A escolha do vice-presidente está se transformando em um intrincado jogo político que, embora tenha como principal objetivo o tempo de televisão e rádio de propaganda eleitoral que pode ser agregado à campanha, manda também uma mensagem nada desprezível ao eleitorado. Por isso mesmo, tanto PSDB quanto PT estão em dificuldades para a escolha do vice depois do escândalo do mensalão do Distrito Federal, que abateu em pleno voo nacional o governador José Roberto Arruda.
De uma das figuras mais influentes do DEM e possível candidato a vice-presidente na chapa do PSDB, seu escândalo não apenas respingou na coligação PSDB-DEM, como uma bala perdida no tiroteio de acusações filmadas e gravadas atingiu em cheio o presidente da Câmara, Michel Temer, do PMDB, até então considerado pule de dez para companheiro de chapa da ministra Dilma Rousseff.
O escândalo do DEM reforçou a tese favorita dos tucanos de que a melhor solução seria mesmo uma chapa puro-sangue com o governador de Minas, Aécio Neves, de vice-presidente e o de São Paulo, José Serra, na cabeça, minimizando assim um contágio mais forte do escândalo. Embora sejam inevitáveis os respingos, até mesmo pela parceria notoriamente bem-sucedida em São Paulo entre Serra e o prefeito Gilberto Kassab.
Até março, as pressões sobre Aécio serão intensas, e atribuiu-se a essas pressões um suposto recuo, por ele negado, de antecipar para este mês a decisão de concorrer ao Senado por Minas, desistindo já de disputar a candidatura à Presidência da República internamente com o governador José Serra.
É difícil, no entanto, que essa chapa se concretize, pois o governador Aécio Neves está convencido de que ser vice não agrega valor nem à sua vida política nem à chapa propriamente dita.
Caso essa hipótese se inviabilize, a tendência hoje do PSDB é fechar um acordo com o PPS, coordenado pelo próprio Aécio, para indicar o ex-presidente Itamar Franco para vice.
Seria uma maneira de incluir Minas na chapa, sinalizando a importância de uma vitória no segundo maior colégio eleitoral do país.
Caso o DEM insista em indicar o vice para não parecer aos olhos do eleitorado como um partido rejeitado, provavelmente oferecerá ao PSDB um velho conhecido, à prova de qualquer problema, o senador Marco Maciel, que foi vice de Fernando Henrique Cardoso por oito anos.
O único defeito dessa solução é levar para a disputa uma marca plebiscitária, justamente o que o governo Lula quer. Fugir da contaminação de escândalos é talvez a maior preocupação na composição das chapas.
Em maio de 1994, o então senador de Alagoas Guilherme Palmeira foi indicado candidato a vice-presidente na chapa de Fernando Henrique Cardoso pela coligação União, Trabalho e Progresso, mas não resistiu três meses: em agosto, uma denúncia de favorecimento de uma empreiteira no Orçamento Geral da União provocou a substituição por Marco Maciel, também senador e nordestino.
Também Lula, em 2002, escolheu o vice José Alencar mais por ser empresário do que por ser político mineiro, para dar um recado a setores empresariais de que seu governo não seria uma ameaça à estabilidade econômica.
A região do candidato a vice é importante, embora possa ser também um impedimento.
Na chapa oficial, por exemplo, ser nordestino não é uma vantagem, já que Lula é amplamente popular hoje na região.
O deputado Ciro Gomes pode vir a ser o vice de Dilma se a negociação com o PMDB gorar, mas será pelo seu potencial desempenho eleitoral, e não por ser do Ceará.
Já na oposição, ser bem votado no Nordeste pode ser um reforço, caso a união preferencial com Minas não vingue.
O episódio da lista tríplice, sugestão de Lula que ainda causa estranhamento na relação do PT com o PMDB, tem precedente histórico já relatado aqui na coluna.
Quando, em 1933, Getulio Vargas nomeou o interventor em Minas Gerais, sugeriu sutilmente que fosse incluído na lista o nome de um deputado novato, Benedito Valadares, do Partido Progressista (PP) — e não do PSD, como escrevi anteriormente.
Benedito Valadares foi, de fato, um dos fundadores do PSD, mas em 1945.
Atribui-se à intenção de Lula de ter o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, como vice de Dilma a sugestão da lista tríplice. Seria uma maneira de sinalizar aos empresários e mercado financeiro que as linhas básicas da política econômica não mudariam.
E também uma provocação ao governador de São Paulo, que tem em Meirelles o principal alvo de suas críticas econômicas e é acusado de ser mais heterodoxo em matéria de política econômica do que o próprio Lula.
O interesse do presidente Lula pelo PMDB está concentrado no tempo de rádio e televisão, que dobraria o do PT com a adesão formal na convenção em junho.
A formidável máquina partidária do PMDB, no entanto, não estará nunca inteiramente à disposição da candidatura oficial, pois setores importantes do partido estão comprometidos ou com a candidatura do PSDB ou tentando viabilizar uma candidatura própria.
A cada mal-entendido que acontece, cresce mais a possibilidade de, ao fim, mais uma vez o PMDB não ter condições de aprovar uma coligação formal com o governo, o que faria com que seu tempo de rádio e televisão fosse dividido por todos os partidos que venham a ter candidatos a presidente.
A hipótese menos provável é a de que o PMDB, em represália ao governo, decida formalizar um acordo com o PSDB, repassandolhe seu tempo de propaganda eleitoral.
Essa possibilidade, que vem sendo aventada nos bastidores, parece mais uma chantagem política para dobrar as resistências de Lula e do PT do que uma ameaça real.
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