Entre o escândalo que derrubou Antônio Palocci da Casa Civil e as acusações que enfrenta agora o ministro Orlando Silva, do Esporte, muita coisa mudou no gestual do governo no tocante à reação a denúncias feitas contra seus integrantes, não obstante a semelhança dos roteiros.
Palocci foi defendido durante boa parte dos 23 dias que levou para cair. Nesse meio tempo o Palácio do Planalto montou operação de blindagem que incluiu tentativa de responsabilizar a oposição e mobilização dos aliados para impedir que o então ministro fosse convidado a falar no Congresso.
Palocci saiu da Casa Civil no dia 7 de junho, mas duas semanas antes o governo falava em "campanha de difamação" e recomendava à sua base parlamentar que tivesse "sangue frio e nervos de aço" para reagir às acusações.
O presidente do PT, Rui Falcão, asseverava que o governo estava tranquilo e convicto de que Palocci estava "acima de qualquer suspeita".
A ofensiva, no entanto, não resistiu à força dos fatos. A partir de então, a metodologia foi sendo alterada e as quedas abreviadas. Falemos apenas dos episódios referentes a desvio de dinheiro, que não foi o caso de Nelson Jobim.
Alfredo Nascimento, dos Transportes, contou algum tempo com manifestações de "confiança" por parte da presidente e chegou a ser nomeado chefe das investigações. Mas ali já se viu que o melhor era que fosse ao Congresso logo.
O mesmo ocorreu com Wagner Rossi, da Agricultura, que teve ato de desagravo organizado pelo vice-presidente da República em pessoa, mas sua trajetória descendente ficou clara nas avaliações negativas feitas por integrantes do governo.
Pedro Novais, do Turismo, foi desde o início deixado ao sol e à chuva pelo próprio partido, o PMDB. Dilma não se envolveu, apesar de estar envolvida desde o dia em que aceitou nomeá-lo a despeito de evidências de que fazia uso ilegal de verba do Congresso.
Orlando Silva tampouco conta com sustentação assertiva do governo, conforme atestam as avaliações de que se não cair agora cai na reforma de janeiro.
Além disso, a presidente avocou ao palácio a tarefa de conduzir os assuntos relativos à realização da Copa do Mundo.
O Palácio do Planalto mudou de Palocci em diante. Parece mais interessado em afastar de si o cálice das crises do que em defender ministros.
Seria um ponto positivo, não fosse o fato de que a presidente não demonstra o mesmo interesse em cuidar do principal: o ponto de união entre todos esses escândalos que é o desvio de verbas públicas nos ministérios.
Em todos houve um denunciante motivado por alguma contrariedade. Todos decorreram do mesmo tipo de acusação, a montagem de esquemas de arrecadação de dinheiro para favorecimentos pessoais ou partidários.
Em todos, funcionários ou mesmo figuras sem função oficial atuavam com acesso livre para transgredir.
A hipótese de conspirações para destruir reputações de ministros é fantasiosa. Real é a prática disseminada de apropriação do Estado funcionando a partir do loteamento da máquina.
São usinas de denúncias que seguirão inesgotáveis enquanto o governo mantiver intactos esses "esquemas".
Palavrório. Deputados e senadores da base governista infantilizam o debate sobre o escândalo em curso quando se limitam a adjetivar elogiosamente o ministro e, ao mesmo tempo, chovem no molhado do conhecido prontuário do acusador.
Não há sustentação de defesa que responda à questão essencial: há ou não há desvio de verbas públicas do ministério?
A própria insistência em ressaltar os crimes do denunciante, cometidos no âmbito da pasta do Esporte, é a admissão de que fala com conhecimento de causa.
O critério do prontuário, aliás, é desqualificado pelo próprio PT quando partido e sua área de influência celebram os réus do mensalão e os tratam como cidadãos acima de qualquer suspeita.
No Parlamento, o exemplo mais evidente é a presença de João Paulo Cunha na presidência de nada menos que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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