sábado, 19 de outubro de 2019

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A estirpe e as práticas do PSL – Editorial | O Estado de S. Paulo

Desde o início do mandato, o presidente Jair Bolsonaro não manifestou interesse na formação de uma base de apoio no Legislativo. Agora, corre o risco de não poder contar nem mesmo com o seu partido para dar andamento às reformas no Congresso. O País assistiu nessa semana a verdadeiras batalhas tribais no PSL, que escancararam os piores costumes da chamada velha política. É de aguardar o que restará da legenda depois de tamanha dilaceração em praça pública. Seja como for, a disputa entre membros do PSL deixa claro que suas preocupações não estão alinhadas com o interesse nacional. Toda essa luta fratricida ocorreu a menos de uma semana de o Senado retomar a votação da reforma da Previdência. Esqueceram-se do País?

As divisões no PSL não são propriamente uma novidade. Vem de algum tempo a disputa pelo controle do partido entre o presidente Jair Bolsonaro e o deputado Luciano Bivar (PE), presidente da sigla. O grupo bolsonarista reivindica maior participação nas decisões sobre a distribuição dos recursos, o que inclui o preenchimento de cargos nos diretórios da legenda País afora.

De toda forma, o que ocorreu nesta semana representa substancial rebaixamento do nível de civilidade. Ficou evidente que, de lado a lado, há no PSL gente disposta a usar todos os meios, sem maiores pudores, para derribar os opositores internos. O próprio presidente da República deu mostras de participar dessa disposição.

Jair Bolsonaro comandou a manobra para destituir o líder do PSL na Câmara, deputado Delegado Waldir (GO). Deputados da sigla relataram que foram pressionados pelo presidente a assinar uma lista para tirar Waldir e colocar o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) na liderança da bancada. “Assina, se não é meu inimigo”, relatou ter ouvido de Bolsonaro uma deputada do PSL. Apesar do empenho pessoal do presidente da República, a manobra fracassou e o Delegado Waldir manteve-se na liderança da legenda.

O episódio suscitou a ira do grupo ligado a Luciano Bivar. “Eu vou implodir o presidente”, disse Delegado Waldir, em reunião interna da legenda. “Aí eu mostro a gravação dele. Não tem conversa. Eu implodo ele. Eu sou o cara mais fiel. Acabou, cara. Eu sou o cara mais fiel a esse vagabundo. Eu andei no sol em 246 cidades para defender o nome desse vagabundo”, disse o Delegado Waldir, sem especificar qual seria o conteúdo da mencionada gravação.

Após o vazamento do áudio, o presidente Bolsonaro destituiu a deputada Joice Hasselmann (SP), ligada ao grupo de Bivar, da função de líder do governo no Congresso. Tendo manifestado a intenção de concorrer no ano que vem à Prefeitura de São Paulo, Hasselmann representa atualmente um problema para os planos políticos da família Bolsonaro na capital.

Para agravar a situação, Luciano Bivar planeja destituir os filhos do presidente, Eduardo e Flávio, do comando dos diretórios do PSL de São Paulo e do Rio de Janeiro, respectivamente. Os processos de destituição estavam em andamento ontem à tarde. Faltaria apenas a assinatura de Bivar.

Mesmo depois do fracasso da manobra contra o deputado Delegado Waldir, o Palácio do Planalto não desistiu de trocar a liderança do PSL na Câmara. A ala bolsonarista prepara nova lista com assinaturas de parlamentares para tirar Waldir. Em contrapartida, a cúpula do PSL aumentou ontem o número de filiados com direito a voto em reuniões nacionais da sigla – de 101 para 153 – e suspendeu das atividades partidárias cinco deputados federais ligados a Jair Bolsonaro: Carla Zambelli (SP), Filipe Barros (PR), Bibo Nunes (RS), Alê Silva (MG) e Carlos Jordy (RJ). Com isso, diminuiu o poder da ala ligada a Bolsonaro, tornando ainda mais difícil dar a Eduardo Bolsonaro a liderança da sigla na Câmara. A ver os próximos capítulos.

O ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, amenizou os efeitos da crise do PSL. “Não se trata de um problema de natureza política, que impacta o Legislativo, mas, sim, do problema de um partido”, disse Ramos. Sem base governista e tendo o PSL 53 deputados, toda disputa interna do partido afeta a pauta do governo no Congresso. O que dizer dessa luta fratricida?

A implosão – Editorial | Folha de S. Paulo

Ação desastrada de Bolsonaro acirra briga no PSL e cria riscos para o governo

O aprofundamento da disputa travada por Jair Bolsonaro (PSL) com o grupo que controla seu partido político ofereceu ao país um espetáculo grotesco nesta semana.

No primeiro ato, o presidente tentou desalojar um desafeto da liderança da bancada na Câmara, substituindo-o pelo filho Eduardo Bolsonaro (SP) —o mesmo que até outro dia queria fazer embaixador.

O chefe do Executivo se empenhou pessoalmente em busca de votos, telefonando para fazer apelos a correligionários e ameaçar infiéis. A manobra fracassou, e o deputado Delegado Waldir (GO) se manteve no cargo com o apoio de mais da metade da bancada.

O parlamentar se disse traído pelo presidente e chegou a chamá-lo de vagabundo numa reunião, que um aliado do Planalto gravou escondido. As duas facções rivais passaram então a trocar ofensas em público e iniciaram retaliações.

Bolsonaro destituiu Joice Hasselmann (SP) do posto de líder do governo no Congresso, rompendo com a aliada de primeira hora e trocando-a por um senador do MDB.

Nesta sexta (18), a ala liderada pelo deputado Luciano Bivar (PE) ampliou seu controle sobre o diretório nacional do PSL e tomou medidas contra os bolsonaristas.

A cúpula do partido suspendeu das atividades partidárias cinco deputados alinhados com o presidente e afastou os filhos de Bolsonaro do comando dos diretórios estaduais que eles controlavam.

Em meio à poeira levantada pela refrega, a semana terminou sem sinais convincentes de pacificação das rivalidades internas. Os danos sofridos pelo presidente, no entanto, parecem evidentes.

Há também os riscos que Bolsonaro corre ao mergulhar numa disputa que colocou em jogo o quinhão do PSL nos fundos públicos disponíveis para o financiamento da próxima campanha eleitoral.

Ao trocar farpas com o filho do presidente nesta sexta, Joice Hasselmann chegou a insinuar que desvios ocorridos no passado poderão vir à tona agora.

Sem controle de um partido capaz de organizar uma base de apoio confiável para suas iniciativas no Congresso, Bolsonaro torna-se cada vez mais dependente de siglas tradicionais como o DEM, que hoje comanda a Câmara e o Senado.

Mesmo com espaço reduzido na máquina do governo e tratadas com desprezo pelo presidente desde a campanha eleitoral, essas legendas foram responsáveis pelo principal êxito alcançado pelo governo até agora no Legislativo —o avanço da reforma da Previdência.

Com o presidente alijado do poder dentro do próprio partido, as siglas que dão as cartas no Parlamento tendem a cobrar mais caro na próxima vez em que o Palácio do Planalto precisar de apoio.

Briga de baixo clero ameaça governo – Editorial | O Globo

País pode sofrer danos colaterais na luta entre Bolsonaro e Bivar pelo controle do caixa do PSL

Um governo que tem feito o país viver em sobressaltos, devido a declarações inapropriadas do presidente e trapalhadas várias, leva para dentro do Planalto uma briga típica de baixo clero.

Quando se pensava que o deputado Jair Bolsonaro, com 28 anos de militância na Câmara exercida no fundo do plenário, reformaria seu estilo para adaptá-lo ao cargo que ocuparia no Palácio do Planalto, foi o figurino do baixo clero que subiu a rampa. Nada que não possa ser revisto nos pouco mais de três anos de governo que restam a Jair Bolsonaro. Mas será preciso muito trabalho para que seja preservada a governabilidade.

A disputa rasteira pelo controle dos cofres do PSL, abastecidos com R$ 350 milhões pelo contribuinte, é travada como briga de rua, em que Bolsonaro, seu clã e parte da bancada do partido se engalfinham com o presidente da legenda, Luciano Bivar, que se recusa a dar o espaço que Bolsonaro deseja na legenda. Principalmente o segredo do cofre.

No conflito, vale tudo: gravações de reuniões feitas por adversários, até de um telefonema do presidente em que ele pede a um parlamentar que assine a lista para substituir o líder do PSL, Delegado Waldir, pelo filho, Eduardo; ouve-se ainda o líder ameaçando “implodir” o presidente, e muito mais pode aparecer. Não se menospreze a grande capacidade de Bolsonaro e filhos de prejudicar o próprio governo.

Contido pela legislação eleitoral, que com acerto dificulta a infidelidade partidária, o presidente quer mudar de legenda com sua bancada, mas sem que os correligionários deixem de levar a cota dos fundos partidário e eleitoral do PSL a que teriam direito. Advogados tratam de buscar fórmulas para viabilizar a migração.

Enquanto isso, o país sofre os danos colaterais da visão bolsonarista que coloca o Congresso em segundo plano e se recusa a fazer política no melhor sentido do termo.

Na visão simplista do presidente, negociar com parlamentares é o mesmo que corromper. Sem preocupar-se em ter uma base parlamentar estável, o presidente chegou a defender negociações com “bancadas temáticas”, uma abstração. Acostumado a transitar quase sempre por legendas de fachada, Bolsonaro foi abrigado por Luciano Bivar no PSL, mas agora quer a sua parte, e o dono do partido se recusa a entregá-la. O presidente Bolsonaro é vítima do próprio costume de não levar a sério os partidos.

Mas, ao mesmo tempo em que se disputam ativos financeiros do PSL, há a reforma da Previdência a ser votada em último turno, na semana que vem no Senado. E estão na fila outros projetos também cruciais —reformas administrativa e tributária.

Mais uma vez, os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, precisarão ajudar a conduzir no Congresso projetos essenciais. Até Bolsonaro aprender a lição.

Incerteza e desgaste de Evo Morales marcam a eleição boliviana amanhã – Editorial | O Globo

Vencedor deverá enfrentar o desafio de resgatar uma economia turbinada pela gastança governamental

Cinco milhões de bolivianos redesenham a política do seu país amanhã nas urnas. As pesquisas variam sobre o favoritismo do presidente Evo Morales, mas, em comum, registram um elevado nível de indecisão, com até 46% (Ipsos) de eleitores declarando-se dispostos a definir o seu candidato à Presidência na hora do voto. Essa incerteza, derivada de uma disputa aparentemente acirrada, estimula especulações sobre a possibilidade de um segundo turno.

É perceptível o desgaste do presidente e de seu partido, o Movimento ao Socialismo (MAS), tanto nas sondagens eleitorais quanto nas ruas das maiores cidades, onde a campanha foi pautada por grandes manifestações de protesto contra o governo e episódios de violência. Morales e o MAS estão completando treze anos e dez meses no poder, aonde chegaram na esteira de uma rebelião civil, depois de derrubar dois presidentes e os respectivos sucessores constitucionais.

Presidente há mais tempo do que qualquer dos 180 antecessores em 194 anos da república boliviana, Morales forçou a mudança da Constituição que o impedia de concorrer a um quarto mandato. Saiu derrotado do referendo. Recorreu à Corte eleitoral, que lhe deu permissão — apesar da proibição constitucional e da vontade da maioria expressa nas urnas. “Por cima do jurídico, está o político”, costuma dizer.

Seu principal adversário é Carlos Mesa, que governou por cinco meses entre 2004 e 2005, e foi o último dos presidentes derrubados pela coalizão comandada por Morales. Mesa uniu frações do centro e da direita, mas ainda paga o preço de uma antiga desconfiança dos conservadores.

Qualquer que seja o eleito deverá enfrentar o desafio de resgatar uma economia turbinada pela gastança governamental. Gás de petróleo e minerais sustentam mais de dois terços do Produto Interno Bruto. Como o governo gasta mais do que arrecada, opera com déficit de 6% do PIB. O desequilíbrio na balança comercial já beira 8%, a dívida externa avança, e as reservas se debilitam (eram 50% há cinco anos, agora somam 20% do PIB).

O legado social de Morales tem aspectos relevantes. O ciclo de valorização das commodities possibilitou melhoria no perfil de distribuição da renda, e o governo, que se diz socialista, adotou programas de assistência financeira direta a estudantes, mulheres grávidas e idosos. Mas fracassou na transformação econômica. A Bolívia continua a ser um país de economia extrativista, como era há aproximadamente 14 anos, quando Morales chegou ao poder.

O Brasil e a Indústria 4.0 – Editorial | O Estado de S. Paulo

“Quando há uma revolução inelutável, a gente ou lidera, ou segue ou sai do caminho.” A afirmação é do diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Thomaz Zanotto, e foi feita durante o Fórum Público da Organização Mundial do Comércio (OMC), realizado recentemente em Genebra. Entre outros temas, o evento tratou de inteligência artificial e nanotecnologia.

Em sua intervenção, Zanotto discutiu um ponto polêmico registrado por uma pesquisa realizada em 2018 pela Fiesp em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Segundo o levantamento, 32% dos industriais entrevistados disseram que não sabem o que é a Quarta Revolução Industrial - a chamada Indústria 4.0. Essa revolução começou com a difusão das tecnologias de comunicação desenvolvidas nos anos 1970 e se intensificou com os avanços na inteligência artificial e na biotecnologia.

O estudo da Fiesp revela que o Brasil se encontra fora da nova economia mundial, não tendo relevância em nenhuma das áreas-chave da Indústria 4.0. A pesquisa mostrou que apenas 5% das empresas brasileiras se sentem “muito preparadas” para enfrentar os desafios da Indústria 4.0 e que 23% se consideram “nem um pouco preparadas”. Também apontou que somente 41% das empresas brasileiras utilizam o lean manufacturing - o sistema de produção enxuta. Por fim, revelou que as áreas com mais potencial para se beneficiar dos avanços tecnológicos são as de produção, controle de qualidade, planejamento e engenharia de desenvolvimento de novos produtos. Das 227 empresas pesquisadas, 55% são pequenas, 30% são de porte médio e as demais são grandes.

Em sua intervenção, Zanotto apontou os desafios que o Brasil tem de enfrentar para reduzir o atraso com relação à Indústria 4.0 e atribuiu o problema à recessão econômica. Também lembrou que o País está voltando a crescer, ainda que de modo lento, e que o setor industrial está acordando para o desenvolvimento de novas tecnologias. Apesar de seu otimismo, contudo, os problemas que o Brasil tem de enfrentar para reduzir o atraso tecnológico são enormes.

Os pedidos de registro de patente, por exemplo, continuam demorando muito tempo para serem avaliados e vêm crescendo num ritmo mais lento do que nas economias emergentes, as que competem diretamente com a indústria brasileira nos mercados mundiais. Dados do IBGE também mostram que, na última década, a introdução de tecnologias 4.0 no setor industrial brasileiro foi incipiente, sobretudo por causa de deficiências na infraestrutura de comunicação e do custo de importação de máquinas e equipamentos. Por seu lado, estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada mediram o uso de 16 tipos de habilidades nos empregos disponíveis no Brasil e constataram que elas vêm crescendo de “forma tímida”. Já a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico aponta, em seus relatórios, que o Brasil é um dos países que menos formam profissionais nas áreas de tecnologia, engenharias e matemática. Entre nós, além disso, a taxa de desistência nos cursos de graduação em tecnologia é de 69%.

Os números mostram que as novas gerações não têm preparo para acompanhar a revolução que a Indústria 4.0 vem causando no mundo. Sem condições de formar capital humano, o País continua incapaz de desenvolver mão de obra tão produtiva e adaptável quanto a de outras economias emergentes. Essa combinação entre gargalos estruturais em matéria de infraestrutura e falta de qualificação técnica das novas gerações dá a medida dos obstáculos que o Brasil tem de enfrentar para implementar sistemas industriais inteligentes.

A superação desses obstáculos depende não só de maior envolvimento da iniciativa privada com a Indústria 4.0, como mostra a pesquisa da Fiesp, mas, também, de políticas mais eficientes do poder público, especialmente na área da educação.

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