imprensa quer é trazer ao público aquilo que circula nos corredores do poder.
Embutida nessa pergunta — “qual o objetivo?” — existe a presunção de que estamos a serviço de um lado na briga política. Não é isso que nos dá gana um dia após o outro. Francamente, o tesão no trabalho está em ser o primeiro a trazer algo a público. Ao público. O barato está em conseguir explicar com mais clareza como o Brasil funciona, ou o mundo. Em ser útil — e ser lido por ser útil. Pelo ângulo pessoal, essa é a motivação de cada um de nós. Mas, na engrenagem da democracia, a imprensa cumpre um papel fundamental. Ela não julga, não condena. Alerta. Revela à sociedade aquilo que quem tem poder deseja manter em segredo. O jornalismo existe para ligar a sirene e apontar: tem problema ali. É preciso investigar formalmente.
Confusões Master de Dias Toffoli. Por Míriam Leitão
O Globo
Ministro começa a recuar da acareação,
anunciando que convocados darão depoimento. Mas continua tratando da mesma forma
investigados e fiscalizador
A acareação marcada para esta terça no STF sobre o Banco Master é tão imprópria que o próprio ministro Dias Toffoli começou ontem a mudar o formato e decidiu colher depoimentos prévios dos convocados. Toffoli disse, em nota no sábado, que nem o Banco Central, nem o diretor de fiscalização são investigados. Era só mesmo o que faltava. Mas se não o são, por que o diretor do Banco Central Ailton de Aquino será ouvido por uma autoridade policial, segundo a nota do ministro? A polícia só tem autoridade sobre aquilo que é criminal. O rito do devido processo legal está sendo flagrantemente ferido.
Bem mais do que constrangedor. Por Eliane Cantanhêde
O Estado de S. Paulo
Sensação de que Supremo vive numa bolha do
‘vale tudo’, como se salvar a democracia justificasse qualquer coisa e
contrariando a máxima de ‘ninguém está acima da lei’
Do céu ao inferno em um ano, o Supremo Tribunal Federal atravessou 2025 como o salvador da Pátria e das instituições ao condenar um ex-presidente e oficiais de quatro estrelas por tentativa de golpe de Estado, mas morreu na praia, antes do Ano Novo, afogado em suspeitas éticas graves e relações nada republicanas envolvendo o Banco Master.
O vagalhão atingiu em cheio o ícone da defesa da democracia, ministro Alexandre de Moraes, que frequentava jantares na mansão de Daniel Vorcaro e fazia gestões insistentes e não bem explicadas junto a Gabriel Galípolo, do Banco Central, enquanto o escritório de advocacia de sua mulher mantinha um contrato milionário com o Master.
Os nossos heróis dão trabalho. Por Carlos Andreazza
O Estado de S. Paulo
Deveria ser agente perturbador nacional a percepção de que poucos ministros do Supremo estão hoje aptos – como juízes, sob a República, se houvesse uma – a tratar de qualquer questão relativa ao Master. Não me refiro à aptidão formal, decidida por eles mesmos. Podem tudo, como se mede pelas licenças que se dão, palestrantes em eventos patrocinados pelo banco, dublês de juízes e empreendedores, cujos parentes advogam livremente no tribunal em que tomam decisões monocráticas.
Falo do que lhes dá credibilidade. Credibilidade impossível, se um, futuro relator, voa em jatinho com advogado de sujeito implicado na fraude; se o outro, salvador da pátria, frequenta a mansão do banqueiro fraudador; e se a esposa do salvador da pátria tem contrato milionário com o banco do banqueiro fraudador.
Livrar Vorcaro do risco de prisão e da delação é o sonho de políticos e pode ser objetivo da defesa. Por Alvaro Gribel
O Estado de S. Paulo
Estratégia pode ser questionar acusação de
fraude pelo BC e alegar que houve apenas gestão temerária no Master
Muito mais do que tentar reverter a
liquidação do Banco Master, o grande objetivo da
defesa do banqueiro Daniel Vorcaro pode ser livrá-lo
do risco de prisão. Esse cenário também agradaria ao mundo político, porque
implicaria reduzir a praticamente zero o risco de o banqueiro fazer uma delação premiada que
exponha figuras autoridades do primeiro escalão de Brasília.
Por isso, o depoimento e a provável acareação marcada para esta terça-feira devem ser usados pela defesa de Vorcaro para contestar a alegação do Banco Central de que houve fraude no banco. É a constatação pelo BC de que houve gestão fraudulenta por parte de Vorcaro no Master que o levou à prisão. Esse crime é mais grave do que seria a gestão “temerária”, que também ocorre em casos de liquidação bancária, - ou seja, quando um gestor comete erros, mas não crimes, na condução do negócio.
Vulgaridade com dinheiro público. Por Jorge J. Okubaro
O Estado de S. Paulo
O que se espera é que, em 2026, a livre
escolha dos brasileiros resulte numa representação parlamentar mais preocupada
com o País
A gestão do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) na presidência da Câmara dos Deputados está sendo tão desastrosa que o principal responsável por sua eleição para o cargo (e seu antecessor), deputado Arthur Lira (PP-AL), registrou há dias: “Tem que reorganizar a Casa. Está uma esculhambação”. Ambos merecem a vulgaridade da expressão. Agem na política do modo vulgar com que usam o idioma. Aos dois deveria ser acrescentado o nome de Eduardo Cunha, atualmente filiado ao mesmo partido de Motta.
Algo mais os une. O período em que os três ocuparam a presidência da Câmara dos Deputados – Cunha (2015-2016), Lira (2021-2025) e Motta (atualmente) – foi marcado por sistemática redução da racionalidade do processo orçamentário, com a expansão das emendas parlamentares. Normalizada nas práticas do Legislativo, a vulgaridade das decisões do Congresso sobre o Orçamento da União assumiu proporções que ameaçam comprometer programas de governo. As emendas tornaram-se instrumento de pressão e chantagem política.
Os Deuses que Nietzsche não matou. Por Cláudio Carraly*
"Quem é ateu e viu milagres como eu
Sabe que os deuses sem Deus
Não cessam de brotar, nem cansam de esperar"
— Caetano Veloso, Milagres do Povo
Há coisas que, à primeira vista, não deveriam
coexistir. Marxista e crente. Materialista histórico e pessoa de fé. Militante
comunista desde os 14 anos e alguém que sempre acreditou que o mundo guarda
mistérios que escapam ao olhar. O mundo esperava, às vezes exigia que eu
escolhesse um lado. Ateu, agnóstico, no mínimo um antirreligioso. Era o roteiro
esperado de quem carregava Marx no peito desde tão cedo. Mas a vida não lê
roteiros.
Cresci em uma família kardecista, uma das mais antigas a professar essa fé em Pernambuco. Fui criado também pela mão firme e doce de uma incrível mulher da umbanda. Essas presenças não eram ornamentos da infância, eram universos. Eram modos de sentir, de intuir, de perceber que existe algo além do que as estruturas materiais conseguem me explicar. Não contra elas. Mas além. Um pouco além. Muito mais além.
Em 2026, a imprensa seguirá sob ataque. Por Joel Pinheiro da Fonseca
Folha de S. Paulo
No auge da revolta, tenhamos a sabedoria de
não culpar o mensageiro
A mesma imprensa que no governo Bolsonaro era
acusada de petista agora é pintada como aliada do ex-presidente
"Ninguém gosta do mensageiro que traz
notícias ruins", diz a famosa citação da "Antígona" de Sófocles.
Quem continua a trazer "notícias ruins" para todos os lados da
disputa política brasileira é a imprensa. Em 2026, ela continuará necessária
como sempre e atacada como nunca.
As reações de parte da esquerda à cobertura da imprensa sobre as possíveis
relações entre Banco Master e
ministros do Supremo tem seguido o roteiro que já conhecemos bem desde a Lava
Jato: especular sobre as intenções da própria imprensa e da jornalista, e não
sobre o teor do que tem sido noticiado. A lógica é: se a notícia é ruim para o
meu lado, então ela é falsa. O mensageiro é mau.
Profecias eleitorais não resistem à realidade. Por Dora Kramer
Folha de S. Paulo
Os anos de eleição começam cheios de
previsões, quase sempre desmentidas pelo inesperado dos fatos
As surpresas acompanham nossas disputas
presidenciais desde a primeira delas na nova era democrática
Ano eleitoral é sempre cheio de prognósticos,
assim como será o de 2026 prestes a começar. Previsões quase sempre desmentidas
pelos fatos, carrascos da reputação de adivinhos.
Alguns desses desmentidos acompanham as
eleições presidenciais desde a primeira da nova era democrática.
Quem, em janeiro de 1989, cravaria que em
dezembro a batalha
final seria travada entre dois novatos no meio de duas dezenas de candidatos
experientes tanto nas lides da ditadura quanto na trincheira de oposição ao
regime?
Fernando Collor (PRN) bateu Luiz Inácio Lula da Silva (PT), deixando no ora veja gente como Ulysses Guimarães (PMDB), Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS), Leonel Brizola (PDT) e mais 16 outros concorrentes.
Eduardo Paes joga parado para ganhar a partida. Por Alvaro Costa e Silva
Folha de S. Paulo
Apostas eleitorais da direita e da extrema
direita não conseguem se firmar
Escândalos de corrupção e favorecimento ao
crime organizado sepultam candidaturas
"Cai o rei de espadas/ Cai o rei de
ouros/ Cai o rei de paus/ Cai, não fica nada". Os versos da canção
"Cartomante", de Vitor Martins e Ivan Lins, sucesso
na voz de Elis Regina, descrevem a crise política em que o Rio de
Janeiro está mergulhado, com a elite do Executivo e do Legislativo
envolvida em escândalos de corrupção e favorecimento
ao crime organizado.
Direita e extrema direita andam perdidas no lamaçal, sem saber como se posicionar para as eleições de 2026. Os possíveis candidatos ao governo e ao Senado estão caindo como moscas, com risco de não ficar ninguém com expressão na disputa.
Uma questão de ego. Por Hélio Schwartsman
Folha de S. Paulo
Com Trump, ego presidencial é tão decisivo
quanto interesses do país para definir política externa dos EUA
Ações do novo inquilino da Casa Branca já
fizeram ordem internacional regredir mais de um século
O problema de os EUA terem se tornado uma
republiqueta é que ficou mais difícil prever como a principal potência
econômica e militar do planeta se comportará no plano internacional.
Até não muito tempo atrás, presidentes americanos perseguiam aquilo que identificavam como interesses do país, que eram mais ou menos conhecidos. Com Trump 2, o jogo mudou. Hoje, um dos principais fatores a determinar a política externa dos EUA é o ego do presidente, que é volúvel e caprichoso.
Por um 2026 melhor. Por Ivan Alves Filho*
Mais atual, impossível.
segunda-feira, 29 de dezembro de 2025
Opinião do dia – Eric Hobsbawm* (Importância da política)
Eric
Hobsbawm (1917-2012), “Como Mudar o Mundo”, p. 300 – Companhia das Letras, 2011
O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões
Alienação parental exige debate com menos ideologia
Por O Globo
Decisão da CCJ da Câmara que revoga lei
poderá criar vazio jurídico. Senadores deveriam corrigir falhas
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)
da Câmara aprovou antes do recesso parlamentar a extinção da Lei de Alienação
Parental de modo conclusivo, que prescinde da discussão em plenário. É
essencial que o Senado se debruce com mais vagar sobre o tema e promova uma
ampla discussão em busca de um ponto de equilíbrio entre a extinção, como quer
a Câmara, ou a manutenção da situação atual.
O termo “alienação parental” resume as condutas e posturas de casais em separação litigiosa, ou de suas famílias, que usam os filhos para atingir o outro lado no conflito. Entre as práticas condenáveis classificadas pela lei estão: dificultar o contato da criança ou adolescente com pai ou mãe; mudar de endereço sem informar ao outro responsável; criar narrativas falsas para desqualificá-lo; impedir ou dificultar o acesso a informações sobre saúde, escola e outras atividades.
2025: Democracia mostra resiliência em meio à fricção entre Poderes. Por Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense
Tentativa de golpe de 8 de
janeiro de 2023 não prosperou porque não houve adesão do Congresso, chancela do
Judiciário e apoio das Forças Armadas, apesar dos atritos entre Executivo,
Legislativo e Judiciário
Sem grandes ilusões, o Brasil irá às urnas em
2026, provavelmente polarizado entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
com sua “economia do afeto”, como diria o historiador Alberto Aggio (A
Construção da Democracia no Brasil 1985-2025, editora Annablume e Fundação
Astrojildo Pereira-FAP), e o candidato apoiado pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro, que está convalescendo de uma cirurgia e deve voltar a cumprir pena
em regime fechado.
Segundo as pesquisas, a maioria dos eleitores
está com cansaço, desconfiança e tédio, mas não deixará de votar. Isso não é
pouco: a democracia brasileira hoje não promete felicidade cívica, promete
apenas evitar o pior pelo simples fato de que existe. Essa polarização parece
inexorável, mesmo que as forças de centro-direita consigam remover a
candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e/ou lançar um candidato de
direita que empolgue os eleitores.
Talvez seja pouco para entusiasmar; no mundo em que vivemos, porém, é muito para preservar. Diante desse cenário, nos resta compreender melhor como foi que chegamos até aqui. O ano de 2025 nos deixa em estado de perplexidade. De um lado, o regime democrático não colapsou, graças à Constituição de 1988, apesar de ter sido submetido a choques sucessivos que, em outros momentos de nossa história, teriam resultado em golpes de Estado. De outro, há evidente mal-estar social, fadiga eleitoral e descrença na política como espaço de participação da sociedade e solução dos problemas do país.
Pessoas que respeitam e que corrompem instituições. Por Bruno Carazza
Valor Econômico
Caso do Banco Master confirma que
instituições não são suficientes para preservar a democracia e evitar a
corrupção
Muitos atribuem à força das nossas
instituições a razão por que a democracia brasileira sobreviveu diante da
tentativa de golpe bolsonarista. Segundo essa interpretação, a postura firme do
Supremo Tribunal Federal na reação ao 8 de janeiro e a decisão das Forças
Armadas de não embarcarem na aventura golpista foram fundamentais para o
malogro da séria ameaça autocrática que sofremos.
Quem discorda dessa tese aponta que o desfecho da história seria completamente diferente se Alexandre de Moraes não estivesse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral, ou se o general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Júnior tivessem aderido aos planos de Bolsonaro tal qual seu colega, o almirante Almir Garnier Santos.
Proteção frágil ao BC ameaça a estabilidade. Por Alex Ribeiro
Valor Econômico
Quando as autoridades tergiversam por medo de
serem responsabilizadas, as consequências podem ser sérias
O Banco Central não está acima da lei nem isento de prestar contas de seus atos. Mas as recentes iniciativas do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU) para apurar o caso do Banco Master, da forma como estão sendo executadas, enfraquecem a autonomia da instituição e deixam o país mais vulnerável a crises bancárias.
Os princípios de supervisão de Basileia, um
acordo internacional que visa assegurar a estabilidade financeira em todo o
mundo, recomendam expressamente que os reguladores e fiscais bancários tenham
proteção legal para evitar que deixem de tomar as decisões necessárias por medo
de sofrer sanções.
A prescrição é clara: os supervisores só devem responder por suas ações nos casos em que agem com dolo ou má-fé. Não devem se sujeitar a punições quando o Judiciário ou órgãos de controle externo consideram que houve algum erro, seja por imperícia técnica ou por negligência.
Juízes afastados, no Chile. Por Carlos Alberto Sardenberg
O Globo
Em dois casos, eles foram destituídos pelo
Senado. No terceiro, por seus próprios colegas de tribunal
Três ministros da Suprema Corte do Chile
foram afastados de seus cargos no curto período entre outubro do ano passado e
dezembro último. Em dois casos, os juízes foram destituídos pelo Senado. No
terceiro caso, a magistrada Angela Vivanco foi afastada pelos seus próprios
colegas de tribunal. As penalidades foram as mesmas: perda do cargo e
inabilitação de cinco anos para exercício de qualquer cargo público.
Os casos foram diferentes, mas com vários pontos de contato. Os parâmetros que se formaram ao longo dos processos ficaram claros: para afastar um magistrado não é necessário provar que ele praticou corrupção (vendendo sentenças, por exemplo), nem que tomou decisões com o objetivo explícito de favorecer parentes ou amigos. Basta a aparência de parcialidade, além da existência de relações familiares ou pessoais impróprias.
São Paulo de mil buracos. Por Miguel de Almeida
O Globo
A degradação urbana não é inevitável, é uma
escolha. A cidade ainda é uma grande ideia do homem, mas, sendo invenção
humana, vem permeada por seu gênio e por seus demônios
O poeta francês Charles Baudelaire desenvolve
o conceito de modernidade a partir das ruas parisienses do século XIX. Ele a
pensava como fusão entre o eterno e o transitório, entre o clássico e o fugaz.
A rapidez das ferrovias, a percepção de proximidade entre as capitais europeias
e os bulevares rasgados pelo Barão Haussmann — tudo isso configura a Paris da
modernidade. É quando surge o flâneur, aquele que vaga com o olhar vadio e
curioso pelas coisas urbanas.
Na contemporaneidade, esse personagem morreu. Na São Paulo do século XXI, quem tenta flanar precisa esconder o celular dos trombadinhas, desviar dos buracos da calçada e fugir de ciclistas que invadem o passeio. Não há olhar vadio possível — apenas olhar vigilante.
O Brasil da Esperança. Por Irapuã Santana O Globo
O Globo
Enquanto o poder se isola, pessoas comuns
usam o brilho da inteligência para resolver o que o Estado ignora
Nos últimos anos, as notícias têm jogado na
nossa frente um Brasil de privilégios, em que alguns são mais iguais que os
outros. São casos que mostram a completa ausência de ética, moralidade e
vergonha por parte de nossas autoridades, de todos os espectros políticos,
revelando que a República, de fato, nunca existiu no país. Mas nossa nação não
é feita apenas disso. Na verdade, nosso povo é feito de luta e solidariedade, e
o dia a dia do Brasil profundo, aquele real, mostra isso.
É nesse Brasil real, longe dos gabinetes de Brasília e dos privilégios de castas, que a verdadeira inovação e a decência florescem. Enquanto o poder se isola, pessoas comuns usam o brilho da inteligência para resolver o que o Estado ignora.
Riscos extremos em 2026. Por Diogo Schelp
O Estado de S. Paulo
Grupos trabalham para próxima eleição repetir
o clima de polarização extrema e, mais uma vez, sufocar o espaço do centro
político
O ano que se aproxima promete ser decisivo para algumas apostas arriscadas na política. No Brasil, existe um esforço evidente, à esquerda e à direita, para recriar o clima de polarização extrema que definiu a eleição presidencial de 2022 e desaguou nos eventos de aspiração golpista após a vitória de Lula. O que se quer, para o pleito de 2026, é mais uma vez sufocar o espaço do centro político.
A soberania do povo. Por Denis Lerrer Rosenfield
O Estado de S. Paulo
Se a questão venezuelana chegou ao ponto em que está, isso se deve à própria esquerda, que reconhece em Maduro um líder revolucionário e é conivente com a repressão
O cerco do governo Trump à ditadura de Nicolás Maduro, devendo-se tratar o dito presidente como tirano que é, tem suscitado questões relativas à soberania da Venezuela diante da ameaça de uma potência estrangeira. É como se os problemas desse país se reduzissem a ações intempestivas do presidente Trump, aproveitando-se a esquerda para se arvorar em defensora de um “povo” prestes a ser invadido, algo que caberia num esquema conceitual mecânico de uma esquerda pobre de conceitos. Procura-se passar para baixo do tapete, uma mera sujeira a ser escondida, a brutal repressão do verdadeiro povo venezuelano, submetido à tortura, à fome, à ausência total de liberdades e à violência de um governo revolucionário.
Retrospectiva política 2025. Por Lara Mesquita
Folha de S. Paulo
Chegamos ao final do ano em um cenário
ambíguo após reviravoltas
Verão será de intensas articulações políticas
para a definição das candidaturas nas eleições de 2026
O ano de 2025 foi de reviravoltas políticas
no Brasil. Chegou-se a decretar o fim do governo Lula nos
primeiros meses; com o tarifaço e
a queda
no custo dos alimentos, a popularidade
do presidente voltou a crescer em meados do ano. Chegamos ao final do
ano em um cenário mais ambíguo.
Por um lado, o anúncio da candidatura de Flávio Bolsonaro e a provável retirada do governador de São Paulo da corrida presidencial em 2026 foram vistos como um bom presságio para Lula. Por outro, a aprovação do Orçamento de 2026, com a obrigação de execução de grande parte das emendas no primeiro semestre, e a confirmação de que as derrubadas de vetos presidenciais atingiram patamares históricos pintam um cenário de maior dificuldade para o presidente no último ano de governo.
Saldo positivo. Por Ana Cristina Rosa
Folha de S. Paulo
Fortalecimento do sistema democrático implica
a defesa dos interesses do povo, o que faz da democracia algo incompatível com
o racismo
Neste ano, o STF reconheceu que existe uma
violação sistemática dos direitos fundamentais da população negra no Brasil
Para um ano que começou com um prefeito reeleito democraticamente discursando em favor da "liberdade de expressão em defesa da ditadura militar" durante a posse, 2025 termina com saldo positivo em termos de defesa da democracia no Brasil. A resposta tenaz à "Intentona Bolsonarista" –com a condenação à prisão de 29 dos 31 acusados na trama golpista– demonstra prevalência do respeito à Constituição.
Como explicar crença nos Bolsonaro, vistos como burros? Por Bernardo Carvalho
Folha de S. Paulo
Trabalho de campo em seita de lunáticos, que
deu origem ao conceito de dissonância cognitiva, teve série de falhas
Apesar da circularidade, a teoria ainda ajuda
a explicar o comportamento suicida de quem crê que nunca perde
Leio no site da revista The New Yorker que já não é
possível explicar o bolsonarismo (ou qualquer outra aberração lógica) pela
teoria da dissonância cognitiva, conceito-chave da psicologia social dos anos
1950 e que desde então tem servido para explicar quase tudo o que parece
incompreensível no comportamento humano.
O conceito foi afinado com base na pesquisa sobre uma seita de lunáticos que acreditavam em discos voadores. A recente divulgação do arquivo pessoal de um dos três autores do estudo de 1956, Leon Festinger, revelou entretanto que suas conclusões estavam contaminadas por uma série de falhas e inconsistências do trabalho de campo.
domingo, 28 de dezembro de 2025
Opinião do dia – Keynes*
“Dei a minha teoria o nome de teoria geral.
Com isso quero dizer que estou preocupado principalmente com o comportamento do
sistema econômico como um todo - com a renda global, com o lucro global, com o
volume global da produção, com o nível global de emprego, com o investimento
global e com a poupança global, em vez de com a renda, o lucro, o volume da
produção, o nível do emprego, o investimento e a poupança de ramos da
indústria, firmas ou indivíduos em particular. E afirmo que foram cometidos
erros importantes ao se estender para o sistema como um todo as conclusões a
que se tinha chegado de forma correta com relação a uma parte desse sistema
tomada isoladamente.
Acredito que economia em toda parte, até
recentemente, tinha sido dominada, muito mais do que compreendida, pelas
doutrinas associadas ao nome de J.B. Say. É verdade que a “lei dos
mercados” dele já foi abandonada há tempo pela maioria dos economistas,
mas eles não se livraram de seus postulados básicos, particularmente de sua
ideia errônea de que a demanda é criada pela oferta. Say estava supondo
implicitamente que o sistema econômico está sempre operando com sua capacidade
máxima, de forma que uma atividade nova apareceria sempre em substituição e não
em suplementação a alguma outra atividade. Quase toda a teoria econômica
subsequente tem defendido, no sentido de que ela tem exigido, esse mesmo
pressuposto. No entanto, uma teoria com essa base é claramente incompetente
para enfrentar os problemas do desemprego e do ciclo econômico. Talvez eu possa
exprimir melhor a meus leitores franceses o que apregoo sobre este livro
dizendo que na teoria da produção ele é uma ruptura radical com as doutrinas de
J. B. Say e que na teoria dos juros ele é um retorno às doutrinas de
Montesquieu.”
*John Maynard Keynes (1883-1946). A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, - Prefácio à Edição Francesa, p. 10-1. Nova Cultura, S. Paulo, 1985.
O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões
Partidos são porta para infiltração do crime na política
Por O Globo
Caso TH Joias expôs contaminação profunda das
instituições. Legendas têm papel vital para combatê-la
Ao comparecer à CPI do Crime Organizado, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, relatou ter apelado aos presidentes de partidos para fazer uma “triagem” que evite, nas eleições do ano que vem, candidaturas ligadas a organizações criminosas. É sem dúvida uma iniciativa correta, mas é triste que o Brasil tenha chegado a ponto de isso ser necessário. O avanço alarmante da criminalidade já há algum tempo dá sinais de infiltração na economia formal e nas instituições da República. A porta de entrada na vida pública são os partidos, e é por meio deles que a contaminação avança pela política. Detê-la é urgente.
As palavras e as coisas. Por Luiz Sérgio Henriques
O Estado de S. Paulo
A paixão desmedida, desregrada mesmo, é a que hoje move tiranos, ou aspirantes a tirano, a destruir conquistas civilizatórias essenciais
Não é simples passatempo a atenção que dispensamos às tais “palavras do ano” escolhidas por tradicionais publicações e instituições lexicográficas. E não é por acaso, pois as palavras nos moldam como sujeitos, estruturam nossa percepção do mundo, das pessoas e das coisas. Vagando tantas vezes pelas redes, sentimos o efeito das rage baits, as “iscas” que provocam uma raiva impotente. Sofremos o impacto do slop, o lixo digital que escorre com o furor das tempestades. Suportamos a carga negativa de imaginárias parasocial interactions, em que o interlocutor não é um ser corpóreo, real, e sim uma celebridade que nos ignora por completo ou mesmo um agente virtual qualquer.
O lirismo cult de ‘O que será?’ e a esperança que renasce a cada ano-novo Por Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense
A canção descreve algo que
move a vida e vem do corpo, do desejo, da folia e da angústia, presente em
todos os lugares: do sagrado ao profano, do íntimo ao coletivo
Um dos momentos mais sublimes da cultura brasileira foi a gravação ao vivo de O que será? (À flor da pele) por Milton Nascimento e Chico Buarque, no programa Chico & Caetano, exibido em 14 de março de 1987. O encontro histórico cristalizou um instante raro da música brasileira: dois artistas em sintonia plena, interpretando a canção lançada no álbum Meus caros amigos. A abertura vocal profunda e comovente do artista, que Elis Regina resumiu na frase “Se Deus cantasse, seria com a voz do Milton”, e o olhar marejado de Chico ao iniciar o dueto compõem uma cena antológica, dessas que eternizam os artistas e suas obras.















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