O Estado de S. Paulo
Congresso e Supremo Tribunal Federal firmaram
uma trégua natalina. Tem jeito de acordão
Se tem jeito de acordão, cor de acordão e cheiro de acordão, só pode ser acordão. A dúvida é saber quanto dura a “distensão” entre os Poderes. A sensação é a de que todos se assustaram com o tamanho do abismo.
O dá lá toma cá consistiu basicamente no Congresso isolando a franja radical bolsonarista e o STF (até aqui) aceitando a tese da dosimetria. Há danos consideráveis para o clã Bolsonaro, especialmente em relação ao filho Eduardo, cuja perda de mandato é bem provável, além da desidratação (no momento) da candidatura presidencial do filho Flávio. Mas o clã só pode culpar a si mesmo pelas derrotas.
Faz parte desse mesmo “acordão” a suspensão
pelo decano do STF de trecho de liminar por ele mesmo proferida, restringindo
processos de impeachment contra integrantes do Supremo. O motivo não podia ser
mais explícito em termos de “acordo” político: a suspensão era “indispensável
para a harmonia entre os Poderes”, escreveu Gilmar Mendes. No extremo lógico do
raciocínio, tinha sido então a liminar que rompera a tal “harmonia” entre os
Poderes.
A relativa pausa naquilo que é, na verdade,
um estado de beligerância aberta entre os Poderes não engana. Existe uma
profunda desconfiança, para se dizer o mínimo, na maneira como o STF encara o
Congresso no atual contexto político envenenado e polarizado. E vice-versa: os
Poderes se enxergam como adversários.
E continuam sendo. O Senado acaba de aprovar
o Marco Temporal, afrontando o Supremo. Onde o ministro Flávio Dino acaba de
marcar o julgamento do primeiro caso de desvio de emendas. Cerca de cem
parlamentares estão na mira do STF pelo mesmo motivo.
O que torna tênue a possibilidade de que
entendimentos como esse “acordão” tenham longa vida são fatores políticos
abrangentes. Do lado do Congresso, o fato de que o Centrão se entende a curto
prazo sobre questões pontuais, como foi a necessidade de isolar a franja
radical bolsonarista. Mas carece, como força política, de uma liderança
razoavelmente centralizada, hierarquizada e capaz de dar sentido a uma ampla
ação coletiva.
Do lado do Supremo, há indícios de
considerável diminuição de seu “espírito de corpo”, com o qual reagiu a
Bolsonaro, por exemplo. Como entender o empenho do atual presidente da Corte em
aprovar um código de conduta ética para seus integrantes, senão como
reconhecimento implícito de que a crise de legitimidade da instituição começa
(ou termina) em boa parte por aí mesmo, pela conduta em público de ministros? É
evidente a sombra projetada pelo escândalo Master.
Na sua essência, a crise institucional é uma
crise de poder. Que permanece insolúvel.

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