Folha de S. Paulo
Esfriamento previsto da economia e má imagem
do governo ajudam a mudar clima na finança
De janeiro para fevereiro, o clima mudou.
Mudou pelo menos na finança. Não foi da água para o vinho, mas para chá de
camomila, até porque, nas expectativas ou nas esperanças de parte da elite, a
imagem de Luiz Inácio Lula da Silva
foi para o vinagre e por lá ficaria.
O
dólar vale menos do que R$ 5,70. Um dia antes de Fernando
Haddad anunciar o pacote fiscal, custava R$ 5,81. Devolveu, pois, mais
do que o exagero do pânico de dezembro, quando chegou ao pico de R$ 6,27. Na
mediana da previsão de "o mercado", ficaria em R$ 6 no final deste
2025.
As taxas de juros de dois a cinco anos no mercado de dinheiro caíram em torno de 0,8 ponto percentual, de mais de 15% ao ano para perto de 14%. É relevante. O que houve, segundo administradores do dinheiro grosso e porta-vozes mais qualificados?
Um: aqui e alhures, foram desmontadas
operações financeiras baseada na hipótese de fortalecimento do dólar, que
ficaria mais forte por causa de alta agressiva das "tarifas" de Donald Trump etc.
"Robôs" que animavam alta ainda maior do dólar, surfando nessa
expectativa, agora operam ao contrário.
Dois: a diferença grande das taxas de juros
no Brasil em relação às do mundo rico passou a atrair dinheiro, embora até
dezembro "o mercado" dissesse que não seria assim, por causa "do
fiscal". "O fiscal", que de fato deixou marcas em inflação,
dólar e juros em 2024, por ora está varrido para baixo do tapete.
O preço de banana de ações e títulos de
dívida animam também esse movimento. Por falar nisso, nesta terça, o
Tesouro Nacional fez grandes "captações", com sucesso em termos de
interesse dos endinheirados e taxas.
"Captação": venda de títulos de
dívida, empréstimos, tanto em reais quanto em dólar —o Tesouro fez a primeira
captação externa do ano.
Três: ficou mais forte a impressão de que
o Banco
Central não levará a Selic para alturas ainda mais sufocantes, além de
15,50%. Por quê?
Quatro: porque a desaceleração da economia teria
começado. Haveria contração do PIB no segundo semestre. Não quer dizer que a
desaceleração, menos ainda apenas indícios determinaria o futuro da Selic, mas
o BC pisaria no freio com cuidado.
Cinco: parece maior a possibilidade de
derrota do governo em 2026.
Para quem tem dinheiro ou lida com ele, é
isso que as nuvens políticas e financeiras parecem dizer. Nessa especulação,
parece difícil que Lula recupere seu prestígio, dadas a desaceleração, a
ligeira piora no emprego e a inflação
persistente em 2025.
Os
indícios de desaceleração são poucos: quedas de indústria, serviços e
comércio no final de 2024; baixa da confiança de consumidor e empresas em
janeiro; bancos prevendo crescimento menor do crédito; juros básicos em níveis
recordes.
Haverá um cabo de guerra. O governo quer a
isenção do IR, o Gás para Todos, o consignado para dezenas de milhões, pagar o
Pé-de-Meia etc. O efeito político das medidas é incerto, dada a má vontade com
Lula, mas não parece de se jogar fora. Pode ser que um Congresso mais indócil e
ainda mais desligado do destino do governo barre projetos que favoreçam o
presidente. Enfim, se houver exagero no crédito ou no gasto, o tiro sairá pela
culatra.
É bom lembrar que o ano mal começa, que Jair
Bolsonaro deve ser condenado e que Trump está solto. Águas vão rolar, muito
além do Carnaval. Mas o clima mudou neste terço final de verão.
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