segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Ações em período eleitoral expõem o Judiciário e o MP: Editorial | Valor Econômico

Operações policiais deflagradas contra importantes políticos do PSDB e do PT em dias seguidos ressuscitaram na semana passada o debate sobre a atuação política do Ministério Público e do Judiciário em tempos de Lava-Jato. Quando a polícia prendeu o ex-governador do Paraná, Beto Richa, e fez buscas na casa do atual governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja, o assunto já estava quente.

Semanas antes, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, do PT, havia sido denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro às vésperas de ser confirmado como o candidato do PT à Presidência da República. Um de seus principais rivais na disputa, o ex-governador Geraldo Alckmin, do PSDB, foi acusado na mesma época de improbidade administrativa. Richa e Azambuja também vão concorrer nas eleições de outubro, o primeiro ao Senado e o segundo, à reeleição.

Independentemente das motivações, o fato é que as medidas tumultuaram o cenário eleitoral, o que para muita gente não precisava ter acontecido. Inclua-se entre esses o advogado Luiz Fernando Bandeira de Mello, membro do Conselho Nacional do Ministério Público. Na semana passada, ele protocolou na corregedoria do órgão um memorando pedindo apuração de supostas irregularidades nas medidas tomadas pelos procuradores contra os políticos.

O corregedor-geral do conselho, Orlando Rochadel, autorizou a abertura de uma reclamação disciplinar contra os promotores que atuaram nos casos de Haddad, Alckmin e Richa. A reação foi imediata, com vários integrantes do MP alegando uma tentativa de interferência nos trabalhos de investigação e persecução. Antes, qualquer crítica aos excessos se devia, segundo alegavam procuradores, a quem queria acabar com a Lava-Jato. Agora, simplesmente denunciam "mordaça". Tanto antes quanto agora nenhuma voz tomou a frente para dar explicações que possam esclarecer o momento para deflagrar as operações.

Não restam dúvidas de que as ações podem causar prejuízos irreversíveis aos candidatos, especialmente se forem inocentados após a eleição. Alckmin, por exemplo, pediu pressa para o esclarecimento do caso, no qual ele alega não ter cometido nenhum ilícito.

Haddad, por sua vez, disse ter ficado surpreso com o fato de a denúncia só ter aparecido neste momento, considerando que foi baseada em relatos do empresário Ricardo Pessoa, da construtora UTC, que foi preso e virou delator há mais de três anos.

O caso de Richa é ainda mais sério. Além dos prejuízos à sua própria candidatura ao Senado, a prisão caiu como uma bomba no PSDB, que ainda não tinha nenhum integrante de primeiro escalão atrás das grades. É provável que a ação respingue na campanha de Alckmin ao Planalto.

Todos os potenciais efeitos de ações como essas deveriam ser avaliados com cuidado redobrado, não por apreço aos políticos, mas por esmero na observância do processo democrático. Nos Estados Unidos, o órgão similar à Procuradoria-Geral da República adota uma espécie de código de conduta para ser considerado no período eleitoral.

Representantes dos políticos acusados recentemente garantem que as ações já poderiam ter sido levadas a cabo antes das eleições ou deixadas para depois do pleito. Não se trata, obviamente, de proteger qualquer pessoa, mas sim de encarar com toda a seriedade necessária a importância do processo eleitoral em um país que há quase quatro anos está mergulhado na crise.

Os promotores responsáveis alegam que não houve qualquer mudança no timingdas ações, e que o fato de terem acontecido em plena campanha foi mera "coincidência". Verdade ou não, é importante que as devidas apurações sejam feitas para que fiquem demonstradas a imparcialidade e a impessoalidade desejadas, tanto para o MP quanto para o Poder Judiciário.

Não faz muito tempo o Brasil assistiu, em pleno domingo, a um espetáculo deprimente envolvendo um alvará de soltura em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Assinada por um desembargador plantonista com ligação histórica com o PT, a ordem foi interceptada por autoridades que não tinham competência para tal, em um jogo de vai e volta constrangedor para qualquer país que pretenda ser, de fato, levado a sério.

A atuação da Justiça e do MP terá certamente um capítulo de destaque na história recente. Que não seja manchada pela tentativa de influenciar ou de transformar em terra arrasada a atividade política.

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