Depois de algumas sessões em que reinou uma falsa paz no Supremo Tribunal
Federal, o ministro Joaquim Barbosa, relator do mensalão, voltou a estrilar com
o revisor, Ricardo Lewandowski. Palavras fortes foram usadas.
Já escrevi neste espaço que não vejo as desavenças e mesmo o ódio entre
membros de uma corte colegiada como problema. Ao contrário, penso que são um
sinal de que o órgão é suficientemente plural e de que seus integrantes estão,
de fato, empenhados na missão que lhes foi confiada. A cizânia torna a
convivência difícil, mas é uma garantia de que o tribunal não cairá facilmente
nas armadilhas da conformidade de grupo.
Aqui, a rudeza, vista como defeito no âmbito individual, se converte em
qualidade no contexto de uma corte da qual se exige diversidade. É uma variação
do célebre "vícios privados, benefícios públicos", imortalizado por
Bernard Mandeville.
O caso clássico é o da cobiça que, submetida às dinâmicas do mercado, se
transforma numa força que promove inovação e redução de preços via
concorrência. Mas há outros.
A tão malfalada fofoca -que, ainda hoje, descrevemos de modo pejorativo como
característica feminina- foi, na verdade, o primeiro mecanismo de socialização
especificamente humano. Embora jornalistas não gostemos de admiti-lo, boa parte
de nosso serviço é atualizar a futrica para uma sociedade de massas.
O humor, em especial aquele de piadas cortantes, que pode mobilizar os
piores preconceitos, também entra nessa categoria. O riso que ridiculariza é
horrível se aplicado como forma de "bullying" contra uma criança
indefesa, mas pode ser uma arma bastante efetiva para desacreditar e até
derrubar tiranos.
Antes de imprecar contra este ou aquele magistrado, convém perguntar se seus
defeitos privados não estão, paradoxalmente, contribuindo para resolver a
contento uma relevante questão pública.
Fonte: Folha de S. Paulo
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