sábado, 28 de maio de 2011

Purgatório astral:: Zuenir Ventura

Após uma aprovação quase consensual - com 100 dias de governo, ela obteve impressionantes 70% de aceitação -, Dilma parece estar entrando, senão num inferno astral, pelo menos num purgatório. Acabou a lua de mel e no lugar surgiram dificuldades que se somaram formando uma crise séria. Sua base de apoio rachou, a imprensa não lhe dá mais trégua e ela passou a ser cobrada por aqueles que até outro dia aplaudiam suas atitudes firmes e independentes. Em poucas semanas, sofreu vários reveses: a traição do PMDB e de parte do PT, com a consequente derrota para os desmatadores na Câmara dos Deputados, e a capitulação diante de religiosos como Garotinho no caso do kit anti-homofobia, cuja distribuição foi suspensa. Sem falar na crise maior, mãe de todas as outras, a da rápida evolução patrimonial de Palocci, considerada suspeita.

Qualquer que seja o desfecho, o braço direito dela, o homem forte de seu governo sai da trapalhada em que se meteu fragilizado e desgastado. Nunca será o mesmo politicamente, as sequelas são inevitáveis. Conversando esta semana em SP com um amigo do chefe da Casa Civil, ele me disse: "Todo mundo gosta do Palocci. Menos ele." Só assim se explicaria a reincidência no erro. O traumático episódio do caseiro parece não ter ensinado nada a ele. Em outro plano, é uma compulsão parecida com a de Strauss-Kahn: mesmo sabendo que vão fazer besteira, fazem.

O reaparecimento de Lula para assumir a articulação política do governo deve atenuar a crise. Resultado dessa intervenção branca já seria a entrevista de Dilma anteontem defendendo o seu chefe da Casa Civil, e a explicação deste para colegas de partido. Porém, a intromissão do ex-presidente tem efeitos colaterais como enfraquecer a imagem da presidente, fazendo ressurgir em cena a versão que alimentou os adversários na campanha: que ela seria um genérico de seu tutor, uma espécie de "laranja", através do qual ele continuaria governando à distância. A partir do episódio de agora, não seria tão à distância assim.

Para recuperar o prestígio dos primeiros meses de governo, Dilma tem que voltar a agir com coragem e por conta própria. Em outras palavras, precisa deixar o purgatório e retornar ao paraíso.

Como disse alguém com muita graça, o comunista Aldo Rebelo vai poder substituir na bandeira do PCdoB, seu partido (e de Jandira Feghali), a foice e o martelo pela motosserra.

FONTE: O GLOBO

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